quarta-feira, 30 de setembro de 2009

FLOATING DREAMS


Uma semana é pouco para ver "Floating Dreams", a exposição de Filipe Pinto Soares inaugurada a 23 de Setembro no último armazém do lado esquerdo da Lx Factory, o NCS. Passei por lá no domingo mas estava fechada. José Pinho, da Ler Devagar, contou-me que em duas horas tinha sido tudo vendido. Parece que muita gente gostou destes mundos liliputianos entre a escultura e a instalação, alguns deles construídos em forma de mobiles. Julgo que a exposição termina hoje (ou foi ontem?), embora continue acessível on-line. As peças são iluminadas e movidas a energia solar, mas isso é claro que não se pode ver aqui.

AZUL AGUSTINA


Vou passar 2010 com Agustina Bessa-Luís. Ninguém poderá dizer que não cuido das companhias.

OS CORDÉIS, 2

Apraz-me saber que Adília Lopes também notou o desaparecimento progressivo dos cordéis nas casas portuguesas. Ler aqui.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

CONTADORES, LAREIRAS E SABORES


A terceira edição do “Estória, História - Encontro de Contadores, Lareiras e Sabores” vai decorrer de 3 a 5 de Outubro no Retiro da Fraguinha, Candal e Manhouce, aldeias cravados no Maciço da Gralheira. A contar às lareiras, estarão, este ano, António Fontinha, Cristina Taquelim, José Craveiro, Luís Carmelo, Helena Gravato e os Contabandistas. “Teremos ainda oportunidade para aprender saberes de outrora e participar em actividades que cruzam o universo mágico dos contos com a descoberta sensorial de percursos naturais”, dizem os organizadores. Ver o programa completo aqui.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

OUTRAS SEQUELAS: PETER PAN


A propósito da sequela de Winnie-the-Pooh, já falada aqui e aqui, lembramos outro “clássico adaptado à continuidade”, não há muito tempo: Peter Pan e o Feitiço Vermelho, título dado pela Presença a Peter Pan in Scarlet, de Geraldine McCaughrean, editado no final de 2006. O texto publicado na Notícias Magazine – com declarações dadas por e-mail pela escritora inglesa – está na página do Scribd, disponível para leitura ou download. Aqui fica uma parte. Aviso que contém efeito plot spoiler:

O feitiço, o feiticeiro e o fio solto

Estamos em 1926, a década do charleston e do champagne. Os Rapazes Perdidos têm agora profissões respeitáveis e fazem parte do Clube dos Cavalheiros, embora por vezes sonhem com piratas e peles-vermelhas. Wendy Darling podia ter sido uma das corajosas sufragistas inglesas, mas J.M. Barrie guardou-a em casa e ainda lhe deu o trabalho das limpezas da Primavera na Terra do Nunca. No entanto, anos depois, é ela quem pressente que algo de errado se passa e que é altura de todos se juntarem para um regresso urgente. Todos, salvo Michael, morto nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial (tal como, na vida real, George Llewelyn Davies, um dos cinco irmãos «adoptados» pelo escritor).

Mas como voltar à Terra do Nunca, quando se deixou de ser uma criança alegre, inocente e descuidada – o segredo de voar segundo Mr. Barrie? A autora de Peter Pan e o Feitiço Vermelho tem outros truques. Encontrar pó-de-fada não chega, é preciso vestir uns números abaixo. «Toda a gente sabe que, quando vestimos roupas de disfarce, nos tornamos outra pessoa. De onde se conclui que, se vestirmos roupas dos nossos filhos, ficamos outra vez da idade deles.» É assim que John, Wendy, Tootles, Slightly, Curly e os Gémeos regridem no tempo, deixando para trás o mundo dos adultos. Só Nibs não conseguiu despedir-se dos filhos e desistiu da viagem.

Geraldine McCaughrean faz desta ideia – trocar de roupa equivale a uma troca de identidade – um tema estruturante da narrativa e repeti-lo-á até ao fim. Não só o fato verde de Peter Pan foi substituído por uma túnica de penas e folhas de tons vermelho-escarlate, como toda a Terra do Nunca se «vestiu» de cores outonais, rubras e assustadoras (de onde o título original, Peter Pan in Scarlet). As descrições de um território devastado, submerso em névoas e águas pestilentas, cheias de carcaças (ou espinhas?) das antigas sereias, são pouco menos do que brilhantes e abrem o apetite para a já anunciada adaptação ao cinema. Outra criação interessante de McCaughrean é o mestre de cerimónias do circo Ravello, «um miasma lanudo de pontas soltas», personagem encantadora, melíflua, mas que esconde – literalmente – algo na manga.

