quinta-feira, 5 de maio de 2011

INQUIETAÇÕES DOMÉSTICAS


É impossível folhear o livro de Pablo Prestifilippo sem que imediatamente surja à memória o genial e inclassificável Catalogue d’Objets Introuvables, de Jacques Carelman, publicado em 1969. Se Carelman nos apresentou à máquina de escrever hieróglifos, à luva de pele de cacto e à cafeteira para masoquistas, entre dezenas de outras criações insubmissas, Pablo Prestifilippo revolucionou a orgânica dos objectos domésticos emprestando-lhes um cunho selvagem e ameaçador, que justifica o subtítulo da obra: Catálogo de Objectos Travessos – Toda a Verdade Sobre as Feras que nos Espreitam Lá em Casa. As «luvas ambulantes», as «camas doidivanas», as «torneiras ressentidas» e as «dentaduras postiças» são disso exemplo: «Este bivalve bucal fixa-se às gengivas e estabelece uma relação de mútua colaboração com o organismo que o aloja, geralmente um avô ou uma avó». Na verdade, não há nada de perigoso nestes delírios poético-surrealistas, a menos que se encare o humor como uma ameaça. Para quem é o livro? Como outros da mesma chancela da Kalandraka, recomenda-se para o leitor juvenil e adulto, sem que tal seja uma prescrição exacta.

Catálogo de Objectos Travessos
Pablo Prestifilippo
Tradução de Elisabete Ramos
Faktoria K de Livros

(Texto publicado na edição da LER nº 102. Pablo Prestifilippo nasceu na Argentina, em 1960. Deixou mais de três dezenas de livros da sua inteira autoria, antes de morrer em Barcelona, com apenas 48 anos.)

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