quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

SOMEWHERE OVER THE RAINBOW


O relógio do blogger está atrasado 15 minutos (e 13 horas). Mas acabámos de entrar em 2009, pela hora neozelandesa. E este post é dedicado a todos os leitores do Jardim Assombrado: o monte Taranaki, um vulcão adormecido a poucos quilómetros do mar, lugar sagrado para o povo maori, na ilha Norte da Nova Zelândia. Para ouvir com a banda sonora de Somewhere Over the Rainbow, por Israel Kamakawiwo Ole. Cliquem para ouvir, que vale a pena. À vossa, um grande 2009!

FALTA MENOS DE MEIA HORA PARA 2009

Cá em casa é tradição começar a festejar a passagem de ano quando é meia-noite do outro lado do mundo, onde começa o primeiro dia de 2009. Também está a chover em várias cidades da Nova Zelândia. Tenho estado a ouvir em directo a Radio New Zealand, via internet. Já falta pouco.

WISHLIST 2009

Da caixa dos recortes, um cartoon provavelmente retirado do Caderno 3 de O Independente, sem data e sem autor. A minha eterna lista de desejos para 2009. Não vou ser muito exigente: o gelado pode ser de chocolate.

VOU PASSAR O ANO QUE VEM AQUI


Calma. É só a fotografia de Janeiro do calendário de 2009 made in New Zealand. Local: Lonely Bay, Coromandel, ilha Norte. Autor: Andrew Fear. A estrear amanhã.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

CHRISTMAS-BREAKS: LEÇA DA PALMEIRA


Há aquelas pessoas para quem o Natal significa “ir à terra”. Dantes também ia “à terra”, primeiro no sentido telúrico do termo, depois no sentido simbólico. A terra é Matosinhos. Nasci numa casa com quintal na Rua Silva Cunha, entre toalhas fervidas e mãos de parteira, e ali vi crescer uma parte do meu jardim assombrado. No Natal, ia-se ao mercado comprar um pinheiro – um pinheiro de verdade – e usava-se algodão a fazer de neve. Havia aletria, laços fritos com mel e bolinhos de abóbora bolina. As prendas vinham embrulhadas em papéis de fantasia que se guardavam de um ano para outro na “gaveta dos papéis”, por baixo do telefone. A minha tia Augusta tricotava carapins para todas as crianças da família, empenhada em aproveitar as sobras de lã de todo o ano. Por todos os livros e jogos e kispos que se pudessem receber, lá estavam os carapins da tia Augusta, a lembrar a ordem de um mundo estabelecido e rigoroso como o Inverno que atravessávamos. Com os pés sempre quentes durante a noite, graças aos ditos carapins.

Há alguns anos, movida por um atávico espírito de clã, toda a família se mudou de Matosinhos para Leça da Palmeira, uma urbanização moderninha e sem carisma perto do Farol da Boa Nova e da casa de chá homónima de Siza Vieira. O Natal passou a ser celebrado aí, a árvore é agora de plástico, como manda o ecologicamente correcto. Ainda se faz aletria, laços fritos com mel e bolinhos de abóbora bolina. Mas já nada, absolutamente nada, tem a mesma piada desde que os meus pés cresceram e acabou a era dos carapins. Aqueles previsíveis, aborrecidos e monótonos carapins.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

BOAS FEST…


Da imensa leva de cartões de Natal, formais e informais, que têm chegado ultimamente por email, o único que traduz os meus mais honestos sentimentos em relação à quadra é este, com assinatura do Alex (Gozblau). Se a motoserra vos parecer muito agressiva, podemos sempre substituí-la por um instrumento mais artesanal e igualmente eficaz.

O INCRÍVEL MUNDO DAS PETIÇÕES


- Petição para despedir Jesualdo Ferreira, treinador do Futebol Clube do Porto: 7 assinaturas.
- Petição para sanear a Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues: 12 assinaturas.
- Petição para levar Peter Gabriel ao Brasil: 14 assinaturas.
- Petição para requalificar a EN 360, principal via de acesso dos peregrinos a Fátima: 160 assinaturas.
- Petição para remover nove postes em fibrocimento que dificultam a actividade do Campo de Voo de Benavente: 511 assinaturas.

Agora a sério:

Petição para a dedução de despesas com o veterinário no IRS: 7360 assinaturas. Eu assinei aqui. Gasto um ror de dinheiro por ano com a gataria. “E eu com isso?”, diz ele, preocupadíssimo.
ANTIDEPRESSIVO
Aparentemente, já toda a gente tinha visto isto menos eu. Obrigada, Miguel.

domingo, 21 de dezembro de 2008

BYE BYE BETTIE


Bettie Page, a mais famosa pin-up dos anos 1950, morreu no dia 11 de Dezembro, aos 85 anos. Li a notícia no Público, dois dias depois, e apesar do atrasado da hora também quero prestar aqui a minha homenagem. Bettie era um espírito livre e uma mulher sensual, do tempo em que as mulheres não passavam fome a troco de uma silhueta escalpelizada ao milímetro. Nasceu pobre, estudou Artes, ganhou uma bolsa, foi capa da Playboy, deixou milhares de fotografias pouco ou nada ortodoxas, vestiu-se de dominatrix, de capuchinho vermelho, de leopardo e do que lhe deu na real gana. Um dia teve uma epifania e retirou-se para uma vida de introspecção religiosa, e nunca mais deu autógrafos nem se deixou fotografar. Os meus heróis têm sempre qualquer coisa de contraditório e não necessariamente irreconciliável, um pé no céu e outro no inferno. Acho que isso lhes dá uma grandeza de alma infinita.

Site oficial de Bettie Page aqui.

VENHA O DIABO E ESCOLHA



Passagem de ano 2008/2009 no Espaço Karnart ou no Cabaret Maxime? O melhor é esquecer definitivamente a ideia da colecção e meter-me com cromos da minha idade.

CROMOS FOLEIROS





Não sei se é pela proximidade dos 40 anos ou pelo efeito dos raios gama no comportamento das margaridas, mas está a apetecer-me fazer de novo uma colecção de cromos. Em pesquisa na papelaria do costume, encontrei cromos de futebol, da Barbie, do Wall-E, do Dragon Ball e de uma coisa adolescente tipo High School Musical. Tudo muito feio, sem cor, sem arte e sem expressão. As carteiras têm uma cola esquisita; uma vez abertas, já não se conseguem guardar os cromos lá dentro. Não estava propriamente à espera do regresso dos “animais de todo o mundo” ou das “casas tradicionais”, mas não sabia que o panorama era assim tão desolador. A minha irmã, que tem menos sete anos, diz-me que quando era teenager já não havia “cromos didácticos”. Suspiro...

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

SOMOS IMPERFEITOS DE PALAVRAS


Tenho pena de só ter conseguido assistir a dois painéis do XVIII Encontro de Literatura para Crianças na Fundação Calouste Gulbenkian, mas trabalho oblige. Para lembrar durante muito tempo, a conferência de abertura proferida por Manuel António Pina, de uma delicadeza e profundidade tocantes. Não é propriamente uma novidade, eu sei. Alguém que conhece o pensamento tauista só pode tratar as palavras com rigor, e por isso não surpreendeu ouvi-lo dizer que tem “cada vez menos coisas para dizer” – porque “falar raramente é conforme à natureza”, como se lê no Tao Te King. “Se os fenómenos do céu e da terra não são duráveis/Porque o seriam as acções humanas?” (Editorial Estampa, página 35).

