GATA
BORRALHEIRA Arquétipo feminino da abnegação e do
altruísmo, a moça garante-nos que a virtude e a bondade compensam. É provável
que tome antidepressivos às escondidas.
Encontram-se variantes desta história na China
do século IX d.C., prova da sua difusão pelos quatro cantos do mundo. Também
todos nós temos – ou já tivemos – uma Gata Borralheira nas nossas vidas. É essa
querida que não sabe dizer «não», que só quer ajudar e para quem a
assertividade consiste em passar um dia sem pedir conselhos. Órfã de mãe e
filha de um pai desnaturado (que nas versões hard pretende desposá-la), Gata Borralheira era uma vítima
anunciada para o desastre. A sua necessidade de aprovação provém da culpa
inconsciente: quando as irmãs troçam dela por querer ir ao baile, penteia-as
«perfeitamente bem», como salienta Perrault. Hum... e que tal antes duas
colheradas de cinza nas chávenas das megeras, para dar mais gostinho ao chá das
cinco? Sem pai que a defenda, será no submundo do borralho, acalentada pelo
fogo, que Gata Borralheira se reconciliará com a sua mãe interna, renascendo das
cinzas para uma nova vida. Guardado está o sapato para quem o há de calçar.
(Texto publicado na revista LER nº 131, rubrica «Wendy no Divã».)
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