segunda-feira, 15 de junho de 2009

PÉROLAS, 1: MAIAKOVKSI PARA CRIANÇAS


A Livraria Sá da Costa, ao Chiado, descobriu uma série de caixotes empoeirados cheios de relíquias. Dizem que há mais no armazém de onde estes vieram, por isso é andar atento. Desde o muito bom ao muito mau – o que depende sempre de uma escala subjectiva de valores –, encontra-se lá de tudo. Por exemplo, este Maiakovski Para Crianças 1 – O que é bom e o que é mau, numa tradução directa do russo datada de 1983 e publicada pela defunta editora Polemos. Vejam o que aqueles adultos ainda imbuídos do espírito pós-revolucionário de Abril davam então a ler às ‘criancinhas’ indefesas. Felizmente, nessa altura já tinha 14 anos e andava mais interessada nas temáticas da droga e do rock’n’roll. Refiro-me, é claro, ao clássico Os Filhos da Droga, os diários de Christiane F., que li viciadamente umas 12 ou 13 vezes. Juro. Sempre era mais estimulante do que isto:

“O menino pequenino ao pé do papá chegou e perguntou:
‘O que é bom e o que é mau?’

Para mim não há segredos.
Oiçam, meninos: a resposta do papá neste livro está.

Se o vento os telhados leva sem aviso.
Se cai com força o granizo: já se sabe que é mau para quem anda na rua.

A chuva caiu e passou.
O Sol a terra iluminou.
Isto é muito bom para grandes e pequenos.

Se o menino se enfarruscou e a cara toda sujou,
claro que é mau para a pele do marau.

Se o menino gosta de sabonete e de pasta de dentes,
é porque é asseado e bem comportado.

Se bate com maldade num menino mais pequenino,
não o deixo sequer neste livro aparecer.

Vejam como este grita: ‘Não batas naqueles que são mais pequenos!’
Este menino é tão bom, nada somenos!

Se tu o livro rasgaste todo e a bola estragaste,
toda a gente se põe a pau: ‘Que menino tão mau!’
Se um menino gosta de estudar e o livro segue com o dedo,
eu escrevo sem hesitar: é um bom rapaz.

Este até dos pombos tem medo, o medricas.
Este menino é um maricas.
O que é muito mau.


Este, embora só de palmo e meio, de nada tem receio.
Bom rapaz, valente, à vida fará frente.

Este na lama chafurda galhofeiro de camisão carvoeiro.
Por isso dizem ao culpado: és mau, desmazelado.

Este engraxa as botas e escova bem as fatiotas: apesar de pequenino é um bom rapazinho.

Todos os meninos se devem disto lembrar.
Saibam as crianças recordar: em porcos se tornam os meninos,
se os meninos são porquinhos.
Correu o menino alegremente e disse como um valente: ‘Vou bem proceder e mau não ser.’"

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