terça-feira, 26 de abril de 2011

I'M BACK IN THE USSR


Era a época em que a Praça Vermelha tinha mais graça do que O Capuchinho Vermelho. Muitos livros para crianças eram impressos na antiga União Soviética, traduzidos do russo. Caso das Edições Malich, que chegaram cá no final dos anos 1970 e 80. Moscovo de todos nós.

Os hábitos de leitura mudaram com a Revolução dos Cravos. Passada a era dos heróis beatos e das gestas patrióticas, os adultos aplicaram-se a decifrar obras como a Economia e Organização da Agricultura na Bulgária, ao mesmo tempo que difundiam os contos tradicionais russos pela sua prole. Histórias de fadas e princesas pareciam agora disformes à luz do socialismo, e apareceu todo um manancial de livros portadores de novas influências e valores. As crianças eram apanhadas a ler adaptações de contos de Tolstoi, Gorki, Tcheckov, Lermontov ou outro grande escritor cuja obra «se caracterizava por um profundo pessimismo». De repente, despontou uma estranha curiosidade infantil à volta de certas palavras («que quer dizer samovar?», «que é um tártaro?», «que é um cossaco?»), a que só alguns crescidos sabiam responder. No meio desta estimulante dinâmica geracional, surgiram livros irresistíveis em formato pop-up, mostrando os monumentos da Praça Vermelha a três dimensões, uma coisa formidável. Moscovo, de Eveguéni Ossetrov, faz parte da mesma colecção que deu a conhecer os feitos de V. Sevastianov, piloto cosmonauta da URSS. Falava das estrelas rubis nas torres do Kremlin, das óperas no Teatro Bolshoi, dos ícones de Andrei Rubliov e de um lugar ao sol nas colinas Lénine, o Palácio dos Pioneiros, conhecido como «o mundo das crianças alegres». Aí se podia «observar a Lua e as estrelas pelo telescópio, ou construir um robot falante». Soava melhor do que contos de fadas, é certo.

(Texto publicado na edição de 24 de Abril da Notícias Magazine, revista de domingo no Diário de Notícias e Jornal de Notícias, na secção "Nostalgia". O título deste post só podia vir daqui.)

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