“Somos imperfeitos de palavras”, disse Pina. Evocou Maurice Blanchot para lembrar que “a literatura é a arte de fazer de conta” e que toda a literatura “persegue a linguagem da linguagem”, devendo ser interrogada “na sua forma, na sua sonoridade, na sua significação”. Falou no “anitismo” dos livros para crianças, nesse atrofiamento do mundo à medida da pequenez da Anita, e pôs o dedo na ferida quando afirmou que “o principal problema da literatura para crianças é o de os livros serem escolhidos por pais ou por adultos que não percebem nada de literatura nem de crianças”. Confessou a desilusão de nunca ter conseguido convencer as filhas a gostarem de Winnie-The-Pooh quando eram pequenas; e explicou por que razão há tantos adultos a escrever “para” crianças (sublinhando as aspas) que, às vezes, não entendem o que eles escrevem. Como Alan Alexander Milne, eventualmente. Não cito ipsis verbis, porque não usei gravador, mas o sentido é este: “A melancólica forma que a infância assume em nós, adultos, é a perda da infância. As crianças ainda não têm a linguagem perdida da infância, estão demasiado próximas dela, por isso não a entendem.” Acho que Manuel António Pina tem toda a razão, mas fica a ressalva, feita pelo próprio: “Nada é decerto tão perigoso como a certeza de que se tem razão.” E como é bom ouvir pessoas que têm cada vez menos coisas para dizer.
TERMOINDINÂMICA

Desde ontem que não consigo aceder ao cabeçalho que permite iniciar a sessão no blogue e fazer modificações. Embora menos prática, descobri uma via alternativa entrando pelo perfil, mas a ansiedade tecnológica já se instalou. Não sou capaz de desfazer aquele espaço em branco que aparece no meio do texto do post anterior, e isso mexe com o meu perfeccionismo. Espero que a coisa não piore. É que este blogue tem pouco mais de dois meses e, sinceramente, parece-me demasiado cedo para enfrentar a lei da entropia.

TRAPOS PORQUÊ?


Três dias e cerca de mil quilómetros depois (nunca mais me apanham a viajar até ao Pinhão em mini-bus…), regresso ao tema em que deixei o blogue: o XVIII Encontro de Literatura para Crianças na Fundação Calouste Gulbenkian, este ano dedicado “às diferentes línguas/linguagens faladas” dos livros para crianças e designado por “Palavra de Trapos”. Confesso: não gostei do nome escolhido. Apesar de ter ficado explícita a relação etimológica entre “texto”, “tecido”, “tecer”, “entrelaçamento” – sobretudo depois da intervenção de Ana Paula Guimarães, directora do Instituto de Estudos de Literatura Tradicional –, a ressonância da palavra “trapos” continua a ser mais forte, para mim. Trapos são restos, farrapos, sobras, pedaços de tecido barato, um material pobre. A literatura, incluindo aquela que damos a ler às crianças, deve ser o contrário disso, o contrário de todos esses livros feitos de “línguas de trapos”. Numa altura em que esta área ainda está a conquistar a sua legitimação, pergunto-me se o título “Palavra de Trapos” será o mais eficaz e apelativo, quando se trata de contrariar essa ideia generalizada de que para as crianças tudo serve, desde que tenha letras grandes e muita bonecada.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

CITY-BREAKS: DOURO


Agora gostava de estar na Gulbenkian, onde continua o XVIII Encontro de Literatura para Crianças, para ouvir o que estão a dizer dois dos meus autores portugueses favoritos: Manuel António Pina e Álvaro Magalhães. E também Rita Taborda Duarte, na sessão de encerramento. Mas por essa hora vou estar a caminho do Douro, para respirar ar puro e ver umas coisas bonitas como as da imagem acima. Também é bom. Até daqui a pouco.

domingo, 14 de dezembro de 2008

VENCEDOR DO PRÉMIO NEWBERRY EM FILME


Estou cautelosamente expectante quanto à adaptação de A Lenda de Despereaux para o cinema. O filme estreia na próxima quinta-feira, como vem sendo amplamente publicitado. Não vi o anterior – Por Causa de Winn-Dixie – mas também não fiquei com pena. Soou-me a demasiado açúcar para a escrita dolente e algo melancólica de Kate DiCamillo. Espero que se faça jus à obra de uma escritora que, para mim, está entre as mais estimulantes revelações desta década. Aqui fica o texto que escrevi para a Notícias Magazine, aquando da edição portuguesa de A Lenda de Despereaux (Gailivro):

“Durante anos, Kate DiCamillo disse a toda a gente que ia ser escritora. Durante anos, fez tudo o que podia para sobreviver, incluindo trabalhar num parque residencial de caravanas e vender cachorros-quentes. Tudo, menos escrever. O mais próximo que conseguiu foi um emprego na secção de literatura infantil de uma loja de livros em segunda mão. As razões do embargo criativo, velhas como a humanidade, resumiu-as à NM em poucas palavras: «Preguiça, medo, mais medo, mais preguiça. Triste, hã?».

Chega-se a um ponto em que a melhor maneira de transformar as coisas é torná-las insuportáveis, atirá-las para uma situação-limite onde a única fuga possível é para a frente. Pouco antes de fazer 30 anos, entre a incomodidade e a obsessão – e muitas leituras acumuladas desde o curso de inglês que concluíra na Universidade da Florida –, Kate DiCamillo começou finalmente a tentar escrever. Primeiro, histórias curtas, que enviava para as editoras e revistas, recebendo em troca respostas invariáveis com que inaugurou uma magnífica colecção de rejeições. Depois, com a ajuda de uma bolsa literária, uma dessas histórias cresceu para algo maior: Por Causa de Winn-Dixie, chamou-lhe.

Por Causa de Winn-Dixie, o livro, a vida começou a parecer-se com o que ela tinha imaginado. Um rafeiro com nome de supermercado (Winn-Dixie é uma cadeia de lojas muito popular no sul dos Estados Unidos) tornou-se protagonista de um conto que quis ser, segundo a autora, «um hino aos cães, à amizade e ao Sul». Mas podíamos acrescentar: aos livros, às mães e às pessoas autênticas que verdadeiramente nos inspiram. Publicado em 2000, pela Candlewick Press, ganhou mais de 40 prémios na área da literatura infanto-juvenil, atribuídos em dezenas de estados, desde a Califórnia a Nova Iorque. O reconhecimento estendeu-se aos tops de vendas e cruzou o Atlântico, provando que Kate DiCamillo não era só uma escritora do Sul dos Estados Unidos.

Gótico Americano
E, no entanto, ela é mesmo uma escritora do Sul dos Estados Unidos. Nascida em Filadélfia, em 1964, aos cinco anos mudou-se para a Florida, onde cresceu, estudou e descobriu a sua «família literária». Por Causa de Winn-Dixie, a que se seguiu A Libertação do Tigre, publicado em 2001, são livros por onde passa a sombra do Southern Gothic, estilo impulsionado por toda uma fina linhagem de escritores do Sul (grande parte deles, mulheres), sob a presença tutelar de William Faulkner: Carson McCullers, Eudora Welty, Tennessee Williams, Harper Lee, Flannery O’Connor, Truman Capote, só para citar alguns. Se o contexto é regional – pequenas comunidades assoladas pelo abandono, famílias em serena desagregação, as ruínas de um passado orgulhoso perdido na guerra civil… –, as questões em causa são da maior amplitude moral. O que ficou nos livros de Kate DiCamillo, retirado o excesso de violência e grotesco dessa herança literária, foi um certo imaginário do desconforto; mas um desconforto em busca da sua cura e redenção, capaz de resistir a forças adversas e, ainda assim, manter a sua integridade singular. Na linguagem da psicologia, dir-se-á, talvez, resiliência.