Peter Pan e o Feitiço Vermelho é a história de uma aventura à maneira dos últimos exploradores da Terra, homens como Scott, Amundsen ou Hillary (Scott era, aliás, amigo de J.M. Barrie, e Geraldine McCaughrean retoma o tema da exploração do Pólo Sul num dos seus últimos livros, The White Darkness). Com o mapa do tesouro encontrado no navio-fantasma do Gancho, liderados por Peter, os heróis lançam-se numa demanda que os conduz a mil e um acontecimentos e reviravoltas. Ravello juntar-se-á ao grupo. Todos ficam sem fôlego, incluindo o leitor. Pode ser um pouco cansativo, às vezes.

Do navio vem também a sobrecasaca de brocado vermelho do malogrado capitão. Peter Pan, que continua egocêntrico, vaidoso, caprichoso e insolente (certas coisas nunca mudam…), irá usá-la durante todo o percurso, até descobrir que sucumbiu a um feitiço terrível idealizado por Ravello… Que não é outro se não Gancho, depois de ter passado anos em digestão ácida na barriga do crocodilo. É um twist bem achado, mas fica por explicar como é que o veneno que matou o crocodilo e alastrou pela Terra do Nunca não matou o próprio Gancho. A fantasia não dispensa a sua lógica e esta é uma ponta solta no novelo de uma história bem urdida.

O confronto entre os dois arqui-inimigos e a derrota de Ravello/Gancho, que adormece agarrado à sua Taça do Colégio de Eton, com a ajuda de um beijo de boas-noites de Wendy, é um final quase apoteótico, e quase tudo o que vem a seguir é dispensável. Mas Geraldine McCaughrean quis ser mais generosa com os adultos do que J.M. Barrie alguma vez o foi. O regresso a casa faz-se em tom de reconciliação entre as mães e os seus meninos perdidos. «Ainda a entrarem para os seus carrinhos de bebé afeitos ao mar, no Recife do Pesar, já as mães tinham começado a polir maneiras e a escovar as roupas.» Rapazes, a brincadeira acabou…

domingo, 27 de setembro de 2009

PALAVRAS IMENSAS, QUE ESPERAM POR NÓS


Álamo
Aloés
Âmbar
Argonauta
Assombro
Assombrado
Avalanche
Bolota
Bruma
Caleidoscópio
Caruma
Cedro-do-líbano
Desolado
Encavalitado
Escarlate
Estroina
Fleuma
Freamunde
Gabriel
Gata
Hipopótamo
Imaginário
Itapuã
Jacarandá
Jaguar
Livor
Luar
Magnólia
Mágoa
Musgo
Nefelibata
Nuvem
Ossos
Ovo
Pindérico
Plúmbeo
Psicopompo
Quântico
Rododendro
Sacripanta
Salamaleque
Sândalo
Sublime
Tartaruga
Ululante
Veludo
Violeta
Xilofone
Ziguezaguear

(Uma colecção das minhas palavras preferidas. O título do post foi roubado a um poema de Mário Cesariny, “You Are Welcome to Elsinore”. As nuvens passaram na viagem de avião entre Auckland e Kuala Lumpur.)

sábado, 26 de setembro de 2009

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

ATÉ JÁ


E com o sentimento do dever cumprido, vou sair e prometo voltar tarde.

SEMANA DOS LIVROS CENSURADOS


O blogue da Bruaá, sempre bem informado, avisa que começa amanhã a Semana dos Livros Censurados, uma iniciativa que contraria o silenciamento moralista imposto nas últimas três décadas a mais de mil obras literárias. Onde? Nos Estados Unidos da América. Foi lá que o primeiro livro de J. K. Rowling (Harry Potter e a Pedra Filosofal, na tradução portuguesa) se tornou o título mais “desafiado” em escolas e bibliotecas, entre 1999 e 2002, ocupando o top da censura. Não se iludam com o termo desportivista. Segundo a American Library Association, quando um livro é “desafiado” (“challenged”) isso quer dizer que um qualquer Zé da Esquina se queixou por escrito à escola ou à biblioteca locais, com o argumento de que “contém linguagem imprópria”, “fala do comunismo num tom favorável”, tem ilustrações “demasiado vulgares ou eróticas” e coisas do género. Está tudo bem se o Zé da Esquina não gosta de determinado livro – é um direito que lhe assiste –, mas algo vai mal quando consegue impor aos outros a estreiteza da sua visão do mundo. Em Julho de 2002, uma estudante e os pais processaram o conselho directivo de uma escola em Cedarville, estado do Arkansas, depois de ouvirem o sermão anti-Harry Potter ditado por uma dessas milhentas igrejas que proliferam à custa da ignorância e da vulnerabilidade das pessoas. Largas dezenas de casos semelhantes são registados todos os anos, com a acusação do costume: as histórias de Harry Potter promovem a bruxaria, o ocultismo, o satanismo e até o uso de drogas. Que dizer de tudo isto? Uma tristeza. Às vezes sinto que vivo num país altamente civilizado, onde não é qualquer Zé da Esquina que vem dizer-me o que devo ou não devo ler. Thank you, God.

