A história de O Regresso começou por um pequeno filme animado de Natalia
Chernysheva, autora russa que se estreia na Bruaá em resposta ao desafio de
passar as imagens para o papel. Não é primeira nem a segunda vez que a editora
de Miguel Gouveia convida escritores e/ou ilustradores estrangeiros a produzirem
trabalhos originais para o seu catálogo: aconteceu com Lara Hawthorne (Herberto) e Davide Cali (Arturo, A Rainha das Rãs Não Pode Molhar os Pés), por exemplo. Outras
vezes, tratou-se de recuperar textos esquecidos e marginais, para depois os
reinventar pela mão de ilustradores portugueses: casos de André da Loba (O Arenque Fumado) ou Gonçalo Viana (Esqueci-me Como se Chama).
Esta opção editorial não contradiz a presença
de autores consagrados (Shel Silverstein, Bruno Munari, Wolf Erlbruch), nem tão
pouco transformou o catálogo da Bruaá numa manta de retalhos, desde a sua promissora
estreia em 2008. É antes uma declaração de princípios – de qualidade e de
originalidade – que faz jus ao estatuto de «editora independente» e que valoriza
a obra do autor (o autor e não o seu invólucro), independentemente da sua
nacionalidade e outras baias. É por isso que uma boa parte dos livros da Bruaá
revertem para a categoria do «destinatário incerto», arriscando a comunicação
possível entre adultos e crianças no território das emoções e razões partilhadas.
O
Regresso inscreve-se coerentemente nesta linha e
explora um dos temas mais incomunicáveis: a nostalgia da infância. É um longo travelling que parte do espaço caótico
da cidade em direção ao campo e ao lugar da casa mítica, a datcha onde a avó espera a neta, ao lado de uma árvore carregada
maçãs vermelhas. Explorando a alteração de formas e perspectivas, planos picados
e contra-picados, pormenores sinestésicos de cor aplicados na depuração das
linhas a preto e branco, a autora coloca-nos diante da inequívoca felicidade do
reencontro. O Regresso conduz-nos a
casa, a essa mesma «casinfância» do poema de Herberto Helder: «Eu metia as mãos
na água: adormecia, relembrava.» É isso mesmo.
O
Regresso
Natalia Chernysheva
Bruaá
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