quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

WENDY NO DIVÃ: GATA BORRALHEIRA



GATA BORRALHEIRA Arquétipo feminino da abnegação e do altruísmo, a moça garante-nos que a virtude e a bondade compensam. É provável que tome antidepressivos às escondidas.

Encontram-se variantes desta história na China do século IX d.C., prova da sua difusão pelos quatro cantos do mundo. Também todos nós temos – ou já tivemos – uma Gata Borralheira nas nossas vidas. É essa querida que não sabe dizer «não», que só quer ajudar e para quem a assertividade consiste em passar um dia sem pedir conselhos. Órfã de mãe e filha de um pai desnaturado (que nas versões hard pretende desposá-la), Gata Borralheira era uma vítima anunciada para o desastre. A sua necessidade de aprovação provém da culpa inconsciente: quando as irmãs troçam dela por querer ir ao baile, penteia-as «perfeitamente bem», como salienta Perrault. Hum... e que tal antes duas colheradas de cinza nas chávenas das megeras, para dar mais gostinho ao chá das cinco? Sem pai que a defenda, será no submundo do borralho, acalentada pelo fogo, que Gata Borralheira se reconciliará com a sua mãe interna, renascendo das cinzas para uma nova vida. Guardado está o sapato para quem o há de calçar.

(Texto publicado na revista LER nº 131, rubrica «Wendy no Divã».)

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