(Harry Potter e a Pedra Filosofal é um dos 120 livros mundialmente censurados por razões políticas, sociais, religiosas ou sexuais. Conferir em 120 Banned Books, de Nicholas J. Karolides, Margaret Bald e Dawn B. Sova, ed. Chekmark Books, 2005)

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

UM OUTONO AINDA VERÃO


(…)

"O Outono
é o tempo
em que o sol parece morno."

(…)

E é mesmo. Pelo menos nestes dias.

(O Outono é o Tempo a Envelhecer, texto de Maria Isabel César Anjo e ilustrações de Maria Keil, ed. Sá da Costa, 1981)

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

A TED A DAY KEEPS THE DOCTOR AWAY


Entre os hábitos saudáveis que gostava de aplicar na minha vida, além de prescindir do Nescafé em jejum pela manhã e andar a pé uma hora por dia, estão as palestras do TED. Trata-se de uma organização não lucrativa que reúne centenas de palestras de investigadores de várias áreas do pensamento, da tecnologia à criatividade, das neurociências às artes performativas, da linguística ao desenvolvimento pessoal. TED significa “technology, entertainment, design” – e o lema do projecto, iniciado em 1984, é “ideas worth spreading”. Especialistas mundiais são convidados a expor as suas ideias em público, em comunicações que se pretendem cativantes, consistentes, breves e com humor. Naturalmente, nem todas atingem os píncaros, mas raras são uma perda de tempo. Cada palestra demora em média 20 minutos e há outras de apenas três minutos; todas em inglês, mas muitas traduzidas para várias línguas, inclusive em português. Um grupo significativo de voluntários do Brasil (e também de Portugal) encarrega-se de levar a cabo esta tarefa.

Querem exemplos? Oliver Sacks fala de um certo tipo de alucinações visuais em pessoas cegas. As escritoras Elisabeth Gilbert (Eat, Pray, Love) e Amy Tan (The Joy Lucky Club) explicam o seu conceito de criatividade. A cientista Rebecca Saxe aponta a região do cérebro que lê as mentes dos outros. Ken Robinson questiona o sistema de aprendizagem escolar. Talks Rives conta uma pequena história só com emoticons projectados no ecrã. Marvin Minsky fala sobre saúde e a mente humana. E por aí fora. Numa altura em que meio mundo anda entretido a “esmiuçar” a vacuidade da campanha eleitoral, confesso que prefiro esmiuçar ideias a sério. “Ideas worth spreading”. http://www.ted.com

terça-feira, 22 de setembro de 2009

THE BIRTHDAY PARTY



É um dia importante para algumas pessoas. O senhor Nicholas Edward Cave faz hoje 52 anos. Envelhecer em boa companhia é um dos benefícios da fidelidade. Mas para dar valor a isso é preciso ficar velho. Isto parece um anúncio a uma seguradora. Está certo.

O BENEDITO E O BURGESSO


Faltam duas semanas para o lançamento da sequela das histórias de Winnie-the-Pooh e companhia no Bosque dos 100 Acres, de que já tínhamos falado aqui, citando Manuel António Pina. Mais de 80 anos depois da publicação da obra original de A[lan] A[lexander] Milne, Winnie-the-Pooh (1926) e The House at Pooh Corner (1928), a editora australiana Hardie Grant Egmont e os gestores do legado patrimonial de A. A. Milne e E. H. Sheperd (ilustração acima) acordaram na atribuição de uma nova paternidade autoral ao urso que entre nós também é conhecido por Joanica Puff. Prometem uma história escrita “como se tivesse saído da caneta do próprio A. A. Milne”, que será traduzida em cerca de 50 línguas. A sequela intitula-se Return to the Hundred Acre Wood e é assinada por David Benedictus, autor que aparentemente não sofre da angústia da influência. As ilustrações – ou “decorações”, como vem na capa – pertencem a Mark Burgess. Benedictus & Burgess, que dupla… Sim, estamos a ser preconceituosos. Preferíamos que tivessem deixado os bichos em paz.

