Tal como aconteceu em 2008 e 2009, O Jardim Assombrado dá as boas-vindas ao ano novo com doze horas de avanço, de olhos postos na terra bem-amada a que pertence por nacionalidade de alma ou lá o que lhe queiram chamar. Kia ora, 2011 - que é como quem diz, traduzido do maori, "olá, 2011"!
sexta-feira, 31 de dezembro de 2010
quinta-feira, 30 de dezembro de 2010
PRÉMIOS LIMÃO 2010
Algumas coisas incompreensíveis, delirantes, inanes ou de gosto duvidoso que foram dadas à estampa em 2010, com o pretexto de serem “para crianças”:
Prémio “a Ferreirinha dos pequeninos”
– Pode trazer mais uma garrafa disto?
– Vinho do Porto?
– Exactamente. Aqui o meu colega hipopótamo tornou-se apreciador.
– Revela bom gosto – retorqui delicadamente. – O Vinho do Porto é um dos grandes orgulhos de Portugal.
(Francisco Moita Flores, As Aventuras de Maresia do Mar e Outras Histórias para Aprender)
Prémio “Vais acabar nas Novas Oportunidades, ai vais, vais”
Se António admirava os grandes campeões desportivos, não admirava menos os heróis das histórias e os escritores que tinham sido capazes de as inventar.
– Ainda por cima – gabava-se o avô Francisco, à conversa com os amigos –, o miúdo também adora ler. Vamos lá a ver o que sai dali, porque ele, afinal, tem jeito para tudo.
(José Jorge Letria, A Magia do Círculo Azul)
Prémio “O camisinha amarela”
[Útero]
É resguardado e secreto
com a lição aprendida
pois é nele que começa
o mistério desta vida.
E os espermatozóides
nele encontram ambiente
para que a promessa de vida
possa enfim seguir em frente.
(José Jorge Letria, O Alfabeto do Corpo Humano)
Prémio “Puto, enriquece o teu vocabulário”
Deixem que lembre ainda
O m de merda: dá tanto jeito
Para mandar alguns mm dos tais…
E é nome escorreito:
Vem no Morais.
(José Carlos de Vasconcelos, Arco, Barco, Berço, Verso)
Prémio “E se for só à expressão já vais com muita sorte”
– Vamos agora. Isto vai ser sem espinhas – disse o Tição sem perceber porque é que os outros não acharam graça à expressão.
(Luís Represas, A Coragem de Tição)
Prémio “Assim também eu votava nas presidenciais”
Na cidade de Cata-vento viviam-se dias de grande agitação. Chegara a hora de escolher um novo Presidente que servisse com honra e inteligência toda a comunidade.
(Carmen Zita Ferreira, O Bicho-de-Sete-Cabeças – História de uma eleição democrática)
Prémio “Os malefícios do álcool e do tabagismo”
O António, que tinha tido todas as oportunidades na vida mas nenhuma cabeça para as aproveitar, acabou mal, precocemente envelhecido, com hábitos alcoólicos e sem saber fazer nada, porque nunca tinha aprendido nem querido aprender, e revoltou-se contra o mundo em vez de se revoltar contra ele próprio. Teve a sorte de ir parar a uma instituição social mesmo sem pagar a mensalidade.
(Maria de Belém Roseira, in Contos Pouco Políticos)
Prémio “Depois de ler este livro também já bebia qualquer coisa”
O Riscas não precisou de pensar muito para formular o primeiro desejo, a viagem estava a ser cansativa e precisava de beber algo para seguir a caminhada. Sim, beber era de facto o primeiro desejo.
Largar o grito seria o segundo e talvez o mais importante desejo.
(Sónia Borges, O Riscas)
Prémio “Conselhos aos meus amigos caçadores”
– Os homens são perigosos mas também são estúpidos, Ismael. Eles estão sempre a fazer barulho, estão sempre a falar uns com os outros e em voz alta, ao contrário de nós, coelhos. Depois, eles não sabem caminhar no mato silenciosamente: fazem sempre tanto ruído que, se estiveres atento, vais poder esconder-te antes que eles cheguem próximo de ti.
(Miguel Sousa Tavares, Ismael e Chopin)
Prémio “Não estive em Woodstock, mas já fui ao Andanças”
Alana aproximou-se das outras ninfas e viu que elas estavam mais alegres. Cantavam com mais vigor, bailavam com mais energia, procuravam as essências mais activas, teciam grinaldas maravilhosas e túnicas delicadas e esvoaçantes…
– A Primavera é como uma festa diária nos nossos corações, explicou a rainha das ninfas. – A festa da alegria e da cor!
(Alice Cardoso, Alana e a Festa da Cor)
Prémio “a Ferreirinha dos pequeninos”
– Pode trazer mais uma garrafa disto?
– Vinho do Porto?
– Exactamente. Aqui o meu colega hipopótamo tornou-se apreciador.
– Revela bom gosto – retorqui delicadamente. – O Vinho do Porto é um dos grandes orgulhos de Portugal.
(Francisco Moita Flores, As Aventuras de Maresia do Mar e Outras Histórias para Aprender)
Prémio “Vais acabar nas Novas Oportunidades, ai vais, vais”
Se António admirava os grandes campeões desportivos, não admirava menos os heróis das histórias e os escritores que tinham sido capazes de as inventar.
– Ainda por cima – gabava-se o avô Francisco, à conversa com os amigos –, o miúdo também adora ler. Vamos lá a ver o que sai dali, porque ele, afinal, tem jeito para tudo.
(José Jorge Letria, A Magia do Círculo Azul)
Prémio “O camisinha amarela”
[Útero]
É resguardado e secreto
com a lição aprendida
pois é nele que começa
o mistério desta vida.
E os espermatozóides
nele encontram ambiente
para que a promessa de vida
possa enfim seguir em frente.
(José Jorge Letria, O Alfabeto do Corpo Humano)
Prémio “Puto, enriquece o teu vocabulário”
Deixem que lembre ainda
O m de merda: dá tanto jeito
Para mandar alguns mm dos tais…
E é nome escorreito:
Vem no Morais.
(José Carlos de Vasconcelos, Arco, Barco, Berço, Verso)
Prémio “E se for só à expressão já vais com muita sorte”
– Vamos agora. Isto vai ser sem espinhas – disse o Tição sem perceber porque é que os outros não acharam graça à expressão.
(Luís Represas, A Coragem de Tição)
Prémio “Assim também eu votava nas presidenciais”
Na cidade de Cata-vento viviam-se dias de grande agitação. Chegara a hora de escolher um novo Presidente que servisse com honra e inteligência toda a comunidade.
(Carmen Zita Ferreira, O Bicho-de-Sete-Cabeças – História de uma eleição democrática)
Prémio “Os malefícios do álcool e do tabagismo”
O António, que tinha tido todas as oportunidades na vida mas nenhuma cabeça para as aproveitar, acabou mal, precocemente envelhecido, com hábitos alcoólicos e sem saber fazer nada, porque nunca tinha aprendido nem querido aprender, e revoltou-se contra o mundo em vez de se revoltar contra ele próprio. Teve a sorte de ir parar a uma instituição social mesmo sem pagar a mensalidade.
(Maria de Belém Roseira, in Contos Pouco Políticos)
Prémio “Depois de ler este livro também já bebia qualquer coisa”
O Riscas não precisou de pensar muito para formular o primeiro desejo, a viagem estava a ser cansativa e precisava de beber algo para seguir a caminhada. Sim, beber era de facto o primeiro desejo.
Largar o grito seria o segundo e talvez o mais importante desejo.
(Sónia Borges, O Riscas)
Prémio “Conselhos aos meus amigos caçadores”
– Os homens são perigosos mas também são estúpidos, Ismael. Eles estão sempre a fazer barulho, estão sempre a falar uns com os outros e em voz alta, ao contrário de nós, coelhos. Depois, eles não sabem caminhar no mato silenciosamente: fazem sempre tanto ruído que, se estiveres atento, vais poder esconder-te antes que eles cheguem próximo de ti.
(Miguel Sousa Tavares, Ismael e Chopin)
Prémio “Não estive em Woodstock, mas já fui ao Andanças”
Alana aproximou-se das outras ninfas e viu que elas estavam mais alegres. Cantavam com mais vigor, bailavam com mais energia, procuravam as essências mais activas, teciam grinaldas maravilhosas e túnicas delicadas e esvoaçantes…
– A Primavera é como uma festa diária nos nossos corações, explicou a rainha das ninfas. – A festa da alegria e da cor!
