quinta-feira, 19 de novembro de 2015

LUTO COM AS ARMAS QUE TENHO


DD: Curiosamente, a amizade que muitos acreditam que poderá ficar para segundo plano num futuro não muito longe devido a utilização das novas tecnologias, que cada vez mais isolam os mais novos aos ecrãs do seu telemóvel. Como acha que devemos recuperar a “amizade do contato”?

MFS: Como deve imaginar, acredito que o podemos fazer todos os dias, cada um no seu plano. O meu é o dos livros. Tenho recusado, por exemplo, escrever romances juvenis que se baseiam nas redes sociais, em trocas de mensagens. Para mim, esta é uma preocupação gigantesca. No outro dia, parando para dar passagem a estudantes numa passadeira, reparei que nenhum conversava, iam todos agarrados aos ecrãs. Por isso, no que depender da minha escrita e do meu trabalho no treino da mente, estarei sempre a alertar para o perigo de se perderem as ferramentas sociais e de relacionamento (linguagem não-verbal, comunicação eficaz, avaliação de estados emocionais, e por aí adiante), de nos isolarmos uns dos outros e dos custos que isso traz no futuro. Não é também de relegar o impacto que isto tem na capacidade de atenção e memorização, e já estamos a sentir os efeitos disto. Luto com as armas que tenho, neste caso, através do que escrevo, polvilhando os textos com esses pequenos detalhes emocionais, fugindo de adjetivar, mas dando pistas de como se comportam as personagens e obrigando o leitor a perceber qual a emoção que está por trás disso.

(Margarida Fonseca Santos em entrevista ao Diário Digital, a propósito do seu mais recente livro, Bicicleta à Chuva. Vale a pena ler tudo, aqui.)

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