“Pooh and Piglet, Christopher Robin and Eeyore were last seen in the Forest – oh, can it really be eighty years ago? But dreams have a logic of their own and it is as if the eight years have passed in a day.” Ler o resto da apresentação de David Benedictus aqui.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

UM NOVO HERBÁRIO


De vez em quando ainda se encontrava em feiras do livro, aqui e ali, mas agora é certo: Herbário, um dos títulos mais bonitos da colecção Assirinha, com texto de Jorge Sousa Braga e ilustrações de Cristina Valadas, já está de novo disponível no catálogo da Assírio & Alvim. Um poema:

A alfazema

― Fecha os olhos bem fechados,
e diz-me a que é que cheira.
Cheira a rosa, cheira a nardo,
ou a flor de laranjeira?

― Nem a rosa, nem a nardo,
nem a cravos, nem a cravinas
me cheira este poema.
O que me chega às narinas
é o cheiro a alfazema!

AFAGAR LIVROS, FOLHEAR GATOS


A Maria João Freitas sabe muito bem como trocar as voltas às perguntas difíceis:
“Tenho uma enorme biblioteca fragmentada por divisões para afagar (sobretudo desde que descobri como certos livros ronronam quando a minha mão lhes acaricia a lombada). Não é mentira. Tenho um número respeitável de gatos, que parecem saídos de livros e se passeiam esquivos pelos cantos da casa, para folhear.”

“Gatos & Livros”, um texto para ler sem falta n’A Namorada de Wittgenstein. Em cima, Mr. E., o gato vadio que apareceu na casa de Edward Gorey, no dia em que uma parte dos seus objectos pessoais foram a leilão. A ilustração que acompanha o post da MJF também é de Gorey.

(… e a fotografia foi tirada pelo jardineiro honorário deste blogue, Guto Ferreira, em Yarmouth Port, Cape Cod.)

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

OUTLET BERTRAND


“Livros únicos a preços únicos”. O que quer isto dizer, exactamente, ainda não conseguimos confirmar. Todas as sextas-feiras e sábados, das 10h00 às 20h00, quem quiser investigar o Outlet Bertrand só tem de seguir as setas para a Rua da Anchieta, junto à loja do Chiado. Até 31 de Outubro, livros a partir de um euro.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O FIM DAS PROMESSAS


E porque não há duas sem três, aqui fica a capa da edição norte-americana de The Resurrection Fields, publicada no Reino Unido como The Mendini Canticle. A Gailivro fez a melhor opção gráfica. Para quando a publicação?

REWIND


A propósito do post anterior, e para quem não está familiarizado com as aventuras de Dante e Bea na distopia do Dr. Sigmundus, recupero o texto publicado na LER nº 77 (Janeiro 2009):

Gente Vazia
Brian Keaney
Tradução de Susana Rodrigues de Carvalho
Gailivro

Primeiro volume de uma trilogia já caucionada pelo «mestre» Philip Pullman, Gente Vazia (The Hollow People) é um exemplo da vitalidade do romance juvenil inglês na era pós-J.K. Rowling, com a vantagem de dispensar modismos extraliterários. Porque é de boa prosa que se trata, no cruzamento dos universos fantásticos e do gótico vitoriano, tudo enformado pela herança católica de um autor com raízes irlandesas. A educação religiosa entre freiras e padres jesuítas, à qual Brian Keaney se refere sem saudades, não andará longe deste cenário sombrio que traz dois mundos em conflito: um, a sinistra ilha de Tarnagar, local do sanatório onde um tal Dr. Sigmundus vigia e aniquila a capacidade de sonhar (pobre Freud…); outro, Moiteera, a cidade em ruínas transformada em território de guerrilha, onde sobrevive um punhado de resistentes cuja maior arma é a «força odílica», o poder de manipular realidade e ilusão. Brian Keaney recuperou um dos pares amorosos mais célebres da História para dar nome aos seus heróis: Dante e Beatrice. Inadaptados, confusos e anti-sociais, cabe-lhe iniciar a descida aos infernos governados pelo Dr. Sigmundus. The Gallow Glass e The Mendini Canticle são a continuação aguardada em português.

BEIJAR COMO MARC BOLAN


Este Verão, a Gailivro editou O Espelho Quebrado, segundo volume da trilogia “As Promessas de Dr. Sigmundus”, de Brian Keaney, de quem já se falou aqui e aqui. Literatura fantástica para adolescentes, prosa imaginativa e escorreita, do melhor que por cá se tem traduzido (e não, não é mais um “tijolo”). Por culpa de um Agosto ensombrado por doses maciças de trabalho, ainda não tive tempo de ler o livro nem os últimos posts que Brian Keaney tem publicado no seu blogue, Dreaming in Text, que figura há muito na lista do lado direito. Sempre reflectindo a visão ou a experiência do autor, os temas ligados à escrita e ao mundo editorial são ali tratados com humor e sabedoria. O último começa assim:

“Do you remember the first time you kissed someone and really meant it? If you want to write for young people I think you need to remember such things. I was sixteen with long curly hair like Marc Bolan when it happened.”