(Alice Cardoso, Alana e a Festa da Cor)
Prémio "O problema é que os fios de lã se metem nos dentes"
A menina Adélia era amiga da sua avó e recepcionista do museu. Por ano produzia quilómetros e quilómetros de cachecóis de lã para ajudar meninos carenciados.
(Mariana Roquette Teixeira, O Pintor Desconhecido)
Prémio "Sir Richard Attenbourough de sacristia"
Mas a verdade é que há cobras más, cobras boas e cobras mais ou menos boas e mais ou menos más. O mesmo acontece com os outros animais e também com as pessoas. E por isso devemos sempre olhar e ouvir com atenção, antes de dizermos se uma cobra, animal ou pessoa são maus ou são bons.
(Francisco Alegre Duarte, Joana Serpentina)
terça-feira, 28 de dezembro de 2010
OS MEUS LIVROS FAVORITOS DE 2010
Encaro sempre com alguma reserva as tradicionais listas “dos melhores livros” do ano findo. São escolhas forçosamente incompletas, determinadas por critérios exteriores (o espaço de página, por exemplo) e outros imanentes à percepção que um crítico tem do seu trabalho. Para quem lê dezenas de livros ao longo do ano, escolher dez pode ser pouco; não é uma eleição fácil, com certeza. Habitualmente, essa escolha reflecte a síntese entre a valorização crítica da obra e o seu lugar no cânone literário; daí que, no meu entender, não faça grande sentido trazer para estas listas de best of aquelas obras “que ninguém conhece mas que deram muito gozo ler”. Posto isto, eis a lista dos meus dez livros favoritos – para crianças e adolescentes – publicados em 2010, tal como sairá na próxima edição da LER.
- O Coração e a Garrafa, Oliver Jeffers (Orfeu Negro)
- A Casa, texto de J. Patrick Lewis e ilustrações de Roberto Innocenti (Kalandraka)
- A Estranha Vida de Nobody Owens, Neil Gaiman (Presença)
- Era Uma Vez Uma Velhinha, Jeremy Holmes (Dinalivro)
- O Livro dos Quintais, texto de Isabel Minhós Martins e ilustrações de Bernardo Carvalho (Planeta Tangerina)
- Meia Hora Para Mudar a Minha Vida, Alice Vieira (Caminho)
- O Livro da Selva, Rudyard Kipling (Tinta-da-China)
- Os Livros que Devoraram o Meu Pai, Afonso Cruz (Caminho)
- O Jardim Curioso, Peter Brown (Caminho)
- Lágrimas de Crocodilo, André François (Bruaá)
- O Coração e a Garrafa, Oliver Jeffers (Orfeu Negro)
- A Casa, texto de J. Patrick Lewis e ilustrações de Roberto Innocenti (Kalandraka)
- A Estranha Vida de Nobody Owens, Neil Gaiman (Presença)
- Era Uma Vez Uma Velhinha, Jeremy Holmes (Dinalivro)
- O Livro dos Quintais, texto de Isabel Minhós Martins e ilustrações de Bernardo Carvalho (Planeta Tangerina)
- Meia Hora Para Mudar a Minha Vida, Alice Vieira (Caminho)
- O Livro da Selva, Rudyard Kipling (Tinta-da-China)
- Os Livros que Devoraram o Meu Pai, Afonso Cruz (Caminho)
- O Jardim Curioso, Peter Brown (Caminho)
- Lágrimas de Crocodilo, André François (Bruaá)
segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
NOVO LIVRO DA BRUAÁ
O Arenque Fumado, uma interpretação do ilustrador André da Loba para o poema homónimo de Charles Cros (1842 – 1888):
L’Hareng Saur
Il était un grand mur blanc - nu, nu, nu,
Contre le mur une échelle - haute, haute, haute,
Et, par terre, un hareng saur - sec, sec, sec.
Il vient, tenant dans ses mains - sales, sales, sales,
Un marteau lourd, un grand clou - pointu, pointu, pointu,
Un peloton de ficelle - gros, gros, gros.
Alors il monte à l'échelle - haute, haute, haute,
Et plante le clou pointu - toc, toc, toc,
Tout en haut du grand mur blanc - nu, nu, nu.
Il laisse aller le marteau - qui tombe, qui tombe, qui tombe,
Attache au clou la ficelle - longue, longue, longue,
Et, au bout, le hareng saur - sec, sec, sec.
Il redescend de l'échelle - haute, haute, haute,
L'emporte avec le marteau - lourd, lourd, lourd,
Et puis, il s'en va ailleurs - loin, loin, loin.
Et, depuis, le hareng saur - sec, sec, sec,
Au bout de cette ficelle - longue, longue, longue,
Très lentement se balance - toujours, toujours, toujours.
J'ai composé cette histoire - simple, simple, simple,
Pour mettre en fureur les gens - graves, graves, graves,
Et amuser les enfants - petits, petits, petits.
DE TI EU CANTO
O livro para crianças de Barack Obama vale a pena? Leia a crítica de José Mário Silva, no Bibliotecário de Babel.
quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
DEBAIXO DA NEVE
PRÓXIMO CURSO DE LIVRO INFANTIL
Já está marcado: dias 2, 4, 9, 11, 16 e 18 de Maio de 2011. Uma parceria CMA/Booktailors.
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
THE SNOWMAN, PARTE III
A terceira e última parte do filme. Para mais informações sobre o livro de Raymond Briggs, ver o post anterior.
THE SNOWMAN, PARTE I
Em 1982, a partir do livro de Raymond Briggs recentemente publicado pela Caminho, Dianne Jackson realizou um filme de animação de 26 minutos (The Snowman) que foi candidato ao Oscar e se tornou conhecido também pelo tema musical, Walking in the Air. Continua a ser um clássico do Natal britânico e pode ser visto no You Tube. Esta é a primeira de três partes.
terça-feira, 21 de dezembro de 2010
CLÁSSICOS DE NATAL, 2
Para algo completamente diferente, sugerimos O Boneco de Neve, de Raymond Briggs (Caminho). Aproveito para postar um breve texto dedicado aos livros sem palavras, publicado na edição nº 97 da LER:
"Se há quem pese o valor de um livro para crianças em função da mancha gráfica textual (pouco texto = dinheiro mal gasto), os picture books sem palavras, ainda raros entre nós, são encarados como uma espécie de excentricidade, quase tanto como a expressão «texto visual». Contar uma boa história através de uma sequência de imagens faz o leitor compreender a sua estrutura, desenvolve a capacidade de interpretação, deixa espaço à imaginação e estimula a atenção para os detalhes visuais. Excluindo os livros para as primeiras idades, os picture books sem palavras não têm de ser forçosamente simples, quer na sua concepção estética quer temática. É o caso de O Boneco de Neve (Caminho), de Raymond Briggs, autor inglês por duas vencedor do prémio de ilustração Kate Greenaway, que aborda a questão da morte e da perda com uma frontalidade rara, mantendo-se actual desde 1978. Outros picture books sem palavras recentemente publicados são Migrando, de Mariana Chiesa Mateos (Orfeu Negro), Onda, de Suzy Lee (Gatafunho), Onde Está o Bolo?, de Thé Tjong-Khing (Caminho), Palhaço, de Quentin Blake (Caminho), e Um Dia na Praia e Trocoscópio, ambos da Planeta Tangerina."
"Se há quem pese o valor de um livro para crianças em função da mancha gráfica textual (pouco texto = dinheiro mal gasto), os picture books sem palavras, ainda raros entre nós, são encarados como uma espécie de excentricidade, quase tanto como a expressão «texto visual». Contar uma boa história através de uma sequência de imagens faz o leitor compreender a sua estrutura, desenvolve a capacidade de interpretação, deixa espaço à imaginação e estimula a atenção para os detalhes visuais. Excluindo os livros para as primeiras idades, os picture books sem palavras não têm de ser forçosamente simples, quer na sua concepção estética quer temática. É o caso de O Boneco de Neve (Caminho), de Raymond Briggs, autor inglês por duas vencedor do prémio de ilustração Kate Greenaway, que aborda a questão da morte e da perda com uma frontalidade rara, mantendo-se actual desde 1978. Outros picture books sem palavras recentemente publicados são Migrando, de Mariana Chiesa Mateos (Orfeu Negro), Onda, de Suzy Lee (Gatafunho), Onde Está o Bolo?, de Thé Tjong-Khing (Caminho), Palhaço, de Quentin Blake (Caminho), e Um Dia na Praia e Trocoscópio, ambos da Planeta Tangerina."
