domingo, 26 de julho de 2009

QUEM TEM MEDO DO LOBO MAU?


Devem os escritores e ilustradores de livros para crianças pagar 64 libras ao governo britânico para poderem continuar a visitar as escolas, depois de obtido o atestado de garantia “não sou pedófilo”? O caso surge na sequência do assassinato de duas alunas por um funcionário, mas há quem não alinhe na nova caça às bruxas. Philip Pullman, Quentin Blake, Michael Morpurgo e Anthony Horowitz são alguns dos autores que já vieram a público dizer que se recusam a fazer parte da base de dados que serve como garantia de idoneidade, classificando a medida de “ultrajante” e “monstruosa”. Se o preço a pagar é o veto de entrada nas escolas, pois que seja. Mas Anthony Browne, outro autor consagrado, adoptou uma posição mais conciliadora e não vê problema em submeter-se ao escrutínio governamental, defendendo igual tratamento para quem lide com crianças, seja um escritor, um professor ou um contínuo de uma escola.

Isto é perigoso. Primeiro, porque a questão envolve valores pessoais. Há quem não goste de ser mais um ficheiro, mais um número, mais uma fotografia e uma impressão digital numa sociedade hipervigiada. Há quem não queira ser ajuizado, na sua vida privada, por um sistema político que não dá provas de ser impoluto. Não têm de ser criticados nem julgados por isso, como se tivessem algo a esconder. Estão no seu direito, tal como Anthony Browne está no direito de assumir outros valores e prontificar-se a fornecer os seus dados para registo. Por outro lado, e este será o busílis, não valerá a pena questionar a real eficácia desta proposta? Sabe-se que os abusos sexuais são perpetrados, na maioria dos casos, por gente que vive em constante proximidade com as crianças, seja na escola ou na família. Sabe-se, também, que os autores se deslocam às escolas sempre acompanhados por professores e com um incansável programa de festas a cumprir. Que perigo efectivo podem representar para as crianças? Não mais do que o homem dos gelados, o vendedor do quiosque ou a senhora que limpa os balneários. Bom, se calhar, o melhor é passar a pente fino a vida de toda a gente. Podemos começar já pelo vizinho do lado.

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