Na literatura para crianças e jovens há uma longa tradição de heróis resilientes, desde Oliver Twist e outras torturadas personagens dickensianas à extraordinária Matilde, da obra homónima de Roald Dahl. Em Por Causa de Winn-Dixie, a heroína é India Opal Buloni, uma menina de dez anos que vive com o pai, pregador religioso, numa velha trailer home – esse tipo de caravanas que representam a residência fixa de milhões de norte-americanos das classes desfavorecidas. India não tem mãe; ou é como se não tivesse, uma vez que esta abandonou a família quando India era ainda muito pequena. O tema das mães «desaparecidas» continua no livro seguinte, A Libertação do Tigre, onde um rapaz de 12 anos, Rob Horton, se confronta com a necessidade de enfrentar as emoções provocadas pela morte prematura da mãe, um recalcamento espelhado na alegoria do tigre enjaulado.

Se Kate DiCamillo já esclareceu em entrevistas que a mãe está viva e de boa saúde, também não faz segredo sobre o facto de o pai ter saído de casa quando ela tinha cinco anos, acontecimento que lhe marcou a história familiar e, é fácil de ver, a escrita. Não se pode dizer que as maiores figuras de referência saiam muito bem tratadas nos seus livros: se as mães desapareceram, por um motivo ou outro, os pais são emocionalmente limitados, absorvidos pelas suas ocupações ou pela luta diária da sobrevivência. Ainda assim, ela evita juízos fáceis, mostrando que as pessoas nunca são uma só coisa e temperando a complexidade dos sentimentos com humor e ternura.

Uma galeria de excêntricos
O contraponto afectivo a esta realidade pouco promissora é dado não só pelos animais, como por outras personagens capazes de criar laços genuínos de amizade – também elas assombradas pelos fantasmas da solidão. Em Por Causa de Winn-Dixie, temos Miss Franny Block, a velha senhora «casada» com a sua biblioteca; Gloria Dump, uma negra quase cega com um passado pouco ortodoxo; e Otis, que trabalha numa loja de animais e prefere a música às palavras. Em A Libertação do Tigre, há Willie May, cujas feições lembram a actriz Halle Berry, mas que limpa quartos no motel Estrela do Kentucky; e há, sobretudo, Sistina Bailey, uma menina esperta e orgulhosa do seu nome, revoltada por ter mudado de casa (“Esta é uma cidade parola e estúpida, com professores parolos e estúpidos. Ninguém nesta escola toda sequer sabe o que é a Capela Sistina.»), e que também vive com os seus «tigres» por libertar.

O que tem em comum esta irmandade de excêntricos e inadaptados, tão bem decalcada do imaginário do Sul profundo? Entregues a si próprios, carregam o peso das memórias vividas e o esquecimento da América super-desenvolvida; pertencem à estirpe dos sobreviventes, não dos vencedores predestinados. Acima de tudo, contam consigo mesmos para se salvarem. Lembram-se do que aconteceu em Nova Orleães? Foi mais ou menos assim.

E quanto à Lenda de Despereaux, «a história de um rato, uma princesa, uma colher de sopa e um carrinho de linhas»? Publicado nos Estados Unidos em 2003, vendeu um milhão de exemplares e recebeu o prestigiado prémio Newberry para o melhor livro infanto-juvenil de 2004, tornando-se rapidamente um «favorito» de escolas e bibliotecas graças ao seu potencial narrativo e simbólico. Para quem leu os dois títulos anteriores, a primeira reacção pode ser de estranheza. Desta vez, os cenários mudaram: não há parques de caravanas, motéis e cafetarias, bosques e estradas secundárias, mas sim um tempo e espaço localizados na pura fantasia, de cujo interior Kate DiCamillo fez nascer uma sofisticada intriga. O universo animista da autora expandiu-se e colocou um rato no lugar de protagonista – mas o seu nome, Despereaux, é já um sinal inequívoco de que também ele pertence à raça dos sobreviventes.

Primeiro, Despereaux enfrentará a traição da família dos ratos; depois, as terríveis ratazanas dos subterrâneos do castelo. Pelo meio, encontrará uma princesa chamada Ervilha, uma criadita que quer ser princesa e um rei que governa o reino com soberana e majestática apatia. E ainda uma ratazana com nome renascentista, tocada pela visão da luz e pela ideia do sublime, que é o exemplo dessas personagens «más» de quem só apetece gostar. E mais não se pode dizer, a bem da surpresa do leitor. Despereaux, o último (e o único) da ninhada, vai ter de provar que merece ter ficado para contar a história.”

O trailer do filme pode ser visto aqui.

sábado, 13 de dezembro de 2008

OITO PASSOS PARA CRIAR UMA BIBLIOTECA

Marcelo Maluf, escritor brasileiro, tem um blogue dedicado à literatura para os mais novos que é feita do outro lado do Atlântico, com entrevistas e links para autores. Chama-se Labirintos no Sótão (belo nome) e, entre outras coisas interessantes, há lá um post intitulado “Oito passos para criar uma biblioteca doméstica.” Gosto especialmente do sexto e do sétimo passos:

“Jamais cultue a sua biblioteca como um lugar sagrado, você pode afugentar os demônios dos livros.”

“Seja você escritor, poeta ou leitor, viva em sua biblioteca como um homem comum. Os livros não falam com gente que se leva a sério demais.”

Leia o resto aqui.

O MUNDO É QUE EXAGERA?


A Planeta Tangerina publicou este ano Um Dia na Praia, um livro sem palavras que conta a história de um homem capaz de construir um barco só com o lixo recolhido na praia. Agora ficámos a saber que o homem existe mesmo, chama-se António Caló e andou por Tavira no Verão de 2007, antecipando o livro que outro dia acabou por descobrir, sem querer. O blogue da Planeta Tangerina conta tudo e mostra as fotografias do barco "verdadeiro", aqui. Nunca mais digam que "o mundo é que exagera"…

BIBLIOTECAS ASSÍRIO & ALVIM


“Porque para nós os livros não têm prazo de validade e nem só de novidades vivem os leitores, fomos ao fundo do nosso catálogo e seleccionámos mais de vinte pequenas «bibliotecas» temáticas e de autor que propomos, a preços muito reduzidos, para as suas prendas de Natal.”

Organizadas por autores (Al Berto, Alexandre O’Neill, Almada Negreiros, Fernando Pessoa…) ou por temas (“Sabores Exóticos”, “Literatura de Viagens”…), as mini-bibliotecas da Assírio & Alvim juntam muitos e bons livros de uma só vez. No catálogo também lá está a colecção Assirinha: 15 títulos, para sermos exactos, com autores tão indispensáveis como Manuel António Pina ou Jorge Sousa Braga. O conjunto custa 140 euros, menos 72 euros do que se pagaria normalmente. Para ver tudo, clique aqui. Para comprar os livros, é ir à morada da Rua Passos Manuel, 67-B, ou ao Largo de S. Carlos, 1, a partir de segunda-feira.