CLÁSSICOS DE NATAL, 1
E a propósito de Tim Burton e do post anterior, convém lembrar que uma das edições de 2010 da Orfeu Negro foi, justamente, a versão escrita de O Estranho Mundo de Jack, filme que nunca nos cansamos de rever. Aqui fica a declaração de intenções de Jack Esquelético, na tradução de Margarida Vale de Gato:
«Já me cansa meter medo, sustos e pavor.
Estou farto de ser algo que enche a noite de terror,
Farto de maus-olhados, de infundir alvoroço,
E os meus pés agonizam com a dança dos ossos.
Não gosto de cemitérios, quero mudar de ares!
Deve haver mais na vida que caretas e esgares!»
«Já me cansa meter medo, sustos e pavor.
Estou farto de ser algo que enche a noite de terror,
Farto de maus-olhados, de infundir alvoroço,
E os meus pés agonizam com a dança dos ossos.
Não gosto de cemitérios, quero mudar de ares!
Deve haver mais na vida que caretas e esgares!»
O NATAL DO BICHO DOS LIVROS
O postal de Natal 2010 do blogue O Bicho dos Livros é assumidamente timburtoniano. Subscrevo e retribuo as hostilidades.
segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
AUTORES, ESCOLAS E ETIQUETA
Não escolhi a palavra “etiqueta” apenas porque ficava bem no título. Escolhi-a porque é (também) disso que se trata quando um autor - escritor ou ilustrador - visita uma escola. Tenho constatado, com grande espanto e possível ingenuidade, a falta de qualquer noção de cortesia por parte de muitos professores, quantas vezes a pura e simples má educação. O último episódio passou-se aqui ao lado, em Espanha, durante a residência da DGLB. Não, não é preciso fanfarra nem passadeira vermelha. Bastava que os professores fizessem coisas tão simples como cumprimentar à chegada e à despedida (normalmente há só uma “vítima” que o faz, os outros escondem-se), que não bichanassem em grupinhos no decurso das sessões (tenho sempre a sensação de que falam da minha roupa), ou que não me deixassem plantada à frente dos meninos enquanto vão “só ali tomar um cafezinho” (também acontece). Há notáveis e honrosas excepções a esta vaga de indiferença generalizada? Claro que sim, e é isso que faz continuar: a expectativa de a próxima visita a uma escola não significar o papel de hamster adestrado, rodando, rodando o melhor possível frente ao tirocínio das perguntas do costume: “Quando é que decidiu ser escritora?”, “Quantos livros tem?”, “Em que é que se inspira para escrever?”, etc, etc. Desculpem, mas já não há paciência.
Por estas e por outras é que também subscrevi o documento que estabelece condições para a marcação de visitas de autor (para o ano lectivo 2011/2012), em boa hora idealizado por Alice Vieira, Margarida Fonseca Santos, Maria João Lopo de Carvalho, Luísa Fortes da Cunha e Cristina Carvalho. São sete os pontos considerados: marcação da visita, preparação da visita, despesas com transportes, despesa com alojamento e refeições, número de sessões, som e cachet. Até ontem à noite, eram 39 os subscritores da ideia. Os ilustradores não ficaram de fora. Segue-se a lista de nomes:
Alice Vieira
Ana Nobre de Gusmão
Ana Ramalhete
Anabela Dias (ilustradora)
André Letria (ilustrador)
António Mota
Armindo Reis
Carla Maia de Almeida
Carla Nazareth (ilustradora)
Catarina Fonseca
Cristina Carvalho
Danuta Wojciechowska (ilustradora)
David Machado
Elsa Serra
Fátima Effe
Fernando Carvalho
Francisco José Viegas
Gabriela Sotto Mayor (ilustradora)
Inês do Carmo (ilustradora)
Isabel Minhós Martins
Isabel Zambujal
João Manuel Ribeiro
Jorge Ribeiro
José Fanha
José Vaz
Leonor Xavier
Luísa Fortes da Cunha
Lurdes Breda
Margarida Fonseca Santos
Maria do Rosário Pedreira (escritora e editora)
Maria João Lopo de Carvalho
Miguel Gabriel (ilustrador)
Patrícia Alves (ilustradora)
Pedro Medina Ribeiro
Possidónio Cachapa
Richard Câmara (ilustrador)
Rita Vilela
Rosário Alçada Araújo
Sara Monteiro
Por estas e por outras é que também subscrevi o documento que estabelece condições para a marcação de visitas de autor (para o ano lectivo 2011/2012), em boa hora idealizado por Alice Vieira, Margarida Fonseca Santos, Maria João Lopo de Carvalho, Luísa Fortes da Cunha e Cristina Carvalho. São sete os pontos considerados: marcação da visita, preparação da visita, despesas com transportes, despesa com alojamento e refeições, número de sessões, som e cachet. Até ontem à noite, eram 39 os subscritores da ideia. Os ilustradores não ficaram de fora. Segue-se a lista de nomes:
Alice Vieira
Ana Nobre de Gusmão
Ana Ramalhete
Anabela Dias (ilustradora)
André Letria (ilustrador)
António Mota
Armindo Reis
Carla Maia de Almeida
Carla Nazareth (ilustradora)
Catarina Fonseca
Cristina Carvalho
Danuta Wojciechowska (ilustradora)
David Machado
Elsa Serra
Fátima Effe
Fernando Carvalho
Francisco José Viegas
Gabriela Sotto Mayor (ilustradora)
Inês do Carmo (ilustradora)
Isabel Minhós Martins
Isabel Zambujal
João Manuel Ribeiro
Jorge Ribeiro
José Fanha
José Vaz
Leonor Xavier
Luísa Fortes da Cunha
Lurdes Breda
Margarida Fonseca Santos
Maria do Rosário Pedreira (escritora e editora)
Maria João Lopo de Carvalho
Miguel Gabriel (ilustrador)
Patrícia Alves (ilustradora)
Pedro Medina Ribeiro
Possidónio Cachapa
Richard Câmara (ilustrador)
Rita Vilela
Rosário Alçada Araújo
Sara Monteiro
domingo, 19 de dezembro de 2010
OS CORDÉIS ESTÃO POR UM FIO
Há coisas que desaparecem e outras que vão desaparecendo. As primeiras podem doer mais, mas é uma dor que passa depressa. Um dia vamos à procura da nossa revista ou da agenda anual do costume – e pronto, kaput, já lá não está, desapareceu. Foi «descontinuada», como se diz agora. Ficamos tristes, irritados, conformados – e dali a algum tempo já esquecemos. As coisas que vão desaparecendo, pelo contrário, roubam-nos a consciência aguda da perda, o que significa perder duas vezes. É uma perda em movimento que vai doendo e moendo, na forma verbal mais melancólica de todas, o gerúndio. Só reparamos nas coisas que vão desaparecendo quando precisamos mesmo delas, e isso também causa algum desconforto. Os cordéis, por exemplo. Devíamos ter continuado a guardá-los como faziam os nossos pais e avós, confiantes no provérbio «guarda o que não presta e terás o que precisas»? Os cordéis vão desaparecendo à nossa volta, é verdade. Substituíram-se por fita-cola, aberturas fáceis, fechos reutilizáveis, velcros, molas coloridas, película aderente e outros recursos. Já ninguém se lembra deles para atar os sacos de arroz, nem para um conserto de improviso, nem para fazer o jogo da cama-do-gato. A gaveta das «coisas-sem-arrumação», onde dantes se encontrava de tudo – cordéis, rolhas, parafusos, lápis a meio, fichas triplas, pedaços de arame, escovas de dentes usadas e sabe-se lá o que mais – também já quase não existe nos apartamentos modernos. Mas virá o dia em que vamos precisar de ter um cordel à mão, para desatar o nó do problema. Pelo sim pelo não, talvez valha a pena guardar o próximo cordel que nos calhe em sorte.
(Texto publicado na edição de 19 de Dezembro da Notícias Magazine, revista de domingo do DN e JN, na secção "Nostalgia".)
