Ler ou reler Peter Pan, hoje, é evocar um direito fundamental das crianças,
essencial ao seu desenvolvimento emocional, cognitivo e relacional: o direito
de brincar. Mas brincar livremente, de forma espontânea e sem a orientação dos
adultos. Preenchido por múltiplas atividades escolares e extraescolares, por
jogos repetitivos em frente a um ecrã, por demasiadas horas passadas em espaços
fechados, o tempo livre das crianças também já nos surge como uma espécie de
utopia. Se o leitor quer uma expressão realmente contraditória, reflita nesta:
«ocupação de tempos livres». A questão é evidente: se o tempo é livre, para quê
ocupá-lo?
Peter Pan, obra que celebrizou o escocês James Matthew Barrie (1860-1937), faz parte da mesma família literária em que se encontram a Terra Média de J.R.R. Tolkien, o Mundo de Oz de L. Frank Baum, a Nárnia de C.S. Lewis ou, como já dissemos, o País das Maravilhas de Lewis Carroll. São lugares imaginados até ao pormenor e dotados de vida própria; lugares que, pela sua riqueza simbólica, se tornam absolutamente reais na cabeça do leitor. Representam uma possibilidade de evasão, um jogo interminável, uma aventura com a sua dose de risco. Quem acha que Peter Pan é uma brincadeira de crianças, sabe apenas uma pequena parte da história.
(Excerto do prefácio que escrevi para Peter Pan, recentemente reeditado pela Fábula, uma chancela da 20|20. A tradução é de José Manuel Lopes.)
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