HOJE NO DN E JN


O tempo não está bom para vender jornais, mas aqui fica a sugestão: hoje, no suplemento IN da Notícias Sábado, revista integrante do Diário de Notícias e Jornal de Notícias, um artigo de três páginas intitulado "Livro Infantil - Baloiços e Balanços". Com declarações de Alice Vieira, Luísa Beltrão, Miguel Gouveia (Bruaá) e Isabel Minhós Martins (Planeta Tangerina). Além de um guia - muito sucinto, hélas! - de sugestões de livros para o Natal, incluindo o clássico de Kenneth Grahame que fez cem anos em 2008: O Vento nos Salgueiros. À vossa consideração.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

DESEJOS PARA 2009

Mais humor, menos sarcasmo.
Mais encontros, menos tagarelice.
Mais tolerância, menos presunção.
Mais integridade, menos relativismo.

O FILME DO COSTUME


As ruas de Lisboa cheias de carros, mesmo ao fim-de-semana. As musiquinhas natalícias de aeroporto a tocar em todo o lado. As pessoas ainda mais impacientes e vulneráveis do que nos outros dias. Os prazos de fecho das revistas enlouquecidos. A conversa mentirosa do costume, “este ano não ofereço nada, está bem?” Os caixotes do lixo ainda mais cheios e as bolsas mais vazias. As convenções hipócritas da solidariedade sazonal. Os discursos institucionais de circunstância. O perigo acrescido de andar nas auto-estradas. A impossibilidade de escapar às conversas em família. O gigantesco bolo-rei ou o presépio da terrinha não sei das quantas que querem entrar para o Guinness. Os livros que se compram porque já vêm embrulhados com um laçarote piroso. Talvez isto soe a heresia para muita gente, mas acho o Natal e a respectiva ressaca uma seca e uma canseira. Só quero que chegue o dia 2 de Janeiro de 2009. Para quê? Logo se vê.

HOJE NÃO CONSIGO FALAR DESTE LIVRO


Há dez anos que não via a Mónica. O lançamento do Transa Atlântica, há meia dúzia de horas, na Fnac do Chiado, deixou-me sem fala. Sabem como é, quando o tempo passa e parece que ficou tudo intacto? Foi mais ou menos assim. Por exemplo um certo dia, não sei quando, era uma festa qualquer. Ela vestida de verde, uma roupa larga mas estranhamente elegante (quando uma mulher ruiva se veste de verde há que levá-la muito a sério, e não só por ser do Sporting). Eu, no gozo: “Estás um bocadinho Diane Keaton, não?” “É. Achas que se nota muito?”

Nota-se, darling. Mas não te preocupes em esconder nada, és linda assim. E ainda não li o teu livro, mas isto parece-me um bom ponto de partida:

“Se você gosta da Yoko Ono, não vai gostar deste livro. Se além da japonesa maluca, também gostar da Björk, esqueça. Ouviu? Esqueça.”

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

PARA ESCAPAR AO PAI NATAL


“Era uma vez uma casa no meio do mar.” Um presente de Natal impossível. Mas pelo menos o livro posso oferecer a alguém: De Profundis, de Miguelanxo Prado, Edições Asa. Lindíssimo. Eventualmente, para ser lido com a banda sonora do post anterior.

MÚSICA PARA ACENDER ECLIPSES


Um quinteto francês, Les Fragments de la Nuit. Três violinos, um violoncelo e um piano. Musique du Crépuscule, chama-se o disco, que tem a particularidade de ser editado pela etiqueta portuguesa Equilibrium Music. Alguém o descreveu como uma “peça neoclássica ou obra pós-nocturna”, com influências de Philip Glass, Steve Reich, Arvo Part e Godspeed You! Black Emperor. Eu digo que é música para acender eclipses. Ouçam aqui.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

UM PEQUENO ACHADO


Este fim-de-semana, de passagem por uma loja de velharias em Belas, encontrei, por um euro, o Catalogue D’Objets Introuvables (Éditions André Balland, 1969) de Jacques Carelman, um dos "multicriativos" do meu imaginário. Ilustrador, pintor, escultor, cenógrafo, Carelman inventou, a partir de um catálogo de vendas, uma colecção de mais de 400 objectos do quotidiano que subvertem as regras internas da sua funcionalidade, ficando a meio caminho entre a lógica e o absurdo. Na capa acima reproduzida vemos, por exemplo, a cafeteira para masoquistas, a bicicleta dupla para enamorados, o garfo para comer esparguete (ou choucroute), a torneira-nariz para constipados e o martelo para alcançar "pregos inacessíveis”. Há muitos mais, hilariantes, como o pente para carecas, o selim-bidé, o lavatório vertical ou a máquina de escrever hieróglifos. Carelman foi convidado pelo Musée des Arts Décoratifs de Paris a mostrar os seus desenhos e, em vez disso, preferiu dar forma tridimensional a algumas dezenas deles, numa exposição que começou no Louvre, em 1972, e percorreu vários lugares do mundo (não sei se alguma vez esteve em Portugal). Para uma amostra parcial, clique aqui.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

ISTO DÁ UMA CERTA PICA


No dia em que O Jardim Assombrado fez dois meses recebeu um Prémio Dardos. Não tem nada a ver com picadas ou alfinetadas, género “pontapés na incubadora” do Pedro Santana Lopes. Muito pelo contrário:

"O Prémio Dardos reconhece o valor de cada blogger ao transmitir valores culturais, éticos, literários ou pessoais e ao demonstrar, de alguma forma, a sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto naquilo que escrevem. Por outro lado, esta é também uma forma de demonstrar carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web. Quem recebe o Prémio Dardos e o aceita deve seguir algumas regras:
1. - Exibir a imagem do Prémio Dardo;
2. - "Linkar" o blogue pelo qual recebeu o prémio;
3. - Escolher quinze outros blogues aos quais entregar o Prémio Dardos."

Ora bem, quem lançou o Dardo foi a Andreia Azevedo Soares, jornalista e autora do Bordado Inglês, um blogue convidado do Público, a quem agradeço e peço desculpa por só agora dar conta do recado. Escolher os 15 blogues é que é mais difícil. Porque eles estão quase todos na lista dos Blogues ao Sol, aí do lado direito. Há outros, mas não os leio assim tão regularmente. Questão de afinidades. Os meus blogues favoritos têm em comum a incidência na cultura e, em particular, nos livros e autores. Há, de certeza, muitos outros que vou gostar de descobrir, assim me chegue o tempo e a curiosidade. Para já, uma lista possível será esta:

1. Alcameh
2. Beattie’s Book Blog
3. Blog Operatório
4. Bibliotecário de Babel
5. Blogtailors
6. Bruaá
7. Cadeirão Voltaire
8. Da Literatura
9. Estado Civil
10. La Double Vie de Veronique
11. Ler
12. Mar Salgado
13. Planeta Tangerina
14. The Frontal Cortex
15. Vintage Children’s Books

O QUE É QUE SE DIZ? MAU GOSTO, TALVEZ


Quando os CTT se lançaram no inefável mundo das comunicações móveis, houve alguns senhores administradores (ou accionistas, não sei bem) que manifestaram o seu incómodo pelo nome do produto, uma declinação mariquinhas do vernáculo, que deu pelo nome de Phone-ix. Eu acho que pior do que dizer asneiras, é dizê-las mal, mas o aqui o caso é outro. É puro e simples mau gosto pimba. Mais ainda com esta campanha de Natal, em que uma menina graciosa agradece o presente ao papá, com a frase que se lê na imagem acima. Giro, não é? Daqui a uns anos, se não a estragarem com mimos, talvez ela pergunte aos pais (aos pais de verdade) se estavam assim tão necessitados de dinheiro para a porem a fazer esta triste figura. E o que é que eles lhe vão dizer? Phone-ix, sei lá.