(Texto publicado na edição de 19 de Dezembro da Notícias Magazine, revista de domingo do DN e JN, na secção "Nostalgia".)
sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
LIVROS A OLHAR PARA O TEJO
É uma livraria infantil que não é só livraria. Também tem brinquedos do género anti-Toys'r'Us e uma série de actividades para crianças e adultos. Tudo para pôr a gente a pensar, a imaginar, a criar. Talvez daí o nome: Cabeçudos. Onde? No Parque das Nações, perto da Torre Vasco da Gama. Passem por lá. Ou por aqui, para começar.
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
BOCAGE ILUSTRADO
“Esta antologia poética de Bocage, ilustrada pelo artista plástico André da Loba, destina-se ao público em geral e, muito em particular, ao leitor juvenil.
A explicação é simples. Bocage era, até há cerca de dez anos, um poeta lido e estudado no Ensino Secundário. Mas uma das muitas reformas baniu-o do convívio com os jovens portugueses (que já não associam o Bocage das anedotas ao Bocage poeta).
No curto espaço desta apresentação não podemos fazer uma crítica às políticas que têm apagado dos programas de Português e da memória colectiva nomes incontornáveis da literatura portuguesa. Devemos, contudo, sublinhar bem que Bocage não pode ser esquecido. Ler este poeta é entrar na alma humana, nos seus mistérios, seus desejos e contradições.
Daí estes treze poemas e ilustrações, que nos convidam a explorar o imaginário de Bocage. Conhecer estes sonetos é já, em parte, evocar a vida de um homem e de um poeta apaixonado, exaltado, rebelde, insatisfeito, perseguido, como ele próprio nos diz, pelo mesmo ‘fado’ que atormentou Camões.”
(Excerto do posfácio de Carlos Nogueira à Antologia Poética de Bocage ilustrada por André da Loba. Como já falámos num post anterior, trata-se de uma edição recente da Faktoria K de Livros, chancela da Kalandraka não especialmente dedicada aos mais novos – mas também – que desmitifica uma ideia feita: a maturidade do leitor exclui o direito à fruição de bons livros ilustrados, aparentemente para crianças. Não, não exclui. Esta é a prova.)
UMA NOVA EDITORA: BAGS OF BOOKS
Há uma nova (e prometedora) editora portuguesa exclusivamente centrada – pelo menos para já – na publicação de livros para crianças e adolescentes. Chama-se Bags of Books e faz a sua entrada em cena ainda este mês, com um livro ilustrado de Beatrice Alemagna, Depois do Natal. Em 2011, a selecção de escritores e ilustradores mantém-se criteriosa, notando-se um predomínio de nomes latino-americanos: Gabriel Pacheco, Beatrice Rodriguez, Claudio Hochman, Antonio Ventura, Loreto Salinas, Gonzalo Moure e João Vaz de Carvalho. Para abrir o apetite, o catálogo e mais informação já estão no site da editora. Aqui.
Correcção: O primeiro livro editado pela Bags of Books é de Beatrice Alemagna, sim, mas chama-se O Meu Amor. Se tudo correr bem com a distribuição, podem encontrá-lo nas livrarias a partir de amanhã. Quanto a Depois do Natal, sairá em Janeiro, fazendo jus ao título.
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
FROM DRAGS TO RAGS
O Pai Natal 2010 do Alex Gozblau é menos drag queen e mais miserável do que o de 2009. A festa acabou e nem sequer estávamos no melhor.
GABRIELA CANAVILHAS E A EXTINÇÃO DA DGLB
JL: Essa integração [da Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas com a Biblioteca Nacional] não decorre apenas da necessidade de redução de custos?
GC: A integração e fusão de institutos, de direcções-gerais e de empresas públicas foi uma medida aprovada pelo Governo no plano de contenção da despesa pública para 2011. É uma decisão que envolve todos os ministérios nesse esforço de redução de meios. A nossa preocupação é que não belisque as actividades desenvolvidas pelas instituições que se vão juntar. Do meu ponto de vista, poderá resultar numa nova fase de afirmação de toda a política do livro e da leitura que estava a ser desenvolvida pela DGLB. O dr. Jorge Couto, director da BN, é uma pessoa altamente capacitada para abraçar este projecto. Está a escolher um rosto para o desenvolver no seio da BN.
JL: E quem vai ser?
GC: Ainda não posso revelá-lo. Mas quero garantir que a integração da DGLB na BN e o seu enquadramento estrutural pode potenciar as políticas do livro de uma maneira mais sustentada.
(Excerto da entrevista concedida pela Ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, ao Jornal de Letras, Artes e Ideias, na edição publicada hoje. A questão da DGLB ficou “arrumada” nestas duas perguntas. Parece-me pouco.)
GC: A integração e fusão de institutos, de direcções-gerais e de empresas públicas foi uma medida aprovada pelo Governo no plano de contenção da despesa pública para 2011. É uma decisão que envolve todos os ministérios nesse esforço de redução de meios. A nossa preocupação é que não belisque as actividades desenvolvidas pelas instituições que se vão juntar. Do meu ponto de vista, poderá resultar numa nova fase de afirmação de toda a política do livro e da leitura que estava a ser desenvolvida pela DGLB. O dr. Jorge Couto, director da BN, é uma pessoa altamente capacitada para abraçar este projecto. Está a escolher um rosto para o desenvolver no seio da BN.
JL: E quem vai ser?
GC: Ainda não posso revelá-lo. Mas quero garantir que a integração da DGLB na BN e o seu enquadramento estrutural pode potenciar as políticas do livro de uma maneira mais sustentada.
(Excerto da entrevista concedida pela Ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, ao Jornal de Letras, Artes e Ideias, na edição publicada hoje. A questão da DGLB ficou “arrumada” nestas duas perguntas. Parece-me pouco.)
sexta-feira, 10 de dezembro de 2010
SIGA A TANGERINA
Estes são dois dos quatro livrinhos que a Planeta Tangerina vai apresentar amanhã, no meio de um apetecível programa de festas que conta com a presença de Andrés Sandoval, ilustrador chileno de Siga a Seta!, e de um passeio pelo Jardim Botânico com Fernando Catarino, o carismático ex-director que ninguém esquece. A festa começa as 16h00, no Museu de História Natural. Está tudo aqui. Que ninguém falte, a não ser, talvez, a chuva.
terça-feira, 7 de dezembro de 2010
FALAR SOBRE O LIVRO ILUSTRADO
Esta semana é um ver-se-te-avias de acontecimentos. Na próxima quinta-feira, no mesmo dia e à mesma hora em que a editora 101 Noites inaugura o Mercado de Natal Alternativo (à Rua de São Paulo, 121, Lisboa), começa uma conferência sobre o livro ilustrado com a escritora Cristina Norton e a ilustradora Danuta Wojciechowska, que debatem a arte de juntar texto e imagem para contar uma história. «Onde e como nasceu a necessidade desta justaposição?», pergunta-se. O público é convidado a entrar e a participar na conversa. Promovida pela Câmara Municipal de Lisboa, a conferência decorre às 18h30 no auditório da sede dos Serviços Sociais da CML, na Av. Afonso Costa, nº 41 (um edifício castanho e modernaço, junto à rotunda das Olaias).
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
ANDA CÁ QUE EU JÁ TE CONTO
Não sou especialista em contadores de histórias, mas há uns que me ficarão sempre na memória, como Pep Bruno e Luís Carmelo (mai-la sua concertina). Por isso vou estar na próxima quarta-feira, religiosamente (porque é dia de Imaculada Conceição), na Ler Devagar, para assistir ao segundo número da colecção HOT - Histórias Oralmente Transmissíveis. É uma antologia trilingue (português, espanhol e inglês) de contos e contadores alentejanos, editada em videolivro - o que inclui livro e DVD - pela BOCA. Repetindo: na Ler Devagar, 8 de Dezembro, às 18h30. Toda a informação aqui, no blogue da BOCA.