Ler o resto aqui.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

CORDÉIS


É difícil perceber quando é que as coisas deixam de fazer falta. Por exemplo, os cordéis. Desde quando deixámos de guardar cordéis? Em casa dos meus avós, em Matosinhos, havia uma gaveta onde se acumulavam cordas e fios de nylon e algodão com vários tamanhos e cores, para o que desse e viesse. Usavam-se para um conserto provisório, para atar sacos de arroz ou massa ou para fazer o jogo da cama do gato, se fossem suficientemente compridos. Guardar o cordel que atava a caixa de pastéis da Confeitaria Ferreira era tão normal como guardar os papéis de embrulho do Natal de um ano para o outro, ou as pratas dos chocolates, alisadas com a parte curva da unha até se tornarem quase cetim. Agora os cordéis quase desapareceram, substituídos por velcros, aberturas fáceis, fechos reutilizáveis e outros dispositivos. Preferimos as molas coloridas do Ikea para fechar os sacos de comida, tapamos tudo o que podemos com Glad e aquilo que já não presta, simplesmente, deitamos fora. Já não temos tempo para desatar nós apertados, em breve esqueceremos como se fazem laços. Inútil e demodé, o cordel está por um fio. Passou à literatura. De cordel.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

O ÚNICO LUGAR QUE


Não percebo o que têm os lugares a ver com a qualidade dos leitores e das leituras. Volta e meia, diz-se que o verdadeiro leitor não lê antes de adormecer (porque é displicente), não lê na casa de banho (porque é indigno), não lê na praia (porque é desconfortável) e não lê numa data de sítios e situações por uma razão ou por outra. Se isto fosse verdade, estávamos bem arranjados. Precisávamos de ser aristocratas e ricos para usufruir do nosso sofá italiano, biblioteca privada e mansão com jardim de buxo, ficando a salvo de todo o burburinho e incómodo do mundo. É claro que há lugares mais favoráveis ao sossego da leitura, mas quem gosta de ler, lê em qualquer lado, até no meio do Festival Sudoeste ou no autocarro mais bruto de Lisboa, o 750. O único lugar que conheço onde às vezes não se consegue ler, por muito que se tente ou que não se tente, é dentro da nossa cabeça. E contra isso não há nada a fazer.

Também há quem se especialize em ler no metro, sentado ou em pé, direito ou inclinado. The New York Times dedicou um slideshow e uma reportagem ao tema. A foto acima é de Ruth Fremson.

EQUÍVOCOS DA MEMÓRIA

Correcção ao post anterior: sem retirar o mérito a Carlos Araújo e à colecção dedicada a Roald Dahl pela Terramar, impõe-se dizer que o Círculo de Leitores publicou, pela mão da editora Guilhermina Gomes, a primeira edição portuguesa de Charlie e a Fábrica de Chocolate em 1985, assim como dois volumes da série (adaptada para TV) Contos do Imprevisto. Recebi há pouco um email do meu editor na Caminho, José Oliveira, a alertar-me para este esquecimento – espero que perdoável. A própria Caminho também editou três títulos de Roald Dahl no início dos anos 1990. O reparo fica feito. Aprende-se mais com as críticas justas do que com a presunção autocondescendente dos supostos iluminados.

domingo, 13 de setembro de 2009

HOJE É DIA DE ROALD DAHL


Roald Dahl, escritor nascido no País de Gales, filho de pais noruegueses, faria hoje 93 anos. Criador de Matilde, Charlie e a Fábrica de Chocolate, As Bruxas e Histórias em Verso para Meninos Perversos, entre dezenas de histórias e poemas, o seu humor desenfreado e satírico continua a seduzir leitores de todas as idades – e a irritar quem o acha demasiado insolente e prefere censurar-lhe os livros. Azar o deles. Quase vinte anos após a sua morte, Dahl “is selling even more books than during his lifetime”, sublinha um artigo publicado ontem no Times online: «He was selling millions and he continues to sell even more millions», diz uma amiga da família e actual gestora do legado literário. “He’s one of the world’s bestselling storytellers and that’s extraordinary for somebody who has been dead for 20 years. When I started I would never have used the word ‘brand’. But I can’t now ignore it. He makes a brilliant brand.»” Chamar a Roald Dahl uma “marca” parece-me bastante bacoco, mas enfim. Mais importante é lembrar que Roald Dahl foi cá publicado primeiro na Teorema e depois na Terramar, graças a um editor que muito contribuiu para elevar a qualidade da literatura para crianças em Portugal, Carlos Araújo.

