sexta-feira, 29 de abril de 2016

MAIO, MÊS DO TOURO


Publicado pela primeira vez em 1936, nos Estados Unidos, A História de Ferdinando é um manifesto pacifista contra uma das mais cruéis guerras civis da primeira metade do século XX. Mais do que a história de um touro que se recusa a lutar na arena, Ferdinando é um bom exemplo de literatura para crianças enquanto reflexo do devir histórico; mau grado todas as histórias da carochinha que negam o seu poder político e subversivo (para o melhor e para o pior). Se o texto de Munro Leaf é suficientemente poético para disfarçar a contestação aberta ao conflito que dividiu a Espanha, as ilustrações de Robert Lawson sugerem pistas difíceis de negar. Registamos duas: 12 de Julho, a data mencionada no cartaz tauromáquico, coincidente com o dia do assassinato do esquerdista José del Castillo; e a figura do matador vaidoso e irascível, de bigodinho ridículo e queixo duplo, uma caricatura evidente de Francisco Franco. A História de Ferdinando tem um final feliz, contrariamente à guerra que terminou com a vitória de Franco e subsequente ditadura. Banido em Espanha e na Alemanha de Hitler, o livro dos dois autores norte-americanos foi agora publicado pela Kalandraka, como clássico intemporal que é.

quarta-feira, 27 de abril de 2016

DIA NORMAL DO LIVRO


No último sábado, 23 de Abril, passei por uma livraria de centro comercial e vi uma mãe a ler para o filho. Estava sentada num sofá e lia alto em voz baixa. O miúdo, que devia ter uns dez ou onze anos, apoiava-se num dos braços, numa daquelas posições aparentemente incómodas que os leitores cultivam. O miúdo debruçava-se sobre ela e sobre o livro, e os três compunham um agregado familiar que me deixou comovida e feliz, especialmente porque era Dia Mundial do Livro. Estava quase a encaminhar-me para a secção de Saúde e Bem-Estar, não sei porquê, mas voltei atrás. Pensei tirar-lhes uma fotografia com o telemóvel, à socapa, mas seria demasiado invasivo e, ao fim e ao cabo, não mostraria nada de essencial. Afastei-me, não sem antes ter fixado aquela imagem para sempre. O livro que a mãe lia era o último do Afonso Cruz, Vamos Comprar um Poeta (Caminho). Tinha-o em casa. Li-o nesse mesmo dia e acabei por fazer parte daquela família, fazer parte do dia, fazer parte de tudo. Vou ler-vos um bocadinho:

«O poeta dizia que os versos libertam as coisas. Que quando percebemos a poesia de uma pedra, libertamos a pedra da sua "pedridade". Salvamos tudo com a beleza. Salvamos tudo com poemas. Olhamos para um ramo morto e ele floresce. Estava apenas esquecido de quem era. Temos de libertar as coisas. Isso é um grande trabalho. Sei que muitas mudanças na minha vida aconteceram graças a ele.»

É mesmo um belo livro.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

25 DE ABRIL x 25 ILUSTRAÇÕES, 5

Jorge Colombo
Henrique Cayatte

Anabela Dias

João Vaz de Carvalho
Cristina Sampaio

25 DE ABRIL x 25 ILUSTRAÇÕES, 4

André Carrilho

Inês do Carmo

Júlio Pomar

Paulo Scavullo

André Letria

25 DE ABRIL x 25 ILUSTRAÇÕES, 3

Pedro Proença
Tamara Alves

Luís Silva

Manuel San Payo

Pedro Vieira

25 DE ABRIL x 25 ILUSTRAÇÕES, 2

Maria Keil

Maria Helena Vieira da Silva

Marta Madureira

João Caetano
Rosa Feijão

25 DE ABRIL x 25 ILUSTRAÇÕES, 1

António Jorge Gonçalves


Alex Gozblau


Maria Bouza Pinto
João Fazenda
Ana Biscaia

domingo, 24 de abril de 2016

VIDA INTERIOR

“Yet it is in our idleness, in our dreams, that the submerged truth sometimes comes to the top.”(Virginia Woolf)

quarta-feira, 20 de abril de 2016

III ENCONTRO DE LITERATURA PARA A INFÂNCIA


«Com o terceiro encontro de literatura para a infância, subordinado ao tema A natureza dos/nos livros, pretende-se explorar uma dupla dimensão que aliará as características intrínsecas dos livros e da literatura às pontes que permitem que a educação ambiental e a criação literária se entrecruzem e se fortaleçam mutuamente. Deste modo, Literatura e Natureza abrem caminhos de fruição do objeto livro e de situações de leitura, de construção de conhecimento e de sensibilização ambiental.»

Programa e inscrições aqui. (Para ler na página, é só clicar na imagem)

(Fonte: Escola Superior de Educação de Lisboa.)

DIA MUNDIAL DO LIVRO JÁ COMEÇOU



«Está patente na sala de exposições da Torre do Tombo a exposição “Livros de Muitas Cores”, que pretende assinalar os vários dias mundiais ligados ao Livro.

Constituída por três núcleos (Poesia, Livro Infantil e Livro), esta exposição assinala a importância que os autores têm na cultura portuguesa, e como o livro é fundamental para a criação de mais e melhores leitores.