MAIS KALANDRAKA
Depois de Lisboa (ver post anterior), a Faktoria K de Livros apresenta amanhã no Porto uma das suas mais recentes edições, a Antologia Poética de Florbela Espanca ilustrada por Joana Rêgo. A conversa com a ilustradora será moderada por Emílio Remelhe e haverá leitura de poemas por Adélia Carvalho. Às 21h00, na "nova" Livraria Papa-Livros: Rua Miguel Bombarda, 523.
sábado, 4 de dezembro de 2010
FAKTORIA K DE LIVROS NA LX FACTORY
Parece um jogo de palavras, mas não deixa de ser verdade. A Faktoria K de Livros, uma chancela da Kalandraka dedicada a um público mais alargado, vai lançar hoje as suas últimas novidades: duas antologias poéticas dedicadas a Bocage e Florbela Espanca, ambas com ilustrações de dois autores "muito" contemporâneos - André da Loba e Joana Rêgo, respectivamente. É hoje, pelas 21h30, na Livraria Ler Devagar, à Lx Factory, em Lisboa. Os ilustradores estarão presentes para falar do seu trabalho e haverá ainda leitura de poemas pelos Contos da Lua Nova. Posteriormente, realizar-se-á uma sessão semelhante no Porto.
quinta-feira, 2 de dezembro de 2010
O ESCRITOR SEM VIRTUDES
Há quem não perdoe a Roald Dahl por ter vivido. Sejamos mais precisos: há quem não lhe perdoe as tentações donjuanescas, especialmente junto de mulheres casadas, nem o facto de se ter divorciado da actriz Patricia Neal depois de trinta anos conturbados, assumindo o affair com uma mulher mais nova chamada Felicity (os escritores nunca escolhem os nomes por acaso), com quem viveu até ao dia 23 de Novembro de 1990, talvez quase feliz. Roald Dahl, de quem falámos na edição anterior da LER, vinte anos volvidos sobre a sua morte, nunca foi uma figura pacífica, como pessoa e como escritor. Proferiu declarações que lhe valeram a acusação de anti-semitismo; e as feministas dos anos 1970 deleitaram-se a procurar sintomas de misoginia nas entrelinhas dos livros. Se os editores necessitaram de uma paciência de Job para lhe atender as exigências e caprichos, os ilustradores com quem trabalhou – incluindo Quentin Blake, com quem estabeleceu a mais sólida parceria – confrontaram-se com o seu calculismo financeiro, a faceta de homem de negócios que se revelou desde o tempo em que era funcionário da Shell. Chamaram-lhe arrogante, competitivo, narcisista, interesseiro e manipulador – só para citarmos alguns dos epítetos levantados na biografia assinada por Jeremy Treglown. E o que tem isso a ver com a literatura? Rigorosamente nada. A boa literatura dispensa a suposta virtude dos seus autores. Só a dependência histórica entre o sistema educativo e o sistema literário parece criar em algumas mentes vigilantes a ideia de que os escritores de livros para crianças e adolescentes tenham de circular numa espécie de recreio almofadado, onde possam cultivar amorosamente a sua «criança interior» sem correr o risco de amar, destruir e duvidar. Roald Dahl escolheu viver. Quem não vive, acaba a escrever sobre sentimentos de coelhinhos cor-de-rosa, acreditando que está a contar a melhor história do mundo.
(Texto publicado na edição nº 96 da LER, na coluna de opinião "Boca do Lobo", secção "Leituras Miúdas". Na foto, Roald Dahl aquando do seu casamento com a actriz norte-americana Patricia Neal.)
(Texto publicado na edição nº 96 da LER, na coluna de opinião "Boca do Lobo", secção "Leituras Miúdas". Na foto, Roald Dahl aquando do seu casamento com a actriz norte-americana Patricia Neal.)
segunda-feira, 29 de novembro de 2010
OS 10 MELHORES LIVROS ILUSTRADOS (EVENTUALMENTE)
Ok, é uma tarefa sempre ingrata e inconclusiva a que persiste na elaboração destes tops, mas continua-se a tentar. Ler aqui: "The finest picture books for youngsters as chosen by The Observer's Kate Kellaway".
sábado, 27 de novembro de 2010
A VIDA NÃO É UM MAR DE CHOCAPICS
Para quem faz contas à vida, os cereais do pequeno-almoço tornaram-se um dos terrores do orçamento familiar. Crianças e adolescentes – a quem o tempo da «meia sardinha» soa a nome de restaurante de praia – ingerem-nos com uma voracidade quase orgíaca, como se no fundo da embalagem houvesse uma cornucópia mágica que expelisse chocapics e estrelitas até à náusea. Ainda com a soma do último talão de supermercado plasmado na testa, os pais assistem ao esvair dos ordenados num oceano de flocos crocantes; enquanto à noite, para piorar as coisas, as telenovelas os tentam convencer de que qualquer família portuguesa moderna saboreia papaia importada ao pequeno-almoço.
Ao arrepio destes cenários tirânicos e perdulários, a troco de duas colheres de sopa, a Farinha 33 continua a render tal como no ano que assistiu ao seu heróico aparecimento: 1936. Produzida desde então pela empresa A Moreninha, com sede na Praça da Figueira, em Lisboa, contribuiu para o crescimento saudável de várias gerações – daí a sua designação, evocando o ancestral «diga 33» do escrutínio médico. Afinal, quem não se sente inspirado pelos fortes bíceps do rapaz da embalagem, capaz de quebrar correntes como qualquer Houdini de ginásio suburbano? Infelizmente, estas já mal se vêem, tal como os calções de tamanho micro, a salientar os efeitos fortificantes da farinha. Em seu lugar, estrategicamente colocado, recorta-se o slogan: «Alimento saudável composto só com produtos naturais». Também a Moreninha foi na cantiga do politicamente correcto, mas não podemos querer-lhe mal por isso. Vamos continuar a dizer 33 até que nos doam os bíceps.
(Texto publicado na edição de 3 de Outubro da Notícias Magazine, revista de domingo do DN e JN, na secção "Nostalgia".)
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
A CARTA DE OBAMA
Com ilustrações de Loren Long (o mesmo ilustrador de As Maçãs do Sr. Peabody, de Madonna), chega em breve às livrarias a tradução portuguesa do livro para crianças assinado por Barack Obama, De Ti Eu Canto - Carta às minhas filhas (Of Thee I Sing - Letter to my daughters), um retrato em 40 páginas de 13 heróis (ou anti-heróis) da História dos EUA – de Abraham Lincoln a Sitting Bull, de Billie Holliday a Helen Keller. A partir da segunda semana de Dezembro, com edição da Alêtheia.
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
APRENDER A LER E A ESCREVER PARA CRIANÇAS
Clara Haddad, contadora de histórias brasileira, vai estar n’O Quarto da Lua esta sexta-feira, às 21h30 (Rua Almeida e Sousa, 25, cave). No dia seguinte e no mesmo local, entre as 10h00 e as 18h30, conduz o workshop “Entre Contos & Encantos”, com um programa onde vão ser tratados temas relativos à “expressão corporal, vocal, técnicas de narração oral cénica, diferenças entre o conto popular e de autor, estrutura de um conto, preparação de sessão de contos, ética e vários contextos de narração (hospitalar, terapêutico, performance, mediação de leitura)”. Se ainda houver vagas, a inscrição pode ser feita até ao próprio dia, através dos telefones 96 247 37 06, 931 156 558 e 91465 6372.
Atenção também à primeira oficina de escrita de livro infantil ministrada por David Machado, dia 11 de Dezembro, um sábado, cujo programa pode ser visto aqui. Também em Dezembro, mas nos dias 1 e 4, das 15h00 às 18h00, o Espaço Evoé, em Lisboa, promove um workshop de contadores de histórias com Carlos Marques. Informações pelos telefones 21 888 08 38, 96 381 65 05 e 96 446 26 02.