UM LIVRO PARA TIM BURTON


Oswald e o Fim do Mundo, de Andrew Strong, é um daqueles livros cuja capa, porventura demasiado infantil, pode afastar um destinatário adolescente ou pré-adolescente, capaz de tirar maior partido da multiplicidade de sentidos e da riqueza de linguagem. Daria uma excelente adaptação cinematográfica pela mão de Tim Burton. O texto que se segue foi publicado na edição de Dezembro da revista LER.

Oswald e o Fim do Mundo
Andrew Strong
Presença

"Mas que maneira de morrer, ser engolido vivo por uma criatura marinha." Começa assim, numa evocação de Pinóquio, a aventura de Oswald com um pai excêntrico e perturbado – ou, tal como aquele o descreve, "um trapaceiro barbudo, louco e mentiroso, um vigarista absurdo". Não é comum ver figuras parentais retratadas de modo quase implacável, mas essa é apenas uma das originalidades de Oswald e o Fim do Mundo. Outra, são os cenários de Idlegreen, provavelmente inspirados pelas vivências do autor, que diz habitar "no meio de nada", no País de Gales. Idlegreen é uma espécie de Terra do Nunca distópica, onde coabitam figuras prepotentes e ridículas, famílias disfuncionais e grupos subversivos. Herói hesitante, Oswald resiste ao papel de messias pré-apocalíptico, numa história que é afinal uma parábola social sobre o confronto do espírito humano com a crença e o medo. Menos claro é o destinatário do livro. Andrew Strong escreve muito bem, a tradução competente de Jorge Freire ajuda, mas as longas descrições e o ritmo da narrativa podem cansar um leitor mais infantil. Já os fãs de Tim Burton, Neil Gaiman ou Lemony Snicket sentir-se-ão em casa.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

CAFÉS LITERÁRIOS NAS CALDAS DA RAINHA


Já aqui falámos da Loja 107, nas Caldas da Rainha, uma daquelas livrarias de autor que suscitam cultos e fidelidades prolongadas. A alma da casa chama-se Isabel Castanheira e tem duas paixões bem conhecidas, além dos livros: gatos e Rafael Bordalo Pinheiro. Quem lá entra, não pode deixar de reparar na colecção de bonecos de barro e cerâmica caldense, da qual faz parte a figura que se vê nesta fotografia.

Pela Loja 107 têm passado dezenas de escritores (veja-se aqui o álbum de fotografias) que gostam de cultivar o hábito de “conhecer” as pessoas que os lêem. Todos ganham com isso. Agora com extensão à cafetaria do novo Centro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha, os Cafés Literários organizados pela Loja 107 acontecem neste sábado, às 17h00, com a apresentação do livro A Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha. Estarão presentes duas das autoras: Cristina Horta (directora do Museu de Cerâmica) e Elsa Rebelo. Na sexta-feira da semana que vem, às 21h30, o convidado será de peso: António Lobo Antunes, para falar sobre O Arquipélago da Insónia.

Ah, a Isabel Castanheira tem também um blogue que vale a pena visitar: Cavacos das Caldas. Há lá mais pormenores sobre o que vai acontecer.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

O ABANDONO DA IMAGINAÇÃO



Via Bruaá, esta campanha genial de promoção da leitura, desenvolvida pela Fundação de Alfabetização do Canadá e concebida pela agência Beaublancrouge. Peter Pan e Cinderela no hospital, doentes e envelhecidos. Causa do agravamento dos sintomas: abandono prematuro. "Quando uma criança não lê, a imaginação desaparece." Terapia aconselhada: livros. Não tem contra-indicações.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

EQUÍVOCOS DA ESCRITA “PARA CRIANÇAS”

Perguntam-me, às vezes, se penso escrever um dia “para adultos”, como se escrever livros “para crianças” fosse uma espécie de tubo de ensaio para a escrita a sério. É um raciocínio equivocado a priori, mas compreende-se. Apesar de a quantidade de maus livros publicados numa área e noutra ser provavelmente equivalente, ainda vigora a ideia de que toda a gente sabe escrever “para crianças”, a começar pelas figuras públicas – com resultados que estão à vista e são, regra geral, sofríveis. Nunca digo desta água não beberei, mas não tenho planos imediatos para escrever romances ou ensaios. O que eu gostava era de fazer livros como um Roald Dahl, uma Kate DiCamillo, um Maurice Sendak, um Peter Sís, um Anthony Browne, uma Babette Cole, um Neil Gaiman, um Max Velthuijs, um Shel Silverstein. Este céu é que é o meu limite. E não é querer pouco.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

UM LIVRO RARO: THE FOOL AND THE VANISHER


The Mistery of the Fool and the Vanisher estava na secção de livros para crianças de uma livraria anódina em Dublin, mas poderia também encontrar-se junto à fotografia ou à banda desenhada, pelo menos. É uma novela gráfica absolutamente fascinante, que leva até aos limites o conceito de “suspensão da descrença”. Porque tendemos a acreditar na fotografia, tomando-a como prova fidedigna da realidade, torna-se difícil (querer) distinguir aqui o verdadeiro do falso, o autêntico do forjado. No limite, claro que tudo é invenção dos autores, David e Ruth Ellwand, mas a concepção do livro é tão engenhosa que balançamos na fronteira da verosimilhança. Fotografias actuais combinam-se com outras que imitam (?) processos antigos, como a daguerreotipia, e surgem pelo meio do texto objectos tão improváveis como uma armadura de conchas ou um capacete minúsculo feito de casca de caracol, com duas patas de ave incrustadas. Tudo rigorosamente legendado, como num livro técnico.

Sem querer contar demasiado, a história compreende dois tempos distintos, separados por mais de cem anos, e estrutura-se como um diário pessoal dentro de outro diário. O autor, fotógrafo, em passeio por uma região de bosques misteriosos (outros ou os mesmos de Conan Doyle ou Tolkien, Winnie-the-Pooh ou O Vento nos Salgueiros), encontra uma velha caixa numa casa em ruínas. Lá dentro, há vestígios de um mundo perdido: uma gravação de voz, uma máscara grotesca, um par de óculos com duas pedras furadas no lugar das lentes, uma série de objectos estranhos e um álbum-diário com velhas fotografias em tons de sépia. A caixa pertencia a Isaac Wilde, “artist and fairy seeker”, também ele fotógrafo, pouco recompensado financeiramente. Em Janeiro de 1889, Wilde é recrutado para um projecto de pesquisa arqueológica numa antiga mina abandonada, onde subsistem lendas e crenças populares acerca dessa espécie de seres elementais a que chamam “pixies”. Para o Dr. Gibson Gayle, director do projecto, as crenças não passam disso mesmo, e o seu comportamento crescerá em impaciência e desprezo para com Wilde. Enquanto um vê a fotografia como uma mera técnica ao serviço da ciência, o outro mergulha na obsessão de registar em daguerreótipo (o primeiro processo fotográfico que se impôs pelo rigor e qualidade) as evidências de um mundo paralelo habitado por “little people”. Os óculos funcionam como porta de passagem e guardam o seu perigo e o seu segredo, como se verá. Um ou mais desaparecimentos – daí o título, The Fool and The Vanisher – precipitam o final da história, passível de várias interpretações. Quem é “o louco” no meio disto tudo, é coisa que também não é fácil decidir.