ARRUMAR AS IDEIAS


Alma dos sapatos: para onde vão os estados de espírito mais rasteiros.
Céu da boca: lugar onde se alinham as estrelas-cadentes.
Piso radiante: tipo de soalho que fica contente por ser pisado.
Fiel da balança: namorado ultradedicado a nativas do signo Balança.
Cama de corpo e meio: cama de média dimensão onde só há lugar para uma pessoa e a sua virtude.

(em arrumação)

sábado, 12 de setembro de 2009

ANIMA VEGETALIS


Acabado de inaugurar: "Anima Vegetalis - Imaginário Botânico do Mosteiro de Tibães", fotografias de Paulo Gaspar Pereira. "Espíritos Elementares", outra exposição do mesmo autor, continua no Museu Municipal Abade Pedrosa, em Santo Tirso, até 4 de Outubro. Há alturas em que apetece estar mais perto do Norte.

1988 – 2008



Homenagem do Jardim Assombrado ao grande senhor que hoje faz capa do Expresso, a propósito do romance The Death of Bunny Munro. Concerto de estreia em Portugal, a 16 de Dezembro de 1988, no Pavilhão Carlos Lopes, com Mão Morta na primeira parte; e a última passagem de Nick Cave & The Bad Seeds no Coliseu dos Recreios de Lisboa, a 3 de Março de 2008 (na minha opinião, o pior de todos). Com vinte anos de diferença, nota-se um decréscimo na qualidade e criatividade dos bilhetes. Em compensação, as condições no verso passaram a incluir a proibição de fumar na sala.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

JORGE SAMPAIO EXPLICA ÀS CRIANÇAS


Acabado de chegar pelo correio: O Meu Livro de Política, por Jorge Sampaio. O antigo Presidente da República fez-se acompanhar pelas ilustrações de Tiago Albuquerque no que descreve como “um pequeno ‘conto falado’ sobre a política, declinado no modo autobiográfico, num estilo coloquial, destinado a jovens dos 8 aos 14 anos”. É o primeiro de uma nova colecção da Texto Editores, justamente designada "O Meu Livro".

DIAS ILUSTRADOS


A partir de amanhã, na livraria Papa-Livros (Edifício Cristal Park, Rua D. Manuel II, 44, Porto), uma exposição da designer, ilustradora e blogger Anabela Dias.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

CORTEM-LHES A CABEÇA!


Quem pensa que os livros para crianças são inofensivos está muito enganado. Eis alguns dos casos de perturbações mentais já diagnosticados:

Rainha de Copas – narcisismo
Chapeleiro Louco e Lebre de Março – psicopatia partilhada (folie à deux)
Winnie-the-Pooh – défice de atenção e hiperactividade
Piglet – ansiedade crónica
Willy Wonka – desordem esquizotípica
Peter Pan – narcisismo, autofrustração e dependência
Wendy – dependência
Sininho – personalidade do tipo borderline
Capitão Gancho – personalidade antisocial
Feiticeiro de Oz – narcisismo
Homem-de-Lata – desordem esquizóide
Gata Borralheira– necessidade de aprovação
Barba-Azul – psicopatia
Peter Rabbit – hiperactividade
Bela – dependência
Monstro – agressividade
Cruella de Vil – personalidade histriónica
Lobo Mau – psicopatia
Pipi das Meias Altas – desordem de personalidade não especificada

(Tigger on the Couch – The neuroses, psychoses, disorders and maladies of our favorite childhood characters, Laura James, ed. Collins)

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

terça-feira, 8 de setembro de 2009

WORKSHOP DE CRIAÇÃO LIVREIRA


Um workshop de um dia no Centro Cultural de Belém para aprender a fazer livros (clique na imagem para ler o texto). Hoje de manhã ainda havia vagas para domingo, 29 de Novembro. É marcar já pelo telefone 213 612 899.

TAL COMO NA VIDA REAL


“Pela primeira vez desde que o Monopoly foi inventado em 1935, as regras do jogo nesta nova versão foram alteradas: já não é preciso o jogador ter um bairro para poder construir imóveis, basta ter uma propriedade para construir logo na primeira jogada. E assim tal como na vida real, os valores das propriedades e as suas rendas - vão subindo ou descendo conforme a mudança da paisagem da cidade. Os jogadores podem construir estruturas que aumentem os seus valores imobiliários, tais como escolas, parques de energia eólica, ou podem sabotar os adversários construindo instalações para esgotos ou prisões.”

(Excerto retirado do press-release de apresentação do Monopoly City, recomendado a partir dos 8 anos. Admirável mundo novo.)

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

LA TRAMIATTA

O blogue da Livraria Trama (de Catarina Barros e Ricardo Ribeiro) já devia estar na lista dos blogues ao sol há muito tempo, mas ninguém é perfeito.