Atenção também à primeira oficina de escrita de livro infantil ministrada por David Machado, dia 11 de Dezembro, um sábado, cujo programa pode ser visto aqui. Também em Dezembro, mas nos dias 1 e 4, das 15h00 às 18h00, o Espaço Evoé, em Lisboa, promove um workshop de contadores de histórias com Carlos Marques. Informações pelos telefones 21 888 08 38, 96 381 65 05 e 96 446 26 02.
domingo, 21 de novembro de 2010
DRA. JECKYLL E MRS. HYDE
Um dos sonhos de qualquer criança que cresceu a ver televisão portuguesa nos anos 1970, praticando zapping entre dois canais, era ter um pijama vagamente parecido com os uniformes do Espaço: 1999. O outro era ser a Maya, ser amiga da Maya ou mesmo propor-lhe namoro, se as sobrancelhas ao estilo Frida Kahlo e as patilhas rockabilly não constituíssem entrave estético. Mas vamos aos uniformes, primeiro. É importante notar que não se assemelhavam a fatos de treino berrantes comprados na feira de Moscavide, como os de outras séries de ficção científica que se seguiram. Pelo contrário, exibiam uma elegância distinta, à imagem do Comandante John Koenig (Martin Landau) e da Dra. Helena Russel (Barbara Bain), que também formaram um casal invejável durante 36 anos, fora da Base Lunar Alfa. Bem vistas as coisas, comer a poeira da Lua não devia ser assim tão mau quando se habitava um lugar onde até havia um solário (é claro que, aos 7 anos, não fazíamos ideia da utilidade da coisa) e moças de biquíni e saltos altos que se passeavam por corredores de um branco virginal. Maya, a cientista do planeta Psychon adoptada pela Base Lunar Alfa, encarnava o lado selvagem e sensual da comunidade. O seu uniforme incluía minissaia e botas de cano alto; mas, mais importante do que isso, tinha o dom de se transformar numa pantera, num gorila ou num monstro nojento escorrendo baba e verdete, levando ao extremo a conhecida duplicidade feminina. Tinha pinta, a Maya. E depois, naquela altura, 1999 parecia tão longe que ninguém se imaginava com 30 anos, quanto mais com 40.
(Texto publicado na edição de 21 de Novembro da Notícias Magazine, revista de domingo no DN e JN, na secção "Nostalgia".)
(Texto publicado na edição de 21 de Novembro da Notícias Magazine, revista de domingo no DN e JN, na secção "Nostalgia".)
sábado, 20 de novembro de 2010
HOMENAGEM A MATILDE ROSA ARAÚJO
As Bibliotecas Municipais de Lisboa, a Editorial Caminho e a Calendário das Letras irão prestar homenagem a Matilde Rosa Araújo. “Senhora de Tantos Tesouros” será um momento dedicado ao universo literário e à exploração da sua humanidade. Familiares, amigos e especialistas em literatura infantil reúnem-se dia 25 de Novembro, às 18.00 horas, na Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro, em Telheiras para celebrar a autora e a obra. A homenagem inclui a apresentação de O Livro da Tila, primeira obra infantil da Matilde, agora reeditada pela Caminho com ilustrações de Madalena Matoso e da obra inédita Florinda e o Pai Natal, com ilustrações de Maria Keil.
No programa constam comunicações de Ana Margarida Ramos ("Entreabrir uma caixinha mágica: a poesia da Tila"), Leonor Riscado ("A voz nua de uma fada verde – Matilde Rosa Araújo"), Jorge Silva ("Meninas das mãos de seda. A ilustração nos livros de Matilde"), leitura de poemas por Maria Barroso Soares, uma exposição bibliográfica e de ilustração de Maria Keil e Madalena Matoso, e ainda a venda de livros da autora.
(Informação enviada pela Caminho.)
No programa constam comunicações de Ana Margarida Ramos ("Entreabrir uma caixinha mágica: a poesia da Tila"), Leonor Riscado ("A voz nua de uma fada verde – Matilde Rosa Araújo"), Jorge Silva ("Meninas das mãos de seda. A ilustração nos livros de Matilde"), leitura de poemas por Maria Barroso Soares, uma exposição bibliográfica e de ilustração de Maria Keil e Madalena Matoso, e ainda a venda de livros da autora.
(Informação enviada pela Caminho.)
VENCEDORES DO PRÉMIO MARIA ROSA COLAÇO
A Lusa adianta que “O Relógio Real, de Palmira Martins da Silva Baptista, e O Galo que Nunca Mais Cantou e Outras Fábulas, de Cassilda Saldanha, foram as obras distinguidas na edição deste ano do Prémio Literário Maria Rosa Colaço”, respectivamente, nas categorias de literatura infantil e literatura juvenil. Só uma pequena correcção: onde se lê “Cassilda Saldanha” deve ler-se “Ana Saldanha”. Notícia aqui.
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
CIVILIZAÇÃO PASSA A EDITAR ROALD DAHL
A Civilização acaba de adquirir os direitos da obra de Roald Dahl em Portugal. O primeiro título, Charlie e a Fábrica de Chocolate, sai em Março de 2011. Seguem-se O Fantástico Senhor Raposo, em Junho, e James e o Pêssego Gigante, em Outubro. Não sei em que tipo de edições a Civilização está a pensar (de bolso? De capa flexível? Com novas traduções? Com ilustrações a cores?), mas será que a importância do autor não justifica um ritmo de publicação um bocado mais acelerado, sobretudo numa editora que lança dezenas de livros por mês? É só uma pergunta.
OS LIVROS E O LIVRÃO
Na minha ingenuidade pouco santa, pensei que esta campanha da Bertrand, desenvolvida em parceria com o Banco de Bens Doados e a Fundação Pro Dignitate, tivesse como objectivo a recolha de livros para crianças. Livros que as pessoas tivessem em casa e quisessem oferecer a instituições de solidariedade social, deixando-os no sítio criado para o efeito, o Livrão (um nome infeliz, pela ressonância evocada com os lixos recicláveis). Afinal, não é bem assim. A ideia é comprar os livros nas livrarias e só depois os oferecer. Que livros? Explicação do comunicado de imprensa: “A oferta incide sobre livros infantis e juvenis didácticos de baixo preço, com as Livrarias Bertrand a sugerirem uma lista de seis títulos que fazem parte do Plano Nacional da Leitura.” Aahhhhhh… Realmente, estava a achar que era muita fruta, mesmo para a época.
ENCONTROS LUSO-GALAICOS 2010
“Ao nível das fórmulas, assistimos há vários anos a uma reprodução no juvenil daquilo a que temos vindo a assistir no mercado para adultos: fantasia, romance histórico, e ícones que se repetem, como os piratas, os vampiros, e ao que tudo indica, os anjos. Todas estas fórmulas são devoradas pelos adolescentes e jovens, alimentando ainda mais este ciclo pernicioso.
Ora, terá então deixado de haver lugar para a narrativa realista e desempoeirada que Alice Vieira 'inaugurou' no Portugal democrático?
Há, claro que há.”
(Andreia Brites foi uma das participantes dos últimos Encontros Luso-Galaicos, este ano dedicado à literatura juvenil. Há um texto indispensável para ler no blogue O Bicho dos Livros.)
Ora, terá então deixado de haver lugar para a narrativa realista e desempoeirada que Alice Vieira 'inaugurou' no Portugal democrático?
Há, claro que há.”
(Andreia Brites foi uma das participantes dos últimos Encontros Luso-Galaicos, este ano dedicado à literatura juvenil. Há um texto indispensável para ler no blogue O Bicho dos Livros.)
terça-feira, 16 de novembro de 2010
YOU'RE THE ONE THAT I LOVE
Um daqueles movimentos que surge sabe-se lá de onde no Facebook, terminando de forma tão espontânea como começa, pede às pessoas que elejam um herói de infância (ou de banda desenhada, ainda não percebi bem…) e o coloquem na imagem de perfil. Uns dizem que é para durar até 20 de Novembro, outros que é durante todo o mês. Well… why not? Tenho tantos heróis que é um desperdício não os evocar, a propósito ou a despropósito. Hesitei entre a bela Marianne, “a Pérola de Labuan”, que tanto me impressionou ao morrer de febre nos braços de Sandokan; a enigmática Maya do Espaço: 1999; e a altiva Tigerlily, a princesa índia da história de Peter Pan. São mulheres magníficas. Mas acabei por escolher a personagem mais inspiradora de todas, Sara Crewe, A Little Princess, que moldou a minha confessada anglofilia e deu forma a uma imagem recorrente das figuras heróicas (indomáveis, arrogantes, alumbradas, inconformistas, estóicas...). Dediquei-lhe um longo post aqui: Imaginação e Stiff Upper Lip. As versões cinematográficas que conheço são inenarráveis de tão más, por isso o melhor mesmo é escolher qualquer uma destas capas de livros. A primeira será, talvez, mais bonita, mas a última é mais verdadeira.