The Mistery of the Fool and The Vanisher, de David e Ruth Ellwand, Walker Books, 2008.

À venda na Amazon. O trailer pode ser visto no You Tube.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

COMUNIDADE DE LEITORES CULTURGEST EM BLOGUE

Já assumi aqui que fazia parte dos suspeitos do costume na Comunidade de Leitores da Culturgest, coordenada pela Helena Vasconcelos. A minha opinião é, por isso, afectiva e abertamente facciosa. Os leitores poderão tirar as suas conclusões visitando o blogue recém-criado, aqui. E, quem sabe, abalançarem-se para a leitura das obras a partilhar entre Janeiro e Março do ano que vem. Tema: “O Dinheiro e/ou a Felicidade?”. Respondem Alain de Botton, Martin Amis , F. Scott Fitzgerald, Henry James, Marguerite Duras e Jane Austen.
A ÁRVORE GENEROSA

Durante quatro anos, ele parou de fotografar, por distracção ou fastio. Até que uma árvore morta se colou à sua sombra, para que ele reaprendesse a olhar para o mundo. Chamou-lhe My Friend the Dead Tree. E tirou-lhe centenas de fotografias, como se fosse a primeira namorada.

domingo, 30 de novembro de 2008

ISTO PARA MIM É FINLANDÊS


Além de Tove Jansson, “mãe” da série dos Moomins (na ilustração acima), o mundo dos ilustradores finlandeses deve ser desconhecido para a maioria – e aqui me incluo. Assim deverá continuar, já que a exposição recém-inaugurada no Palácio Galveias – “Truth and Tales” – não vai contribuir para grandes esclarecimentos. Ali se acumulam, sem qualquer noção inteligível de ordem – cronológica, temática ou outras –, alguns trabalhos de 29 ilustradores finlandeses de livros para crianças, produzidos nos últimos 40 anos. Não vi nada que ultrapassasse as fronteiras do convencional, mas o que aborrece mesmo é a ausência de um catálogo, um programa ou meia dúzia de textos em placards que contextualizem o percurso do visitante incauto. É tudo ao molho e fé em Deus, numa mistura de datas, livros, nomes e sequências de ilustrações por vezes arbitrárias, acompanhadas de legendas que pouco ou nada dizem. Pronto, já sei que é tudo muito difícil, que há pouco dinheiro e não sei que mais, mas não vale a pena atravessar a montanha desde lá das auroras boreais para chegar aqui e parir um rato.

“Truth and Tales” é apresentada pela Bedeteca de Lisboa e produzida pela Associação de Ilustradores Finlandeses, com o patrocínio do Ministério da Educação da Finlândia e da Fundação para a Cultura da Finlândia e o apoio da Embaixada da Finlândia.
NÃO HAVIA PORTUGUESES A BORDO

O jornalismo está cheio de lugares-comuns. Na imprensa, há os “prados verdejantes” e o “país de contrastes”, entre outros “pequenos recantos” onde se abriga a falta de imaginação. Pior, porque inútil e oportunista, é aquela mania de os telejornais fecharem notícias sobre acidentes aéreos com a expressão “não havia portugueses a bordo”. É uma informação que interessa, exclusivamente, às famílias e amigos de quem viajou naqueles dias; e sabe-se como as más notícias correm depressa. O resto é irrelevante, do ponto de vista jornalístico. Por que é que a morte de um português num desastre de avião na Tailândia tem mais peso do que a de um colombiano nas cheias ou a de um japonês num tremor de terra? A morte é absoluta, não importa se se trata de uma ou de mil pessoas. Sim, eu sei que há isso a que chamam o “critério da proximidade geográfica”, mas juro que não entendo. Não entendo como é que a morte pode ser assim uma coisa tão portuguesa, que entre em casa à hora do jantar com o pretexto de sossegar as consciências, anunciando o vazio informativo: “Não havia portugueses a bordo”. Isso que dizer que podemos comer descansados?

sábado, 29 de novembro de 2008

ESTÁ UM TEMPO WELLINGTONEANO


Wellington, capital da Nova Zelândia, é uma das cidades mais ventosas que conheço. Quando o vento se revolta no estreito de Cook, a travessia de ferry-boat entre as duas ilhas não soa propriamente como uma canção de embalar. “Windy Wellington”, chamam-lhe. Quanto a Big Weather, uma colectânea de poetas neozelandeses, é muito mais do que uma conversa sobre o tempo e a cidade das cem colinas. “The strong queen of the south”, “the last colonial outpost”, “a delicatessen visited by Walt Whitman”, “sterile whore of a thousand bureaucrats” – Wellington é tudo isso, um melting pot a meio caminho entre o Oceano Pacífico e o Pólo Sul. Um dos meus poemas preferidos, de Iain Sharp:

The Desperadoes

Hand in hand we skip
down Molesworth Street.
It’s good to be alone
in a capital city.
It’s good to steal flowers
from the parliamentary gardens
while the ministers are in session.
Ah, look at your face.
You’re as beautiful as jazz,
as jasmine.
We chuck pebbles
at the night sky.
Cracks appear in the moon.

Big Weather – Poems of Wellington, vários autores, selecção de Gregory O’Brien e Louise White, ed. Mallinson Rendel, 2000

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

HOJE É DIA DE ENID BLYTON


Enid Blyton morreu a 28 de Novembro de 1968, faz hoje precisamente 40 anos. Mais ou menos o mesmo tempo que durou a sua carreira de escritora, ao longo da qual assinou largas centenas de livros. Está traduzida para cerca de 90 idiomas. A colecção d’Os Cinco continua a ser a mais vendida em todo o mundo, mas actualmente a febre “blytoneana” diz respeito ao Noddy, agora transformado num boneco-brinquedo sem grande graça – que os miúdos adoram, eu sei. Li quase tudo d’Os Cinco e alguns do Clube dos Sete. Achava a Ana mariquinhas, o David enigmático, o Júlio convencido e a Zé a personagem mais interessante. Um verdadeiro “role-model”, melhor dizendo, rebelde e solitária como convém. Também passei pela fase do Colégio das Quatro Torres e das Gémeas no Colégio de Santa Clara; cheguei a pedir à minha mãe que me inscrevesse num colégio interno, pretensão a que ela não deu o mínimo cabimento, como seria de esperar. No Reino Unido, Enid Blyton foi recentemente eleita como a escritora “mais querida” dos leitores, que devem ter achado esta edição especial comemorativa uma delícia. E é mesmo.

The Famous Five’s Survival Guide, vários autores, Hodder Children’s Books, 2008

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

MORRER DE AMOR, 2


O texto de Filipe Nunes Vicente remete para algo que está, para mim, entre os maiores mistérios: a morte quase sucessiva de duas pessoas que partilharam longos anos de vida em comum, com ou sem casamento oficial. De vez em quando surgem casos assim, que nos deixam a pensar. Giulietta Masina morreu a 23 de Março de 1994, cinco meses depois de Federico Fellini. Idêntico lapso de tempo separa as mortes de Suzanne Descheveaux Dumesnil, a 17 de Julho de 1989, de Samuel Beckett, a 22 de Dezembro desse mesmo ano. Johnny Cash não sobreviveu mais do que quatro meses à perda da mulher da sua vida e companheira de palco, June Carter Cash; ambos faleceram em 2003. E Auguste Escoffier, celebrado chef da cozinha francesa e inventor do famoso Pêssego Melba, morreu a 12 de Fevereiro de 1935, apenas duas semanas depois de Delphine Daffis, com quem esteve casado durante 55 anos.

