quinta-feira, 10 de março de 2016

PRINCESAS



Toda a árvore é um microcosmos singular debruçado sobre o mundo. Dos capilares subterrâneos até ao ramo mais alto, formas transitórias de vida passam por ela buscando abrigo e alimento. Os coalas adoram eucaliptos, embora os eucaliptos não gostem de outras árvores à volta. O carvalho-comum, mais generoso, cresce rodeado pelos seus parentes próximos: o carvalho-negral, a azinheira e o sobreiro, espécies abundantes na Península Ibérica. O espírito da floresta manifesta-se também nas comunidades de sequóias, árvores que assistiram à aventura humana dos últimos três mil anos, tal como as oliveiras, os embondeiros e os cedros-do-líbano.

Nenhum de nós se lembra, mas houve um tempo em que as florestas cobriam cerca de metade da superfície da Terra, fervilhantes de vida. Chegámos ao século XXI com apenas um quinto desse património agora irrecuperável. A profecia de Macbeth cumpriu-se, mas ao contrário. Preso à obsessão de se tornar rei, Macbeth repudiou os avisos das três feiticeiras e duvidou de que algum dia a floresta de Birnan pudesse avançar sobre o castelo. Mas o inimigo camuflou-se com ramagens e escalou a colina, pondo fim à ambição. A diferença fundamental é que os soldados de outrora são coisa pouca se comparados com os atuais exércitos de serras e escavadoras mecânicas. É por isso que a flor-do-paraíso, originária de Madagáscar, vê as suas flores rubras extinguirem-se num confronto desigual, como se a própria ideia de paraíso já não fosse possível entre os homens.

Este livro é belo porque é importante – e é importante porque é belo. Significa um passeio imóvel por entre 57 árvores e arbustos de todo o mundo; uma caminhada que se faz admirando as ilustrações naturalistas de Emanuelle Tchoukriel, traçadas a rotring e aguarelas, detalhando texturas, cores e escalas. O texto de Virginie Aladjidi convoca o leitor para as múltiplas dimensões da árvore, um arquétipo de autonomia que não encontra paralelo no Mundo Animal: nasce, cresce e reproduz-se sem se mexer do seu lugar. Quando morre, é como se adormecesse em casa. Essa dignidade solitária que é comum a todas as árvores explica o conhecido aforismo: «as árvores morrem de pé». Isto, claro, se as deixarmos viver. Comecemos por tratá-las pelo nome próprio.  

Inventário das Árvores
Virginie Aladjidi
Emanuelle Tchoukriel (ilustr.)
Kalandraka

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