quarta-feira, 6 de abril de 2011

SOPHIA E OS LIVROS PARA CRIANÇAS, 1975

“Um dos problemas do povo português e dos povos modernos ocidentais é a alienação cultural. De certa maneira, do ponto de vista da cultura, nós estamos divididos em castas. E nenhuma democracia real é possível enquanto não houver uma plataforma comum de cultura a que todos os homens tenham acesso. Porque a cultura não é só saber, não é só erudição, é uma interrogação do homem para a consciência.”
(…)

“Por mim, há um ponto em que eu sempre trabalhei com uma consciência política, que foi o facto de escrever para crianças. Sempre me doeu e me magoou profundamente pensar que havia livros que eu escrevia e artigos que eu escrevia e que se dirigiam, de uma forma geral, salvo raras excepções, e só podiam ser entendidos por um pequeno número privilegiado de homens que desde a sua infância tinham sido educados para compreender uma moldura muito evoluída. Isto é, para o escritor, como uma doença, como uma ferida. Um escritor que só pode ser compreendido por algumas pessoas não chega a ser inteiramente um escritor.”
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“Há um problema nos livros para crianças que sempre me preocupou muito e que é um problema que dentro de uma organização capitalista é muito difícil de resolver, que é este: o livro para crianças deve ser um livro aberto, que abre o horizonte da criança para uma cultura literária, mas também deve abrir o horizonte da criança para uma cultura plástica. Aliás, as crianças, e eu já várias vezes em reuniões com crianças perguntei isso, querem um livro cuja ilustração seja bela. Ora, a ilustração dos livros é muito cara, e acontece esta coisa terrível – acontecia, no regime em que nós vivemos. É que um livro com ilustrações belas era um livro caro, que só podia ser comprado por crianças privilegiadas.”

(Declarações de Sophia de Mello Breyner Andresen à RDP, em 1975, recuperadas para o programa de Luís Caetano, “A Força das Coisas”, dedicado ao Dia Internacional do Livro Infantil, 2 de Abril. Para ouvir o programa completo clique aqui.)

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