Há, com certeza, incontáveis exemplos, a maior parte dos quais diz respeito a pessoas de quem nunca se ouviu falar. O que está em causa é sempre o mesmo e ultrapassa os limites da coincidência. É como se o sobrevivente tivesse perdido um órgão vital e renunciasse à continuidade de uma aliança que se desfez para sempre, com o desvanecer da respiração do outro. Até que ponto esta renúncia é voluntária – isto é, até que ponto as pessoas se deixam morrer –, é algo que escapa às explicações racionais de quem está do lado de fora, a assistir à metamorfose que acompanha qualquer perda dolorosamente insuportável.

Há quem se mate por amor, mas morrer de amor é outra coisa. Outros Romeus e Julietas.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

MORRER DE AMOR, 1


“Quando nos morre alguém, para lá de tudo o mais, passa a existir um espaço mental e físico desalinhado. Quem perdemos fazia parte de um ritmo antigo, de uma repetição cadenciada de experiências que se nos entranhou na pele. Esta perturbação é mais subtil do que a tristeza imensa, mas não menos letal. Aparece sob a forma de uma cadeira vazia à mesa de jantar, coisa com a qual já contávamos mas que mesmo assim nos surpreende; como uma campainha habitualmente pontual mas agora inexplicavelmente muda; ou, ainda, vestida de uma voz cujo silêncio, naquele exacto momento, nos arranca as orelhas.”

Amor e Ódio , de Filipe Nunes Vicente, Quetzal, 2008.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

E AGORA PARA ALGO REALMENTE IMPRESSIONANTE

Via Bruáa, este pequeno filme no site do New York Times: miúdos filmados pelo fotógrafo Robbie Cooper, completamente concentrados nos jogos de video. Os olhos não mexem, como os bonecos do Noddy ou do Ruca, e as expressões limitam-se a uma mudança de frames, rodando e basculando sobre o corpo praticamente imóvel. Ironicamente, o vídeo chama-se Immersion, designação do sistema de aprendizagem de línguas estrangeiras adoptado nos Estados Unidos, que consiste em “mergulhar” as crianças no contexto linguístico e cultural de um idioma sem recorrer ao uso da sua língua de origem. Para ver clique aqui.

ROCK E LITERATURA, 2


"The House That Jack Kerouac Built", The Go-Betweens (Tallulah).


ROCK E LITERATURA, 1


O Bibliotecário de Babel descobriu um blogue com uma lista enorme de nomes de bandas inspiradas por livros: Bookride. Além das que já foram acrescentadas nos comentários, aqui ficam mais algumas, após rápida passagem pela estante discográfica:

Genesis
The Divine Comedy
The Godfathers
The Tiger Lillies (Tigerlily é a princesa índia de Peter Pan)
The Go-Betweens (no singular, é um romance de Leslie Poles Hartley)
E ainda um escritor que resultou em nome de banda: Marquis de Sade.

É um mundo. Já sei que vou andar o dia todo a pensar nisto…

A TRISTEZA É UM LUGAR SEM FUNDO


Como é que se conta a uma criança o que é perder um filho? A desesperada tristeza que há entre a perda e o luto? Não faço a mínima ideia. Por isso, quando pego neste livro de Michael Rosen (o mesmo de Vamos à Caça do Urso) e Quentin Blake, acredito que tenho nas mãos qualquer coisa de raro e precioso. Onde se lêem coisas assim:

“I write:

Sad is a place
that is deep and dark
like the space
under the bed

Sad is a place
that is high and light
like the sky
above my head

When it’s deep and dark
I don’t dare go there

When it’s high and light
I want to be thin air.

This last bit means that I don’t want to be here.
I just want to disappear."

Michael Rosen’s Sad Book, Walker Books, 2004. Ilustrações de Quentin Blake.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

domingo, 23 de novembro de 2008

HOMENAGEM AO LEIXÕES


O Leixões continua à frente nos jogos da Liga. Ganhou ao Porto, ganhou ao Sporting e o meu desejo é que ganhe também ao Benfica. É uma questão de igualdade de oportunidades. Sendo sportinguista por parte do pai e leixonense por parte do avô, considero-me ilibada de qualquer imparcialidade. A minha escolha é meramente política. Gosto quando os pequenos ganham aos grandes. Deve ser uma coisa um bocado de esquerda.
HERÓIS

Não é por acaso que o post anterior está na etiqueta “Heróis”. Manuel João Vieira faz parte desse tipo de pessoas que considero inspiradoras, ao contrário dos cínicos, dos cépticos e dos moralistas. Não é um heroísmo do tipo épico, mas um heroísmo do dia-a-dia que desafia o cinzentismo e o conformismo, essa coisa acabrunhante que é às vezes sentir-se português. Pessoas desalinhadas, espíritos livres, originais, desprendidos, com tendência para o excessivo – gosto disso. Manuel João Vieira, mas também J.P. Simões, Manuel António Pina, Alberto Pimenta, Herberto Helder. E ainda Mário Viegas, Natália Correia, Agostinho da Silva, António Variações, Luiz Pacheco, Mário Cesariny, Al Berto, Alexandre O’Neill…

Não importam as discórdias entre eles. Não importa concordarmos sempre com o que dizem ou disseram. Fazem falta, é tudo. E desaparecem. Estão sempre a desaparecer-nos.
É UM MUNDO CATITA

Hoje ninguém vai querer perder isto. Às 23h40, na RTP 2.

“Filmada em HDv e em película, a série é uma viagem ao imaginário de Manuel João Vieira, em que os sonhos se misturam com uma cinzenta realidade, e onde seguimos o protagonista numa sucessão de aventuras e desventuras. É uma comédia de costumes, um conto de Natal, e um épico romance.
De tanto em tanto tempo surge uma série tão especial que mudará para sempre a história da televisão.
Esta não é uma delas.”

Os meus sinceros agradecimentos ao João Tordo.

sábado, 22 de novembro de 2008

TÃO PERTO E TÃO LONGE


O senhor coelho e o senhor pato vivem perto um do outro. Cruzam-se a caminho do trabalho e no regresso a casa. Cruzam-se quando vão à praça, quando viajam e quando vão ao parque. Não se conhecem, nem se cumprimentam. “É realmente uma pena… poderiam ser grandes amigos.”

Com texto e ilustração da argentina Natalia Colombo, Perto é uma edição da Kalandraka para o livro contemplado este ano com o 1º Prémio Internacional Compostela para álbuns ilustrados. Um pequeno grande livro. Esperemos que não passe despercebido com o barulho das luzes do Natal.
RECLAMAÇÃO: ORTOGRAFIA E GRAMÁTICA

Numa Livraria Bertrand, hoje de manhã. A senhora põe um papelinho escrito diante da livreira, pousa no balcão o livro que traz na mão e diz, com voz tímida: “Bom dia. O assunto que me traz aqui é grave e delicado.” Prevê-se o pior na fila de espera. Um pedido urgente para ajudar alguém, um comunicado caridoso de alguma nova igreja ou algo mais insólito. Mas não. A senhora reclama porque o livro que comprou numa outra livraria, editado pela Bertrand, está, alegadamente, cheio de “erros ortográficos e gramaticais gravíssimos.” A senhora cora, a timidez ganhou matizes de irritação: “Eu comecei a ler e nem queria acreditar. Apontei os erros todos, estão aqui”, diz, mostrando o papelinho com uma lista de frases e palavras antecedidas pelo número de página. “A Bertrand não se pode dar ao luxo de publicar livros assim. Um livro que custa mais de vinte euros! Eu sinto-me enganada. Nunca mais compro livros da Bertrand, isso de certeza.” A livreira ouve com atenção e, no fim, responde: “Tem toda a razão. Vou dar-lhe um número de telefone para onde pode reclamar.” A senhora desfaz-se em agradecimentos. Até que enfim, alguém que não se limita a sacudir a água do capote. Se chegar a ligar o número – e parece determinada a isso – é que vão começar as verdadeiras dificuldades.