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
CARGA DE TRABALHOS
O tempo não anda bom para a jardinagem. Por causa disto - e outras coisas que não posso contar - este blogue tem estado inactivo nos últimos dias. As minhas desculpas aos leitores habituais e ocasionais. É a vida.
domingo, 7 de novembro de 2010
UM COMBOIO CHAMADO DESEJO
Há mais estações e apeadeiros abandonados em Portugal do que, à primeira vista, se possa pensar. Não falamos de lugares perdidos no meio da paisagem, já consumidos pelo mato e pela erosão, mas de todas essas estações de comboios progressivamente desumanizadas, cujo maior recurso é a diabólica máquina de vender bilhetes. Vejam-nas: estão por toda a parte, como um exército invasor vindo de uma cultura sofisticada, atirando-nos à cara as nossas lamentáveis e frágeis emoções: o desejo de estar em casa à hora do jogo, o medo de chegar tarde à entrevista de emprego, a urgência de abraçar alguém antes de que o mundo se desmorone de vez… E o que fazem essas máquinas de vender bilhetes, na sua insuportável arrogância robotizada? Confundem-nos. Irritam-nos. Desesperam-nos. Fazem-nos passar por parvos ou por turistas na nossa própria terra. Atrás de nós, forma-se uma fila de gente impaciente, que suspira e revira os olhos perante o nosso desaire, a nossa imperdoável demora, a nossa tão humana indecisão («Querem ver que por causa deste/a ainda vou perder o comboio?»). Ora, não devia ser assim. Viajar requer uma predisposição mental e emocional que não precisa destas mesquinhices para nada. A viagem deve começar num estado de entrega e confiança, não de exigência. Estações de comboio fantasmas, com máquinas no lugar de pessoas, deviam ser rigorosamente proibidas. Temos saudades do tempo em que um chefe de estação representava a civilização, mesmo no meio do nada, e havia sempre alguém atrás do guichet para responder a um simples pedido: «É um bilhete, se faz favor.»
(Texto publicado na edição de 7 de Novembro da Notícias Magazine, revista de domingo no DN e JN, na secção "Nostalgia".)
(Texto publicado na edição de 7 de Novembro da Notícias Magazine, revista de domingo no DN e JN, na secção "Nostalgia".)
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
ATENÇÃO A TODOS OS PASSAGEIROS
Última chamada para o (Mini)Curso de Livro Infantil, em parceria com a Booktailors. Inscrições até hoje à tarde...
Curso de Livro Infantil, por Carla Maia de Almeida
Objectivos: Este curso não é uma oficina de escrita nem está vocacionado para a formação do leitor e para as acções pedagógicas associadas à leitura. Pretende-se, sim, explorar o universo do livro infantil tomando-o como objecto total, privilegiando a componente literária, mas sem negligenciar outros campos como a ilustração, a edição ou a sua evolução histórica. Será dado ênfase ao livro para crianças e não para adolescentes, que consideramos integrado numa lógica de funcionamento própria. Serão mostrados e trazidos à discussão dezenas de títulos, sejam portugueses, traduções ou originais noutras línguas. Estas escolhas reflectem o gosto pessoal e as idiossincrasias da formadora e não têm qualquer pretensão de exaustividade nem de doutrinação.
1 ª Sessão: Era uma vez um reino incerto
Introdução ao curso. Que coisa é essa da «literatura infantil?». Origens e desenvolvimento do livro para crianças em Portugal. Do livro de conceitos ao romance juvenil: diferentes géneros de um produto editorial específico mas pleno de ambiguidades. Breve panorama do mercado do livro infantil. A quem serve a crítica da literatura infantil.
2ª Sessão: Contar para dar nomes às coisas
A percepção cosmológica da criança segundo Bachelard. Os contos como desdobramento da vida interior e construção de sentido. O lobo mau não é vegetariano – sobre a temida crueldade dos contos de fadas. Não há temas difíceis, apenas livros que funcionam (ou não). A importância de contar histórias e o impacto da tradição oral no livro infantil.
3 ª Sessão: Some like it hot
Características e especificidades da tradução de livros para crianças. Autores estrangeiros – das colecções de clássicos da era de ouro das publicações juvenis aos contemporâneos indispensáveis num Plano Pessoal de Leitura. A nossa selecção incompleta: Roald Dahl, Jutta Bauer, Babette Cole, Edward Gorey, Maurice Sendak, Javier Sáez Castán, Emily Gravett, Anthony Browne, Neil Gaiman e David Almond.
4 ª Sessão: A arte de iluminar as palavras
Breve História da ilustração de livros para crianças. Diferentes linguagens e técnicas de ilustração. A expansão do picture story book (ou álbum) como campo contemporâneo de experimentação estética. Relação entre texto e imagem: efeitos de ampliação e ressonância. O elo perdido no virar da página de um picture story book. Pop-ups e livros só com imagens são literatura?
5ª Sessão: Posso usar a palavra «vislumbrar»?
Escrever para crianças: a ilusão da facilidade. Transformar o simples em complexo e vice-versa. Noções de ritmo, fluência, densidade e substância. As boas ideias caem do céu. Os Onze Mandamentos do Escritor. Quando as projecções culturais e ideológicas da infância se intrometem na literatura. Escritores de livros para crianças e auto-imagem.
6 ª Sessão: Isso não é para a tua idade!
Como escolher livros para crianças. Chaves de interpretação qualitativas para texto e ilustração. Orientação de leituras por idades, interesses temáticos e personalidade. Cativar o leitor relutante. A leitura literária como factor de desenvolvimento da literacia e do sentido crítico. O livro para crianças à conquista de um público generalista. Bibliografia e outras fontes de informação institucionais e informais.
Ver mais aqui.
Curso de Livro Infantil, por Carla Maia de Almeida
Objectivos: Este curso não é uma oficina de escrita nem está vocacionado para a formação do leitor e para as acções pedagógicas associadas à leitura. Pretende-se, sim, explorar o universo do livro infantil tomando-o como objecto total, privilegiando a componente literária, mas sem negligenciar outros campos como a ilustração, a edição ou a sua evolução histórica. Será dado ênfase ao livro para crianças e não para adolescentes, que consideramos integrado numa lógica de funcionamento própria. Serão mostrados e trazidos à discussão dezenas de títulos, sejam portugueses, traduções ou originais noutras línguas. Estas escolhas reflectem o gosto pessoal e as idiossincrasias da formadora e não têm qualquer pretensão de exaustividade nem de doutrinação.
1 ª Sessão: Era uma vez um reino incerto
Introdução ao curso. Que coisa é essa da «literatura infantil?». Origens e desenvolvimento do livro para crianças em Portugal. Do livro de conceitos ao romance juvenil: diferentes géneros de um produto editorial específico mas pleno de ambiguidades. Breve panorama do mercado do livro infantil. A quem serve a crítica da literatura infantil.
2ª Sessão: Contar para dar nomes às coisas
A percepção cosmológica da criança segundo Bachelard. Os contos como desdobramento da vida interior e construção de sentido. O lobo mau não é vegetariano – sobre a temida crueldade dos contos de fadas. Não há temas difíceis, apenas livros que funcionam (ou não). A importância de contar histórias e o impacto da tradição oral no livro infantil.
3 ª Sessão: Some like it hot
Características e especificidades da tradução de livros para crianças. Autores estrangeiros – das colecções de clássicos da era de ouro das publicações juvenis aos contemporâneos indispensáveis num Plano Pessoal de Leitura. A nossa selecção incompleta: Roald Dahl, Jutta Bauer, Babette Cole, Edward Gorey, Maurice Sendak, Javier Sáez Castán, Emily Gravett, Anthony Browne, Neil Gaiman e David Almond.
4 ª Sessão: A arte de iluminar as palavras
Breve História da ilustração de livros para crianças. Diferentes linguagens e técnicas de ilustração. A expansão do picture story book (ou álbum) como campo contemporâneo de experimentação estética. Relação entre texto e imagem: efeitos de ampliação e ressonância. O elo perdido no virar da página de um picture story book. Pop-ups e livros só com imagens são literatura?
5ª Sessão: Posso usar a palavra «vislumbrar»?
Escrever para crianças: a ilusão da facilidade. Transformar o simples em complexo e vice-versa. Noções de ritmo, fluência, densidade e substância. As boas ideias caem do céu. Os Onze Mandamentos do Escritor. Quando as projecções culturais e ideológicas da infância se intrometem na literatura. Escritores de livros para crianças e auto-imagem.
6 ª Sessão: Isso não é para a tua idade!