SALÃO DE CURIOSIDADES


O livro do mês vai ser O Animalário Universal do Professor Revillod, um bestiário fantástico de Miguel Murugarrén (texto) e Javier Saéz Castán (ilustrações), pronto para ser publicado em português na colecção Orfeu Mini. No Cadeirão Voltaire há mais pormenores e imagens do interior.

domingo, 6 de setembro de 2009

A FRASE IDEAL

O Ainda Falta Muito? teve direito aos seus 15 segundos de fama na montra de livros do programa “Livraria Ideal”, da TVI24. Vi hoje de manhã a repetição e ouvi a punch line: “Carla Maia de Almeida goza com o tema recorrente [da pergunta dos miúdos] e Alex Gozblau ilustra-o com amor.” Também podia ser: “Alex Gozblau goza com o tema recorrente e Carla Maia de Almeida escreve-o com amor.” Ou: “Carla Maia de Almeida goza com amor e Alex Gozblau ilustra o tema recorrente.” Ou ainda: “Alex Gozblau ilustra com gozo e Carla Maia de Almeida ama o tema recorrente.” Desculpem. Sou uma gozona.

DISRESPECTACLES


Por seu lado, o Não Quero Usar Óculos foi avistado lá para as bandas de Nova Iorque. Cortesia do Alex.

ARE WE THERE YET?

Um leitor anónimo deixou um link para o You Tube na caixa de comentários do post anterior. Não gosto do produto publicitado, mas o video é muito bom. Como seria o Ainda Falta Muito? em versão de fenómeno paranormal? Vejam aqui.

sábado, 5 de setembro de 2009

HOJE NO PÚBLICO


Um texto de Rita Pimenta (clicar na imagem para aumentar) que também pode ser lido aqui.

VAMPIROS, 2


Esta raça de vampiros a que me refiro é mais perigosa, porque mais dissimulada. Tive, há dois dias, o desprazer de ser roubada no Metro de Lisboa, a horas muito decentes e com carruagens a meio-gás. Uma mochila distraída às costas, a juntar à tendência de cismar com a morte da bezerra, tornaram-me um alvo fácil para carteiristas habilitados na arte de furtar. Cerca de 40 euros foi quanto lhe rendeu a proeza. De imediato, apresentei queixa na 18ª esquadra do Campo Grande. De imediato, ali mesmo telefonei para dois bancos a pedir o cancelamento de dois cartões de débito e dois cartões de crédito. Não sabia era que, num deles, teria de pagar 40 euros para que a funcionária de serviço premisse meia dúzia de teclas só para executar as anulações. Um serviço limpo e rápido, como o dos carteiristas. Argumentei que tinha sido roubada, que tinha uma declaração da polícia para o comprovar, e que é sempre chato ser assaltada duas vezes no mesmo dia. “É o preçário”, responderam-me. De que banco falo? Millenium BPC. Não que isso faça mossa ao Sr. Jardim Gonçalves, mas a verdade é que já andava com ganas de tirar de lá o meu dinheiro. É desta.

(em cima, uma serigrafia sobre papel-moeda da série “Lucha por la vida”, do artista argentino Ral Veroni)

VAMPIROS, 1


Apesar da capa americanizada, de acordo com o hype dos vampiros sonsos da escola Stephenie Meyer, esta novidade da Porto Editora promete sangue fresco. Trata-se de uma reunião de contos inéditos de autores contemporâneos, convidados por Pedro Sena-Lino a escrever sobre o tema. Se é fácil imaginar Hélia Correia ou João Tordo neste elemento, há nomes que suscitam diferente expectativa e curiosidade. Caso de José Eduardo Agualusa, Miguel Esteves Cardoso, Rui Zink, Gonçalo M. Tavares, Ana Paula Tavares, Jorge Reis-Sá e Susana Cabaço. A 29 de Outubro, data em que Contos de Vampiros chega às livrarias, faz-se luz sobre o assunto.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

MAIS PRODUÇÕES DA OFICINA DOS SONHOS




Entre as novidades apresentadas ontem em conferência de imprensa pela Porto Editora, já noticiadas aqui e aqui, destacam-se dois novos volumes de uma das melhores colecções portuguesas de literatura para crianças, a Oficina dos Sonhos. Contos e Lendas de Portugal e do Mundo, colectânea de histórias tradicionais do país e de outras regiões, desde a Europa Central ao mundo árabe, traz a selecção de João Pedro Mésseder e Isabel Ramalhete. Mais ajustado à temporada comercial que se avizinha, um novo livro de contos de Manuel António Pina, O Cavalinho de Pau do Menino Jesus e Outros Contos de Natal. Fora da colecção, chega ainda outra colectânea de contos assinados por autores e ilustradores portugueses convidados por Pedro Sena-Lino: Princesas, Príncipes, Fadas e Piratas com Problemas. Todos os títulos estarão nos escaparates em Outubro.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

