segunda-feira, 25 de janeiro de 2016
A MALA DO ESCRITOR
Um escritor viaja sempre com os seus tesouros. Uma bússola, uma lupa antiga, uma fotografia em tons de sépia, umas lunetas, uma estatueta africana, um jogo de dominó de casas tradicionais, um livro de pensamentos de Ralph Waldo Emerson, um lobo, uma nota de 50 escudos... Eis algumas das preciosidades que transportei na malinha encarnada que a minha mãe me ofereceu, em Angola, quando teria uns dois anos (era quase do meu tamanho...). Partilhei-a nas 15 oficinas de escrita criativa que fiz a semana passada no município de Nelas, a convite da Fundação Lapa do Lobo, e incitei os miúdos (cerca de 250. ao todo) a fazerem o mesmo, para que um dia possam sentir o amor das coisas suas. A julgar pelo silêncio e pela atenção, creio que a malinha deu origem à maior surpresa e aos momentos mais mágicos. Fizemos também jogos de palavras, de atenção, de imaginação... e, claro, escrevemos pequenos contos. O tema era a família e todos tinham lido o Amores de Família nas semanas anteriores. Gostaram do tema e do livro, «porque era diferente», disseram-me. Surgiram textos com muita graça, outros ainda muito presos ao concreto e ao banal, mas todos participaram, sem quaisquer embirrações. É espantosa a diferença que fazem os professores: afectuosos e entusiastas, nos melhores casos; rígidos e desinteressados, nos piores. Encontrei crianças num estado de apatia total, como se tudo fosse uma grande maçada. Triste. Como alguém dizia, «alguns professores não se dão conta do poder que têm na formação da consciência e da autoestima das crianças». Totalmente de acordo.
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