Como escolher livros para crianças. Chaves de interpretação qualitativas para texto e ilustração. Orientação de leituras por idades, interesses temáticos e personalidade. Cativar o leitor relutante. A leitura literária como factor de desenvolvimento da literacia e do sentido crítico. O livro para crianças à conquista de um público generalista. Bibliografia e outras fontes de informação institucionais e informais.
Ver mais aqui.
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
ROALD DAHL: O GIGANTE NÃO TÃO SIMPÁTICO
Odiado por uns, amado pela maioria, Roald Dahl morreu há vinte anos. Autor de dezenas de short stories adaptadas para as séries de televisão Contos do Imprevisto e Hitchcock Apresenta, foi como escritor de literatura para crianças que se distinguiu, em parceria com o ilustrador Quentin Blake.
Só na década que precedeu a sua morte, a 23 de Novembro de 1990, venderam-se onze milhões de livros do escritor que um número indeterminado de professores, bibliotecários e críticos classificou como «não recomendável». Depois de morrer, em Oxford, aos 74 anos, feito o diagnóstico de leucemia e uma vida inteira de dedicação aos cigarros, álcool e analgésicos, Roald Dahl continuou – até hoje – a suscitar as mais antagónicas reacções.
Só na década que precedeu a sua morte, a 23 de Novembro de 1990, venderam-se onze milhões de livros do escritor que um número indeterminado de professores, bibliotecários e críticos classificou como «não recomendável». Depois de morrer, em Oxford, aos 74 anos, feito o diagnóstico de leucemia e uma vida inteira de dedicação aos cigarros, álcool e analgésicos, Roald Dahl continuou – até hoje – a suscitar as mais antagónicas reacções.
Nos Estados Unidos, país onde se estreou literariamente, com uma narrativa de não-ficção sobre a sua experiência como piloto da RAF (publicada na Saturday Evening Post, em 1942), Dahl é agora inconciliável com os tempos do politicamente correcto. O seu humor selvático, sustentado numa predisposição intrínseca para a ironia e para o grotesco, atinge especialmente os personagens de adultos, muitas vezes retratados como bárbaros estúpidos e capazes das maiores vilanias contra os mais fracos. Veja-se o casal de Os Tontos (The Twits), Mrs. Trunchbull, a directora de escola em Matilde (Matilda), ou esse desfile de horrores carnavalescos que é As Bruxas (The Witches), uma das suas obras mais polémicas.
A enredos de estrutura transparente, consistindo no reavivar da luta mítica do herói contra o Mal, Roald Dahl acrescentou a singularidade da sua imaginação e a sua memória obsessiva (e o bom trabalho dos seus editores, justiça lhes seja feita). Nos seus livros não há sentimentalismos, mas há afectos e emoções intensas. Nascido em Cardiff, no País de Gales, de pais noruegueses, «vinha de uma família de bons cozinheiros e bons contadores de histórias», como lembra um dos seus biógrafos, Jeremy Treglown. A mãe foi, segundo o próprio, «a primeira influência», ampliada pelo desaparecimento prematuro do pai e de uma irmã, quando ele tinha apenas três anos.
Repetindo o padrão familiar, uma série de acontecimentos trágicos acompanharia a vida pessoal de Roald Dahl, ao longo dos trinta anos conturbados de casamento com a actriz Patricia Neal. Também a experiência dos colégios internos ingleses, com os seus castigos sádicos e permanente clima de bullying, lhe deixou marcas indeléveis. No entanto, muitos dos seus heróis e heroínas – quase sempre crianças – são animados por um espírito combativo e industrioso, expurgado do narcisismo e arrogância de que o autor era acusado, entre outros defeitos. O «gigante amigo», citando um dos seus livros mais felizes, O GAG (The BFG), podia não ter o melhor feitio e carácter do mundo, mas deixou-nos grandes livros, à imagem dos seus quase dois metros de altura.
(Texto publicado na edição nº 96 da LER. Por lapso, é dito que Matilde, Os Tontos e As Bruxas têm edição da Teorema, quando a colecção referida pertence à Terramar. No próximo número será feita a rectificação.)
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
A RESIDÊNCIA ESPANHOLA, 28
Há pelo menos três viagens dentro da mesma viagem. Há a viagem da predisposição mental e emocional, feita de expectativas, projecções, planos e decisões práticas sobre que roupa e livros levar. Há, depois, a viagem propriamente dita, raras vezes correspondente ao que havíamos imaginado. Desenrola-se num estado de quase irrealidade, como um filme ou um sonho em que nos observamos à distância, incapazes de reconhecer o eco dos nossos passos em solo estrangeiro. É quando a viagem nos faz a nós, ao contrário da primeira. E há, por fim, a terceira viagem, síntese das anteriores e, de longe, a mais imprevisível. É a viagem do regresso a casa, do desfasamento das rotinas, da estranheza dos lugares e ruídos que antes nos eram familiares (as travagens bruscas dos automóveis na nossa rua, a chamada do editor a lembrar o texto para entregar, a campainha da loja de ferragens que sempre toca à passagem de um cliente…). Para exorcizar o medo do desconhecido, pousamos a bagagem e percorremos a casa e os objectos numa mistura de ansiedade e conforto, a fim de nos certificarmos de que tudo está, afinal, nos seus lugares. Mas essa é apenas uma mentira conveniente que contamos a nós próprios, porque nunca regressamos iguais ao que éramos, nem tão pouco o mundo permaneceu intacto à nossa espera. As verdadeiras viagens são as que nos trocam as voltas, as palavras e as evidências que tomamos por garantidas. Só passado o tempo justo e necessário é que conseguimos, eventualmente, abarcar a inteireza das três viagens a que tivemos direito.
domingo, 31 de outubro de 2010
A RESIDÊNCIA ESPANHOLA, 27
Regresso a Lisboa amanhã. Trinta dias passaram muito depressa, mas há que aproveitar o sol de Can Serrat até ao fim. (Miss Haunted Garden agradece à Cynthia as fotos de há pouco e, já agora, todas as boas conversas pela noite fora.)
A RESIDÊNCIA ESPANHOLA, 26
Foto de grupo tirada ontem à noite, na véspera da partida de M. Ramalingam para a Índia. Por que razão estamos todos a fazer gestos estranhos? Não, não foi nada que tivéssemos bebido... A ideia foi identificar o país de origem de cada um na linguagem dos surdos-mudos, uma das formas de comunicar com o “Rama”, além do recurso adicional ao papel e caneta.
Assim, da esquerda para a direita, vemos a australiana Nicole em pose de canguru, seguida do Gilbert, fazendo o “C” de Canadá, e da Desirée, que puxa o pico de uma montanha suíça a partir do braço esquerdo. A Cynthia, de lenço verde ao pescoço, faz o signo dos Estados Unidos – as mãos cruzadas em forma de águia –, no que é imitada pela Jessica, de inconfundível casaco cor-de-rosa, em baixo. A mim coube-me um prosaico “P” de Portugal, e dou graças a deus por não me terem mandado pôr as mãos em forma de bola de futebol. Atrás de nós está a Eva, a fazer o que lhe deu na gana, porque ninguém sabia como se dizia “Noruega”. Podia ter sido pior. A Carmen, espanhola, não se vê muito bem, mas faz o mesmo gesto no braço que o Marcel, que está de boina axadrezada, já na fileira de baixo. Do lado direito dele (esquerdo, na fotografia), “Rama” aponta para a própria testa com o indicador e Otto desenha com as duas mãos as Américas do Norte, Sul e Central – tudo isto para dizer que veio das Honduras. Por fim, no outro extremo, de boina preta, Karine, francesa, compõe uma estilização da Torre Eiffel. Felizmente não tínhamos cá ninguém da Alemanha, porque o gesto ia ficar um bocado feio na fotografia.
A RESIDÊNCIA ESPANHOLA, 25
Uma pequeníssima mas expressiva amostra dos óculos desenhados pelos 190 miúdos da Escola de El Bruc, como já se falou aqui e aqui. De cima para baixo: óculos multiserviços (ulleres multiserveis, em catalão); óculos para condutores da Hispano Igualadina (a empresa rodoviária que faz a ligação entre El Bruc e Barcelona); óculos para “dar a imortalidade e alguns poderes” (itálico meu); e óculos para ajudar a pensar e a ter ideias (notem o pormenor do cérebro na ligação entre as lentes). Todos uma delícia!
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