Felizmente, não faço parte das gerações que cresceram a ouvir mentiras sobre a grandeza de Portugal, as suas glórias passadas e os seus heróis tão convenientes. Tive um derriço por Portugal quando tinha 20 anos e lia as crónicas do MEC no Expresso, mas a verdade é que nem o saudosismo de Teixeira de Pascoaes nem o pitoresco da manteiga Primor chegam para fazer esquecer o resto. E o resto é isto: um país pobre e claustrofóbico, amesquinhado pela eterna pequenez dos seus políticos e ensandecido por rasgos pontuais de histerismo mediático à volta do futebol, do clima ou do escândalo. Não é só isto, mas é cada vez mais disto.
E nesta estreiteza que começa na geografia e se estende por todos os planos da vida nacional, acentuando-se no plano inclinado, é sempre doloroso quando desaparece mais um “dos bons”. A morte de Saldanha Sanches alimenta o sentimento de orfandade cívica e moral de quem não vive protegido por berços ou conluios; ou seja, quase todos nós, os sobreviventes.
Se a morte é absoluta, dói ainda mais quando a perda parece insubstituível. Por cada Mário Viegas e cada Agostinho da Silva que desaparece, multiplicam-se os lugares vazios, as sombras e as subserviências. Raro, cada vez mais raro encontrar o “riso admirável de quem sabe e gosta/ ter lavados e muitos dentes brancos à mostra”, como nos versos de Cesariny. Também eu estou cansada de ver “os melhores espíritos da minha geração” destruídos pelo desgosto quotidiano que é viver neste país; gente para quem emigrar, hoje, é uma decisão tão saudável como combater o mau colesterol. Quem fica, seja por que razão seja, sabe que tem de ser feito de uma liga especial para resistir à corrosão e ao desgaste permanentes. Uma têmpera de aço, ferro, carbono, fósforo, titânio, tungsténio e o diabo a sete, como o raio do Terminator.
Acontece que a maior parte das pessoas não quer ser o Terminator, com todo o direito que lhes assiste. Não quer ser herói nem vilão, porque cada uma dessas escolhas dá trabalho. Só quer ter um emprego, uma casa, uma família, um ordenado decente ao fim do mês, escola e hospital, e caracóis com cerveja ao fim-de-semana. Ao que parece, é pedir muito. Dêem-lhes mais tungsténio.
E nesta estreiteza que começa na geografia e se estende por todos os planos da vida nacional, acentuando-se no plano inclinado, é sempre doloroso quando desaparece mais um “dos bons”. A morte de Saldanha Sanches alimenta o sentimento de orfandade cívica e moral de quem não vive protegido por berços ou conluios; ou seja, quase todos nós, os sobreviventes.
Se a morte é absoluta, dói ainda mais quando a perda parece insubstituível. Por cada Mário Viegas e cada Agostinho da Silva que desaparece, multiplicam-se os lugares vazios, as sombras e as subserviências. Raro, cada vez mais raro encontrar o “riso admirável de quem sabe e gosta/ ter lavados e muitos dentes brancos à mostra”, como nos versos de Cesariny. Também eu estou cansada de ver “os melhores espíritos da minha geração” destruídos pelo desgosto quotidiano que é viver neste país; gente para quem emigrar, hoje, é uma decisão tão saudável como combater o mau colesterol. Quem fica, seja por que razão seja, sabe que tem de ser feito de uma liga especial para resistir à corrosão e ao desgaste permanentes. Uma têmpera de aço, ferro, carbono, fósforo, titânio, tungsténio e o diabo a sete, como o raio do Terminator.
Acontece que a maior parte das pessoas não quer ser o Terminator, com todo o direito que lhes assiste. Não quer ser herói nem vilão, porque cada uma dessas escolhas dá trabalho. Só quer ter um emprego, uma casa, uma família, um ordenado decente ao fim do mês, escola e hospital, e caracóis com cerveja ao fim-de-semana. Ao que parece, é pedir muito. Dêem-lhes mais tungsténio.
9 comentários:
Genial.
como eu a percebo!
um abraço
MAGNIFICO!!!
XYNTIA
Valha-nos os livros, portanto. Obrigada, Carla, por contribuir para um mundo melhor. O que eu mais gosto nestes dias, é o fim de tarde com o meu pequeno, rodeados de livros bons... outra boa notícia no meio do descalabro, é que a FL de LX vai-se prolongar por mais uma semana ;-)
Belo texto. ;) Obrigada.
Os bons partem, mas deixam-nos as suas obras, as suas mensagens. É pena que seja uma ínfima parte que as aproveita.
Quanto ao texto devorei-o e adorei-o. Obrigado por me fazer acreditar que ainda é possível mudar algo neste país.
Também acredito que, mesmo sendo uma minoria, ainda é possível fazer muito por este país.
Acredito nisso todos os dias quando entra na sala de aula...
Bom texto.
Marta M
Gostei!
Que belo texto... que eu gostaria de ter escrito...
António Serra
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