IN BOCCA AL LUPO

Enquanto andava às voltas com o Dictionnaire des Symboles e o conceito de anima em Carl Jung, tudo a propósito da mais espantosa versão do Capuchinho Vermelho que já li, o Senhor Palomar mudou de morada. Agora está aqui. A casa é bonita, sim senhor, e parece que até é mais fácil deixar comentários (bem que tentei, na morada antiga, mas nicles). Talvez alguém o aviste mais logo no Hotel Tivoli, na apresentação das novidades da Porto Editora. Se houver um eterno distraído na assistência, só pode ser ele, o da flor na lapela. In bocca al lupo, é o que se diz em italiano para desejar boa sorte. In bocca al lupo, Senhor Palomar.

STRANGEWAYS, HERE HE GOES AGAIN

Pedro Mexia de volta à blogosfera com o Lei Seca. E uma versão única dos Smiths pelos não menos únicos The Filthy Amigoz. Last Night I Dreamt that Somebody Loved Me. “Pobre da canção que não sobreviva a bigodes falsos, poncho e sombrero.” E àquele solo de guitarra, já agora.

O BICHO MORDEU-NOS


Nos últimos dias andei tão fora deste mundo que me escapou a crítica atenta da Andreia Brites ao Ainda Falta Muito?, n'O Bicho dos Livros. Onde se explica, e muito bem, o lugar que a ilustração tem neste livro:

“O que ficamos a saber destas personagens, muito chega-nos através da ilustração de Alex Gozblau. Justo será até dizer que sem ela este álbum perderia grande parte do seu sentido. Cada expressão ou movimento da menina transpira felicidade, seja quando fecha os olhos por trás dos enormes óculos redondos que a tornam ainda mais curiosa, seja quando os abre, assim como a boca e as mãos em plena explicação, seja quando voa, enorme, por cima do carro e das flores com o mesmo tamanho, quase alcançando as nuvens. O cabelo ao vento, os olhos de espanto e temor, ou dúvida, a atenção, a pose...
Corpos e objectos são trabalhados através de uma teia cromática, de luz e sombra, proporções e texturas, onde podem constar desenhos figurativos a carvão, fotografias ou colagens, que colocam as figuras humanas em contextos profusos em estímulos, sem nunca as minimizarem. Pelo contrário, a dimensão de cada espaço aplica-se à perspectiva da personagem, nunca o contrário, porque este é o seu mundo e não o mundo em que vivem, o que é bem diferente.”

Ler o texto completo aqui.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

A MINHA RENTRÉE


O primeiro curso de Pós-Graduação em Livro Infantil na Universidade Católica chegou ao fim. Quase um ano de trabalho extra sem leituras recreativas (Bolaño? Stieg Larsson? Não me façam rir), muita comida pré-cozinhada, escassas idas ao cinema, namoro parcimonioso, férias inexistentes, saídas à noite controladas, almoços adiados, jantares recusados e aniversários esquecidos. Um ano muito chato, está bem de ver. “All work and no play makes Jack a dull boy”, e apetece-me sacar do machado enquanto escrevo isto.

Mas agora acabou. Estou pronta para a rentrée, com o espírito da passagem de ano. Se o Lou Reed diz que há Natal em Fevereiro, eu digo que 2009 começa em Setembro. Está na hora de abrir a garrafa de champanhe – ou um sauvignon blanc da Nova Zelândia – e comemorar o fim desta long and winding road. A vida está prestes a recomeçar. Vou oferecer-me cinco sessões de float-in e reaprender as técnicas de respiração ayurvédicas. Vou ao cabeleireiro e à manicure. Vou ler compulsivamente sete romances de seguida. Vou entrar numa sessão de cinema das 11h30 e correr as salas todas até ser expulsa pelos seguranças, já para lá de Bagdad. Vou ficar a ver em loop todas as séries da Fox. Vou correr as persianas, pôr um CD com ruídos de chuva, fazer um Darjeeling Tea voltar a Reviver o Passado em Brideshead. Depois? Depois vou limpar a mesa de trabalho, reorganizar o escritório, arrumar o sótão, marcar consulta no dentista, dar desparasitante aos gatos, ler os últimos 300 comentários no Facebook, escrever todos os dias no Jardim Assombrado, propor ideias para artigos, regressar às crónicas no Blogtailors, trabalhar num novo conto e dedicar-me àquele projecto de escrita que me vai ocupar até Maio de 2010. Que grande canseira que isto vai ser.

(Ilustração de Quint Buchholz.)

DEPOIS DO REGRESSO ÀS AULAS


Acabou. Isto acabou. Estou a precisar de mudar de lentes e de uns analgésicos para as dores de cabeça.