Há mais estações e apeadeiros abandonados em Portugal do que, à primeira vista, se possa pensar. Não falamos de lugares perdidos no meio da paisagem, já consumidos pelo mato e pela erosão, mas de todas essas estações de comboios progressivamente desumanizadas, cujo maior recurso é a diabólica máquina de vender bilhetes. Vejam-nas: estão por toda a parte, como um exército invasor vindo de uma cultura sofisticada, atirando-nos à cara as nossas lamentáveis e frágeis emoções: o desejo de estar em casa à hora do jogo, o medo de chegar tarde à entrevista de emprego, a urgência de abraçar alguém antes de que o mundo se desmorone de vez… E o que fazem essas máquinas de vender bilhetes, na sua insuportável arrogância robotizada? Confundem-nos. Irritam-nos. Desesperam-nos. Fazem-nos passar por parvos ou por turistas na nossa própria terra. Atrás de nós, forma-se uma fila de gente impaciente, que suspira e revira os olhos perante o nosso desaire, a nossa imperdoável demora, a nossa tão humana indecisão («Querem ver que por causa deste/a ainda vou perder o comboio?»). Ora, não devia ser assim. Viajar requer uma predisposição mental e emocional que não precisa destas mesquinhices para nada. A viagem deve começar num estado de entrega e confiança, não de exigência. Estações de comboio fantasmas, com máquinas no lugar de pessoas, deviam ser rigorosamente proibidas. Temos saudades do tempo em que um chefe de estação representava a civilização, mesmo no meio do nada, e havia sempre alguém atrás do guichet para responder a um simples pedido: «É um bilhete, se faz favor.»
(Texto publicado na edição de 7 de Novembro da Notícias Magazine, revista de domingo no DN e JN, na secção "Nostalgia".)
(Texto publicado na edição de 7 de Novembro da Notícias Magazine, revista de domingo no DN e JN, na secção "Nostalgia".)
1 comentário:
sim, sim, tudo isso está muito certo, mas aposto que nunca te apeaste aqui:
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/56/Esta%C3%A7%C3%A3o_de_Zibreira.jpg
cumprimentos
zg
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