Encontram-se nela vários documentos à guarda da própria Torre do Tombo, com destaque para obras e documentação inédita sobre e de Camões, Vergílio Ferreira e Mário de Sá Carneiro, mas também um destaque para a obra de Matilde Rosa Araújo, para o Prémio Nacional de Ilustração e um cantinho dedicado à hora do conto para os mais novos.

Grande parte da exposição é dedicada às fotografias de escritores portugueses realizadas pela fotógrafa Luísa Ferreira em 1997 e 2000, aquando da presença de Portugal como país-tema na feira do Livro de Frankfurt e no Salão do Livro de Paris.»

(Fonte: DGLAB - Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas)

domingo, 17 de abril de 2016

O COMEÇO DE UM LIVRO É PRECIOSO, 23


«Ele acordou bem-disposto. Não havia razão para acordar de outra maneira.
Era apenas uma criança. Tinha vinte anos. Tinha mais de um metro e oitenta e pesava noventa quilos e nunca estivera doente na vida. Era o número dois da equipa de ténis e, em casa, no escritório do pai, existia uma prateleira cheia de taças que havia ganho em torneios desde os onze anos. Tinha o rosto esguio, de traços rudes, cabelo negro liso que usava um pouco comprido, o que evitava que ele parecesse um atleta. Uma vez, uma rapariga tinha-lhe dito que ele se parecia com Shelley, outra achava-o parecido com Lawrence Olivier e ele sorriu, discordando de ambas.»

Irwin Shaw, Onde Todas as Coisas Sábias e Belas Descem, in Estórias da Playboy - O Melhor de Quarenta Anos de Ficção, ed. Círculo de Leitores, 1995, tradução de Teresa Bernardes e Carlota Pracana. Originalmente publicado em 1995. 

sábado, 16 de abril de 2016

O COMEÇO DE UM LIVRO É PRECIOSO, 22


«Embora o seu pai tivesse imaginado para ele um brilhante futuro no exército, Hervé Joncour acabara por ganhar a vida com um ofício insólito, ao qual não era estranho, por singular ironia, um jeito tão amável ao ponto de revelar uma vaga entoação feminina.
Para viver, Hervé Joncour comprava e vendia bichos-da-seda.
Corria o ano de 1861. Flaubert escrevia Salammbô, a iluminação eléctrica ainda não passava de uma hipótese, e Abraham Lincoln, do outro lado do oceano, combatia uma guerra da qual nunca chegaria a ver o fim.
Hervé Joncour tinha 32 anos.
Comprava e vendia.
Bichos-da-seda.»

Alessandro Baricco, Seda, ed. Dom Quixote, 2008, tradução de Simonetta Neto. Originalmente publicado em 1996.

terça-feira, 12 de abril de 2016

FESTIVAL LITERÁRIO DA MADEIRA


«Todas as crianças do mundo devem ser concebidas como seres para ler.» É esta frase de Lídia Jorge, escritora homenageada na 6ª edição do Festival Literário da Madeira, que dá o mote para a primeira conversa de hoje. Lá estarei. Até breve! Programa completo e participantes aqui.

domingo, 10 de abril de 2016

UM AMIGO É O IRMÃO QUE ESCOLHEMOS

 
«Um amigo é como aquela árvore: vive da sua inutilidade. A nossa espiritualidade tem também de ser inútil, para ser mais do que um momento, mais do que uma necessidade, para persistir, para acolher a dança do eterno. Não é raro que a necessidade envenene a nossa relação com Deus. Ora, o amigo não é o necessário: é o eleito, o gratuito. Com razão dizemos: "Um amigo é o irmão que escolhemos." Eu escolho, eu sinto-me escolhido: trânsito do gratuito sem porquês.»

(José Tolentino Mendonça, Nenhum Caminho será Longo - Para uma teologia da amizade, ed. Paulinas, 2012.)

sexta-feira, 8 de abril de 2016

III ENCONTRO DE LITERATURA PARA A INFÂNCIA


«Com o terceiro encontro de literatura para a infância, subordinado ao tema A natureza dos/nos livros, pretende-se explorar uma dupla dimensão que aliará as características intrínsecas dos livros e da literatura às pontes que permitem que a educação ambiental e a criação literária se entrecruzem e se fortaleçam mutuamente. Deste modo, Literatura e Natureza abrem caminhos de fruição do objeto livro e de situações de leitura, de construção de conhecimento e de sensibilização ambiental.»

(Programa, cartaz, inscrições e tudo o que é preciso saber aqui.)

sexta-feira, 1 de abril de 2016

MAUVAIS SANG


Prisioneiros do risco e da tragédia, os piratas cultivam uma exuberância festiva, que no caso de James Gancho se associa ao porte de grand seigneur. Filho indesejado, cativo de um passado misterioso, «revelar quem ele era de facto poria ainda hoje o país a ferro e fogo», insinua J.M. Barrie no texto original de Peter Pan. Essa identidade reprimida mostra-se nos «olhos cor de miosótis e de uma profunda melancolia», um dos seus estados de alma constantes. O próprio autor diz que «o homem não era totalmente mau», embora procedesse como um canalha a maior parte das vezes. Prepotente com a tripulação do Jolly Roger, sádico com as vítimas, capaz de mentir e enganar sem escrúpulos, Gancho é um caso evidente de personalidade anti-social. A educação no colégio interno de Eton não lhe terá feito muito bem. Afinal, talvez seja o mais perdido dos lost boys, fugindo do tic-tac do crocodilo até à hora fatal. Não choremos por ele, já que morreu como um pirata: a rir-se dos seus tormentos.