terça-feira, 31 de março de 2015

ENTRE DOIS MUNDOS


Quando só fazia jornalismo, lutava para me libertar dos constrangimentos do tempo, da linguagem e da validação alheia. Quase 25 anos depois de ter ingressado numa profissão que já viveu os seus melhores dias, e a cujo declínio é impossível não associar uma perda simultânea dos valores da democracia e da cidadania, percebo que é difícil deixar de ser jornalista, ainda que de forma enviesada. Tanto o Irmão Lobo como o Amores de Família, que está prestes a sair pela Caminho, participam dessa vontade de ser imparcial, de mostrar a realidade sem julgamentos. Mesmo na ficção, é impossível ser livre, no sentido romântico do termo. A propósito do Dia Internacional do Livro Infantil, respondi a algumas questões da jornalista Cláudia Henriques para o Notícia BAD, o jornal em linha dos profissionais da informação e da documentação portugueses. «Quantos públicos cabem num livro infantil?» está aqui, para quem quiser ler.

quinta-feira, 26 de março de 2015

PROCURA-SE UM GATO EM AVEIRO


De saída para Aveiro, a tempo de chegar à primeira sessão do seminário The Child and the Book Conference: Children's Literature - Fractures and Disruptions, vai saber bem descansar os olhos num gato, depois de discutir tantos temas fortes e inquietantes, como se pode ver pelo programa. Gato Procura-se é o último picture book de Ana Saldanha e Yara Kono, editado pela Caminho. Até breve!

terça-feira, 24 de março de 2015

CAIU UMA ÁRVORE


Entretida a escrever o último post, não me apercebi de que tinha caído a árvore mais antiga deste jardim. Há trevas por todos os cantos. Herberto Helder (1930-2015).

ALGUMAS FANTASIAS MASCULINAS


Lançada em 2013, a colecção Imagens que Contam tem algumas regras sustentáveis para a liberdade dos autores: há 32 páginas para contar uma história (incluindo guardas); há uma e só uma palavra permitida (o título); há uma recriação do logotipo da editora a cada nova obra. Com esta colecção, a Pato Lógico de André Letria (... isto como quem diz «o Real Madrid de Cristiano Ronaldo» ou «o Chelsea de Mourinho») deu mais espaço à expressão de ilustradores/autores portugueses de primeira água, para quem a categoria «ilustração» é manifestamente exígua quando se trata de explorar o fôlego narrativo e a autonomia estética. Aos livros de Marta Monteiro (Sombras), André da Loba (Bestial), Afonso Cruz (Capital) e Catarina Sobral (Vazio), juntam-se agora dois novos títulos, seguindo a mesma lógica de publicação «aos pares». De Bernardo P. Carvalho, Verdade?! é a história de um pescador e do seu cão, unidos nas feições e nas emoções provocadas por uma monstruosa tempestade; uma história que não chega a ser «trágico-marítima» graças à aparição de um iate governado por duas hot bikini babes que os devolvem a bom porto (pelo menos é o que eles contam). Das voltas do mar para os nós que apertam os sapatos e a respectiva alma, Dança, de João Fazenda, encena um contraponto entre as rotinas mentais e a pulsão vitalista que anima o acto de dançar: o diálogo faz-se, sobretudo, pelo contraste de formas e pelo jogo de cores frias e quentes, resultando no enlace simbólico do casal de dançarinos apaixonados. Dito isto, deixamos entregue à curiosidade do leitor e ao sentido de humor dos dois autores, João Fazenda e Bernardo P. Carvalho, o resto da explicação para o título deste post. Navegar é preciso, fantasiar também.

segunda-feira, 23 de março de 2015

CADA CASA A SEU DONO


A poucos dias do início da 52ª Feira do Livro de Bolonha, lembramos uma obra distinguida com uma menção honrosa na edição do ano passado, recentemente traduzida por cá: Mâos à Obra: Cada Casa a Seu Dono, de Didier Cornille, autor do texto e da ilustração. O título em português reverte para uma ideia-mestra da arquitectura (as casas são pensadas para as pessoas); enquanto o original, em francês, acentua a preocupação do seu enquadramento no meio envolvente: Toutes les Maisons sont Dans la Nature. As duas interpretações completam-se. Ao todo, são onze casas revolucionárias da arquitectura do nosso tempo, desde a holandesa Casa Schroder, de Gerrit Rietveld (1929), até à londrina casa-ateliê dos arquitectos Sarah Wigglesworth e Jeremy Till (2002). Para a edição portuguesa da Orfeu Negro, Didier Cornille acrescentou um capítulo sobre Siza Vieira e a sua Casa Beires, na Póvoa de Varzim (1976), além de outros edifícios emblemáticos. Sem máculas no que toca à unidade conceptual e à intenção informativa, Mãos à Obra: Cada Casa a seu Dono torna-se um objecto comunicante graças aos indícios de humanidade deixados pelo autor, também ele formado em design e arquitectura, e à sua valorização do «porquê das casas». Uma maravilha.

