quinta-feira, 2 de julho de 2009

COMER OS LIVROS, 2


Então Portugal era isto: uma mesa posta sem toalha, um copo de vinho, um prato de louça rústica e uns talheres enferrujados. Naquele que foi um dos “Livros da Minha Infância”, o grande desgosto era ver o meu país representado por apenas duas receitas (Carne de Porco à Alentejana e Fatias de Tomar), uma das quais me enchia de vergonha. Quem é que teria dito ao senhor Roland Gööck que os portugueses eram uns javardos à mesa? Por que não teríamos também direito a uma toalha de pano e a uns talheres decentes, como todos os países de As 100 Mais Famosas Receitas do Mundo? Já não pedia o bule de prata que acompanhava a Sachertorte austríaca, nem o serviço de louça inglesa usado para servir a Mockturtle-Soup, mas ao menos uma mesa bem posta, senhores…


O problema é que esta imagem não me era de todo estranha – e daí a zanga projectada no autor. Que uma aldeia do Minho nos anos 1970 fosse, afinal, tão parecida com uma aldeia do Alentejo, dois extremos unidos por uma certa ideia de pobreza à volta do prato cheio. Uma fome do espírito que também doía no estômago, se percebem o que quero dizer.

2 comentários:

vera disse...

Mas afinal toda a cozinha tradicional tem raizes pobres, agricolas e anossa tambem, qual e o mal disso ? o livro era ate muito vanguardista, agora as mesas mais chics reproduzem os ambientes rusticos , com cozinha de regresso as origens com ingredientes simples, no internacionalissimo Pain Quotidien (Paris, Bruxelas, NY etc) a mesa e posta sem toalha, em cima da madeira bruta e eu acho requintadissimo ;-)

vera disse...

aqui vai um link para o restaurante rustico-pobre da moda, que ainda nao chegou a portugal e talvez nunca chegue porque temos tendencia a desprezar a pobreza, talvez porque de facto vivemos muito tempo na pobreza ...)
www.flickr.com/photos/hustleofculture/3143932136/