«Jacinto era um bom contador de histórias. A
sua voz equilibrava-se entre a serenidade e a fúria.» As primeiras três linhas
de O Último Conto fazem jus a um dos
títulos de Maria Gabriela Llansol, segundo a qual «o começo de um livro é
precioso». Assim é também para o contador de histórias, cuja voz ressoa nas
paredes míticas da casa do mundo. O seu trabalho consiste em amalgamar
memórias, explicações, augúrios, sonhos e rituais. É um nómada da palavra dita.
Onde quer que pare, a viagem começa.
No caso, Jacinto «gostava de contar histórias
debaixo de uma árvore, apoiando a perna sobre um caixote». Os habitantes do
bairro convergiam para aquele lugar, as casas inclinavam-se para o ouvir
melhor. «Não conseguíamos resistir à tentação de viver, por alguns minutos, o
tempo infinito da fantasia.» Ninguém acreditava que o encantamento se quebrasse,
mas chegou um dia em que a voz de Jacinto deixou de se ouvir. Tinha desaparecido
no olhar de alguém que escutava, e todos o viram «dar um passo em direção
àquele mistério». O ar encheu-se de presságios perante o que estava para
acontecer. «Permanecemos em silêncio até que o estrondo de um avião nos
dispersou.»
Lançado em edição simultânea no México, Brasil
e Portugal, O Último Conto é o
segundo livro de Rodolfo Castro (Argentina, 1963) publicado na Gatafunho,
depois de A Intenção Leitora, a Intenção
Narrativa, sobre a sua experiência de contador de histórias, a viver há
três anos e meio em Portugal. É um picture book com marcas de novela gráfica,
em que o trabalho do ilustrador Enrique Torralba (México, 1969), com nítidas influências
de Shaun Tan, nos remete para um universo onírico mas inquietantemente próximo.
Um pequeno tesouro.
O Último
Conto
Rodolfo Castro
Enrique Torralba (ilustr.)
Gatafunho
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