terça-feira, 17 de março de 2015

AMORES DE FAMÍLIA A NORTE


É sempre bom quando as coisas surgem sem grande esforço, movidas por uma espécie de cálculo sem calculismo que as faz, simplesmente, acontecerem. Tudo se conjugou para que o lançamento do Amores de Família, meu novo livro e da ilustradora Marta Monteiro (aqui) ocorresse a Norte, mais precisamente no Porto, no Mercado do Bom Sucesso, mesmo a fechar a programação da Primavera de Livros (cliquem na imagem para ler melhor). Ora, sendo nós duas raparigas do Norte (Matosinhos e Penafiel, respectivamente) e sendo este livro sobre famílias, parece-me naturalíssimo que a estreia aconteça com a presença em peso das ditas e sob os auspícios do Bom Sucesso. Vai ser no dia 26 de Abril, às 18h00. Com edição da Caminho, o livro está quase pronto e em Abril sairá para as livrarias. É o sétimo da família (e não ponho aspas). Um nervoso miudinho percorre os dedos no teclado; é sempre assim, como se fosse a primeira vez.

domingo, 15 de março de 2015

OFICINA DE LEITURAS PARA CRESCER


Concluídas cinco edições, terminou o (mini) Curso de Livro Infantil que orientei em parceria e a convite da Booktailors, desde 2010. Faço um balanço muito positivo do que aconteceu (umas sessões mais inspiradas do que outras, como é normal) e estou grata a quem investiu o seu tempo e dinheiro, partilhando também com o grupo os seus conhecimentos, experiências e emoções irrepetíveis. Agora é tempo de experimentar outros modelos e assumir valores mais pessoais, acreditando que «quanto mais pessoal, mais universal». Com 12 horas, o início das Oficina de Leituras para Crescer está marcado para 14 de Abril e será o primeiro projecto de 2015; outros se seguirão. Mais informações e inscrições via Blogtailors, aqui. Em síntese, eis a ideia: 

Objetivos: Explorar uma parte da produção atual da literatura infanto-juvenil, tomando como critério os livros que promovem valores de autoconhecimento e de interação confiante com o mundo. Incidiremos no caso específico do picture book (ou álbum), um território cruzado de autonomia leitora e de partilha entre adultos e crianças. Serão mostrados e trazidos a debate dezenas de títulos, de ficção e não-ficção; portugueses, traduções e originais noutras línguas.

Público-alvo: Professores, educadores, bibliotecários, estudantes, livreiros, promotores da leitura e público em geral, incluindo pais que se preocupam em fazer escolhas acertadas para os seus filhos.

Programa:
1ª sessão: Escrever para crianças também é escrever para adultos. Como sobreviver ao fantasma do duplo destinatário e alimentar uma poética da imaginação.

2ª sessão: Regressar aos contos maravilhosos em tempo de crise de valores. O contador de histórias ferido e a recuperação do sentido e da vida interior.

3ª sessão: A extraordinária invenção do picture book (ou álbum) e o seu contributo para o sistema literário. Saber ler imagens é saber ler o mundo.

4ª sessão: Os livros de não-ficção também falam ao «ouvido emocional» do leitor. Critérios de orientação por idades, temas e personalidade do leitor.

terça-feira, 10 de março de 2015

LUÍSA DUCLA SOARES REEDITADA


São cerca de 130 livros publicados desde o início da década de 1970; e uma parte está a ser agora reeditada pela Porto Editora, com novo formato e novas ilustrações. Uns Óculos para a Rita foi o primeiro a chegar (ilustrações de Rita Duque), mas o Abecedário Maluco (ilustrações de Maria Neradova) e Uma História de Dedos (ilustrações de Catarina Correia Marques) também já andam por aí. Espero que nesta leva se inclua o maravilhoso Dr. Lauro e o Dinossauro, um «clássico» dos anos 80.

segunda-feira, 9 de março de 2015

UMA BIOGRAFIA PARA OS LEITORES MAIS JOVENS


«(...) quando as nossas professoras, como a professora Ulfat na escola primária, diziam "Excelente!" ou "Muito bom trabalho, os meus parabéns!", os nossos corações voavam. Os nossos corações voam porque, quando um professor nos elogia ou aprecia o nosso trabalho, pensamos Eu sou qualquer coisa! Numa sociedade que acredita que as raparigas são fracas e incapazes de fazer seja o que for além de cozinhar e limpar, o reconhecimento de um professor faz-nos pensar Eu tenho um talento. Quando um professor nos diz que todos os grandes líderes e grandes cientistas foram, a dada altura da sua vida, também eles crianças como nós, pensamos Talvez possamos ser os grandes de amanhã. Num país em que tanta gente considera um desperdício pôr raparigas na escola, os professores são aqueles que nos ajudam a acreditar ns nossos sonhos.»

(Excerto da biografia de Malala Yousafzai, Prémio Nobel da Paz 2014, numa edição para leitores mais jovens, agora publicada pela Presença. Para todas as professoras e professores Ulfats deste mundo.)

domingo, 8 de março de 2015

GRANDES MULHERES


Depois de terminado este ciclo de destruição, egoísmo e insanidade colectiva, virá o seu contraponto, em que pessoas como Malala Yousafzai serão imprescindíveis. Quem diria que uma adolescente, quase criança, se tornaria a pessoa mais jovem de sempre a receber o Prémio Nobel da Paz? No Paquistão pobre e esquecido, Malala lutou pelo direito à educação das raparigas sob o terror do regime talibã e quase perdeu a vida. Tinha apenas dez anos. Não me digam que já não há heróis nem nada em que acreditar.