PS – Qual é o livro? Beatriz de Portugal, de Paula Cifuentes. Quem tiver em casa, pode confirmar ou desmentir a reclamação. Mas parece-me escusado.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

SEM RECEITA MÉDICA


O trabalho braçal é um excelente antídoto quer para a imobilidade quer para a inquietação do espírito. Uso regularmente.

RED, HOT AND BLUE


As pohutukahas são também conhecidas, em Portugal e nos seus antípodas, como a “Árvore-de-Natal-da-Nova-Zelândia” (New Zealand Christmas Tree). A explicação está na cor, a lembrar o vermelho do azevinho, razão por que os primeiros colonizadores europeus a elegeram como árvore simbólica da época natalícia. A diferença é que, lá, o Natal é também sinónimo de praia e t-shirts – e diz a tradição que quanto mais intensas na cor e exuberantes forem as flores, melhor vai ser o Verão nesse ano. Por cá, as pohutukahas (palavra que significa “salpicada pelo mar”, em maori) dão pelo nome de metrosíderos. Florescem no nosso Verão e encontram-se facilmente nos jardins botânicos e costeiros. Podem chegar aos vinte metros de altura ou mais. É uma árvore conhecida pela resistência da madeira (do grego síderos, ferro) e pela resiliência aos climas agrestes marítimos. Toda a zona da Foz do Porto até ao Castelo do Queijo está plantada com dezenas de metrosíderos de porte médio; o maior exemplar centenário que me lembro de ver encontra-se na Madeira, Funchal, na Estalagem Casa Velha do Palheiro. Os jardins do início do século XIX são magníficos e não é preciso estar lá hospedado para os conhecer.

NATAL NA NOVA ZELÂNDIA


As pohutukawas estão em flor nos antípodas. Na região costeira de Coromandel, Ilha Norte, o festival dedicado às árvores mais amadas da Nova Zelândia começa hoje. Prevê-se que este ano o Natal seja mais quente do que o habitual. Ai, quem me dera estar aqui.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

PRÉMIO MATILDE ROSA ARAÚJO DE REVELAÇÃO


Na sua 4ª edição desde 2000, o prémio Matilde Rosa Araújo de Revelação na Literatura Infantil e Juvenil, atribuído pela Câmara Municipal de Cascais, foi agora para João Hoffman e Margarida Araújo, autores de A Ilha dos Guardadores de Aranhas. É o primeiro volume da série “A Lenda da Cidadela”, já continuada com O Mistério dos Mantos Negros. Para o início de 2009 está programada a saída de A Aliança das Orquídeas de Bronze, terceiro capítulo de uma aventura em cinco volumes, aposta da QuidNovi.

O REGRESSO DE J.K.


A 4 de Dezembro, chega às livrarias a tradução em português do novo livro de J.K. Rowling pós-Harry Potter. Tenho alguma curiosidade, sem exageros. Fica a informação da Editorial Presença: “Os Contos de Beedle, o Bardo incluem cinco histórias de magia e feitiçaria ligadas a Hermione Granger por Albus Dumbledore, no sétimo e último livro da saga, Harry Potter e os Talismãs da Morte. Apenas uma dessas histórias – O Conto dos Três Irmãos – é citada no livro. As restantes quatro histórias são reveladas pela primeira vez em Os Contos de Beedle, o Bardo.”

AS NOVAS CENTRALIDADES PERDIDAS


Saí de manhã cedo e só há pouco liguei o computador, por isso as notícias dos blogues apanharam-me de surpresa. O post que coloquei ontem à noite parece-me agora uma premonitória coincidência de mau gosto. Há já algum tempo que se falava da precariedade da Byblos, mas, sinceramente, não pensei que este desfecho chegasse tão cedo. O sentimento preponderante é de tristeza e desilusão; e digo isto a partir de um lugar confortável, imaginando apenas vagamente o que estarão a passar os livreiros e outros trabalhadores que hoje tiveram de ler a palavra “encerrado”, como fotografou o José Mário Silva (e, provavelmente, tiveram de ser eles próprios a escrever e a afixar o papel…). A localização, como sabe qualquer pessoa de bom senso, foi o grande calcanhar de Aquiles da Byblos. Por muito boa vontade da florista francesa e da loja de vinhos adjacentes, aquele sítio é um corredor de vento poluído por tubos de escape, a meio de lugar nenhum. Américo Areal estava redondamente enganado quando pensou que poderia, com a Byblos, influenciar “as novas centralidades” de Lisboa, como então me explicou. Mas o problema não foi só esse, claro. No texto que escrevi para a Notícias Magazine (e não, não sou eu a “articulista” citada por Eduardo Pitta), publicado a 16 de Dezembro de 2007, ficou evidente o entusiasmo pelo novo projecto; o resto é informação, sem juízos de valor. Abstive-me apenas de reproduzir a imagem dos “camiõezinhos” cheios de dinheiro da venda da Asa, porque não quis que o homem parecesse um tonto. Outras pessoas não tiveram essas pruridos. O que me incomoda, agora, é ler a conclusão desse texto e perceber que houve aqui algo mais que ultrapassou um entusiasmo pueril e inconsciente:

“Haverá, certamente, entre os 150 mil títulos da Byblos, algum que nos explique as razões do optimismo enquanto visão do mundo. Américo Augusto Areal adianta: «Não nos podemos deixar abater com o que os outros pensam. Este é um conceito diferente, é natural que suscite dúvidas. Pensa que não as tenho? Claro que tenho! Agora, há uma coisa importantíssima: nós temos meios de gestão fantásticos para analisarmos os dados e as estatísticas e mudar o leme quando for preciso. Sem nunca alterarmos o nosso grande objectivo: o livro.»”

Onde estiveram, ao longo de um ano, esses “meios de gestão fantásticos” de que Américo Areal falava com tantas certezas? É isto que me chateia.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

PARADOXO


Um pouco de humor negro nunca fez mal a ninguém.

O HOMEM QUE MATOU SIDÓNIO PAIS


A partir de amanhã nas livrarias, O Homem que Matou Sidónio Pais, um trabalho de investigação do jornalista Paulo Barriga (actual gerente da livraria Vemos, Ouvimos e Lemos, em Serpa), desta vez assinado em parceria com Alberto Franco. É o segundo título publicado pela Guerra & Paz, depois de Terra Vermelha – Crença e Submissão no Alentejo, na continuidade de um género que dá espaço e tempo ao jornalismo, ao arrepio da tendência actual. Surge no momento em que se assinalam 90 anos sobre o assassinato do “Presidente-Rei” Sidónio Pais por José Júlio da Costa, acontecimento que pôs fim a um percurso político tão fulgurante como contestado. Aqui, há histórias dentro da História.