O texto de Filipe Nunes Vicente remete para algo que está, para mim, entre os maiores mistérios: a morte quase sucessiva de duas pessoas que partilharam longos anos de vida em comum, com ou sem casamento oficial. De vez em quando surgem casos assim, que nos deixam a pensar. Giulietta Masina morreu a 23 de Março de 1994, cinco meses depois de Federico Fellini. Idêntico lapso de tempo separa as mortes de Suzanne Descheveaux Dumesnil, a 17 de Julho de 1989, de Samuel Beckett, a 22 de Dezembro desse mesmo ano. Johnny Cash não sobreviveu mais do que quatro meses à perda da mulher da sua vida e companheira de palco, June Carter Cash; ambos faleceram em 2003. E Auguste Escoffier, celebrado chef da cozinha francesa e inventor do famoso Pêssego Melba, morreu a 12 de Fevereiro de 1935, apenas duas semanas depois de Delphine Daffis, com quem esteve casado durante 55 anos.
Há, com certeza, incontáveis exemplos, a maior parte dos quais diz respeito a pessoas de quem nunca se ouviu falar. O que está em causa é sempre o mesmo e ultrapassa os limites da coincidência. É como se o sobrevivente tivesse perdido um órgão vital e renunciasse à continuidade de uma aliança que se desfez para sempre, com o desvanecer da respiração do outro. Até que ponto esta renúncia é voluntária – isto é, até que ponto as pessoas se deixam morrer –, é algo que escapa às explicações racionais de quem está do lado de fora, a assistir à metamorfose que acompanha qualquer perda dolorosamente insuportável.
Há quem se mate por amor, mas morrer de amor é outra coisa. Outros Romeus e Julietas.
Há, com certeza, incontáveis exemplos, a maior parte dos quais diz respeito a pessoas de quem nunca se ouviu falar. O que está em causa é sempre o mesmo e ultrapassa os limites da coincidência. É como se o sobrevivente tivesse perdido um órgão vital e renunciasse à continuidade de uma aliança que se desfez para sempre, com o desvanecer da respiração do outro. Até que ponto esta renúncia é voluntária – isto é, até que ponto as pessoas se deixam morrer –, é algo que escapa às explicações racionais de quem está do lado de fora, a assistir à metamorfose que acompanha qualquer perda dolorosamente insuportável.
Há quem se mate por amor, mas morrer de amor é outra coisa. Outros Romeus e Julietas.
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