«A sós com um livro, uma criança cria as suas
próprias imagens, nos espaços secretos da sua alma. Essas imagens estão acima
de tudo. São necessárias às pessoas. No dia em que a imaginação das crianças já
não for capaz de criá-las, a humanidade ficará empobrecida.» Astrid Lindgren
(1907-2002) proferiu estas palavras ao receber o prestigiado Prémio Hans
Christian Andersen, em 1958, mas a sua criação mais famosa, Pippi das Meias
Altas, seria bem capaz de faltar à cerimónia ou de interromper o discurso com uma
das suas delirantes partidas. Pippi tem nove anos, é órfã e vive com dois
animais de estimação, um macaco e um cavalo. Recusa-se a ir à escola, ganhou
experiência de vida como «embarcada» e define-se como «encontradora de coisas».
Alexandre Pastor, que traduziu diretamente do sueco, lembra, no texto
introdutório da edição da Relógio d’Água: «Quando Pippi das Meias Altas foi publicado em 1945, conheceu um êxito
imediato, apesar do alvoroço que criou entre os pais e os professores que viam
em Pippi um perigo para a educação tradicional.» Visto que o modelo educativo não
se alterou substancialmente desde então, não é de admirar que a leitura destes
capítulos continue a provocar alguns arrepios. Entre as personagens femininas
subversivas da literatura infanto-juvenil, de Alice às princesas mal
comportadas dos álbuns de Babette Cole, é difícil encontrar quem manifeste
tanta indiferença pelas instituições sociais, a par um sentido elementar de
justiça e de liberdade individual. Uma espécie de anarquista, portanto.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário